Às 23h17 de ontem, 4ª feira, o jornal eletrônico da Folha de S. Paulo colocou no ar a notícia Battisti pede habeas corpus ao STF para evitar extradição, aproveitado também na edição impressa de hoje, 5ª.
Trata-se de um resumo bem chinfrim das informações que o site do Supremo Tribunal Federal divulgara seis horas antes: estas.
Se o editor de Política da Folha se desse ao trabalho de ler meu blogue, tomaria conhecimento do HC já na manhã (às 10h36) de anteontem, 3ª, no post Advogado de Cesare Battisti pede habeas corpus para garantir sua permanência no Brasil.
Será que todos os homens do Otavinho não conseguem entregar um jornal atualizado?!
De resto, nem os leopardos perdem as pintas, nem a Folha consegue tratar de assuntos referentes a personagens de esquerda sem a costumeira adoção de um viés negativo e adverso.
Vejam como é tendenciosa esta redação:
“O italiano foi condenado em seu país à prisão perpétua por quatro assassinatos nos anos 70, quando integrava o partido Proletários Armados para o Comunismo, grupo de extrema esquerda“.
Independentemente de Battisti negar que ainda pertencesse ao PAC quando tais episódios se deram, a condenação italiana, baseada exclusivamente nos depoimentos interesseiros de delatores premiados, nunca o colocou como único integrante dos comandos que atuaram nessas ocasiões.
Inclusive, tendo duas dessas ações sido quase simultâneas, a distância entre as respectivas cidades impedia sua presença física em ambas. Os procuradores, que o haviam dado como um dos autores materiais de ambas, foram obrigados a reescrever a acusação, passando a considerá-lo participante de uma e autor intelectual da outra. O que não passou de um remendo, pois deixaram de apresentar qualquer prova no sentido de que Battisti fosse o planejador das ações do PAC…
Enfim, mesmo se crendo na versão da Justiça altamente tendenciosa e draconiana que se praticou na Itália após a morte de Aldo Moro, Battisti teria sido, em três das vezes, um dos assassinos, sem que se pudesse determinar quem dera os disparos fatais; e na quarta, o inspirador dos assassinos.
Mas, a partir do relato manipulatório da Folha, os leitores são levados a crer que teria sido ele e só ele o matador, como naqueles filmecos em que aparecem executores da Máfia…
Outra evidente manipulação está nestes dois parágrafos da Folha:
“‘Desde 2016, com as mudanças ocorridas no Poder Executivo, os advogados afirmam que há notícias de que o governo italiano pretende intensificar as pressões sobre o governo brasileiro para obter a extradição’, informa o STF.
Nesta semana o jornal O Globo noticiou que o governo da Itália apresentou pedido para que o presidente Michel Temer reveja a decisão de Lula“.
Muito mais interessantes (e suspeitos) eram os trechos abaixo da notícia do STF, que a Folha preferiu ignorar:
“…a defesa argumenta que, segundo notícias veiculadas recentemente, há um procedimento sigiloso em curso visando à revisão do ato presidencial que negou a extradição em 2010. ‘Inclusive, em nota oficial enviada pelo Ministério da Justiça ao [site de notícias] G1, informou-se que eventual divulgação do procedimento poderá colocar em risco o sigilo de investigação ou procedimento em andamento, a verificar que, efetivamente, há informação concreta sobre a existência de expediente que poderá incidir na esfera do direito de locomoção do paciente’, sustenta.
Os advogados também informam que Battisti tem solicitado certidões e informações ao Ministério Público Federal, Ministério da Justiça, Ministério das Relações Exteriores e Casa Civil a fim de obter cópias de procedimentos sobre ele, mas até o momento nenhuma informação foi prestada. Outro argumento é a existência de ação civil pública pela qual o Ministério Público pretende a declaração da nulidade do ato que concedeu visto de permanência a Battisti, e, consequentemente, sua deportação“.
Battisti: envelhecido, ainda perseguido. Até quando? |
Que o governo italiano continue esperneando e fazendo pressões para o Brasil rever sua decisão soberana de 2010 é até compreensível (embora se trate de uma postura arrogante e insultuosa para nós). E quem se informa unicamente pela Folha, é levado a crer que seja somente isto que está acontecendo.
A coisa muda de figura quando se acrescenta que o pedido foi sigiloso e o governo brasileiro começou sigilosamente a estudar a viabilidade jurídica do atendimento do pleito da Itália, sem informar nem dar a mínima satisfação à defesa de Battisti e ao STF, embora o Supremo tenha referendado em 2011 a decisão do ex-presidente Lula.
Embora as análises iniciais da equipe de Temer não tenham, segundo O Globo, encontrado empecilho nenhum ao atropelamento, por ato administrativo, de uma decisão presidencial antecedida de julgamentos no Supremo e por ele endossada em seguida, os empecilhos existem, sim.
Os episódios pelos quais Battisti foi falsamente acusado remontam a 1979 e já deveriam estar prescrevendo naquele ano de 2009, mas o relator do processo de extradição no STF, Cezar Peluso, alegou então que o período de prisão no Brasil tinha de ser desconsiderado.
Oito anos depois, contudo, a situação não é mais a mesma: ainda que se dê como interrompida a contagem de tempo entre sua detenção (18 de março de 2007) e libertação (8 de junho de 2011) no Brasil, a prescrição, inquestionavelmente, já ocorreu!
Afirmação que fez quando extradição parecia inevitável |
E há mais um empecilho cronológico às pretensões italianas, segundo o advogado de Battisti, Igor Tamasauskas: “Como passou mais de cinco anos da decisão do Lula que negou extradição e foi referendada pelo Supremo, não poderia haver decisão administrativa. No prazo de cinco anos, teria decadência de rever a decisão”.
Além, é claro, de Battisti ser pai de uma criança brasileira, o que também impede a extradição, segundo súmula do STF.
E do fato de que sua condenação a prisão perpétua subsiste na Itália e o Brasil não admite extraditar um cidadão que vá cumprir no seu país de origem uma pena superior à máxima praticada aqui (30 anos).
Quantos empecilhos encontra quem não fecha os olhos à sua existência…
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.