ROTINAS DESVALORIZADAS
No interior mineiro, famílias vivem em sobressalto, reféns do acionamento de sirenes instaladas em alguma barragem próxima.
No interior mineiro, famílias vivem em sobressalto, reféns do acionamento de sirenes instaladas em alguma barragem próxima.
O minério rendeu divisas ao país, empregou multidões e promoveu o desenvolvimento das regiões à jusante. Enquanto as benesses da atividade eram recitadas, insistentemente comemoradas, a imprevidência humana cuidou de aparelhar riscos capazes de colocar em dúvida se terá compensado tamanho sucesso econômico.
Em nome de uma fugaz comodidade, persistimos abarrotando terra, mar e ar de resíduos plásticos, e basta a aquisição de uma caixinha de fósforo para ter o direito de receber uma sacola plástica. O canudinho ornamenta e embala o consumo de um líquido qualquer.
A indústria de reciclagem opera benemérita, em grande parte assentada na pouco articulada e majoritariamente voluntária atividade de coleta. A população, e governos, ainda enxergam como favor a disponibilização separada de recicláveis.
As estruturas voltadas à saúde fazem das tripas coração, tentando o milagre de manter sadias populações que sequer contam com saneamento básico. Campanhas de vacinação não conseguem atrair multidões, e a falta de CPF causa mais incômodos que não prevenir doenças em filhos.
A índios, já civilizados, é desestimulada a atividade econômica, embora suportado o vandalismo e abuso como formas de reivindicação. Proteger culturas não significa manter intactas posturas sabidamente selvagens, incompatíveis com qualquer convivência pacífica.
As escolas ensinam o amor e cuidado com os animais, mas os alunos podem, em algum recinto próximo, presenciar as festivas torturas e judiações, em rodeios tão milionários quanto perversos. Não faltam vozes, de quem nunca mugiu ou galopou, alardeando ser inofensiva a barbárie.
Nossos políticos são eloquentes e festivos, em comemorações e obras inaugurais, mas majoritariamente omissos no diagnóstico e acompanhamento das rotinas que busquem a melhoria dos sistemas de produção e dia a dia das populações.
Nossa atividade parlamentar, de câmaras municipais ao senado, pouco ou nada enxerga das atividades técnicas e acautelatórias dos governos, pouco iluminadas pela mídia e alheias às disputas partidárias e ideológicas. Enquanto um vereador discursa na inauguração de uma simples lombada, outro, sempre minoritário, vai analisar-lhe o custo ao erário.
Nossa constituição privilegiou o princípio da Cautela, robustecendo a necessidade de rigorosa análise, quando da aprovação de novos procedimentos, materiais e posturas. O Estado robusteceu seu aparato de normas, análises e pessoal técnico.
Contudo, já no dia seguinte relegou à insignificância a atividade fiscalizatória e de acompanhamento. Passada a festa, o que resta é alimentos e bebidas pelo chão.
Universidades, ministérios e tantos outros nichos de estudos estão repletos de diagnósticos e sugestões. Falta quem os leia.
Pedro Israel Novaes de Almeida
O autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.
É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.