Celso Lungaretti – O TEMPO DA AMBIGUIDADE PASSOU NA JANELA E SÓ DILMOLINA NÃO VIU
Mais do que uma crise política, temos um vácuo de poder, que acabará sendo preenchido por um ou outro lado. E a direita tem dado os passos certos nesta direção, enquanto o governo patina sem sair do lugar.
A presidenta Dilma Rousseff, em sua infinita teimosia/arrogância, continua agindo como se fosse possível convencer os 200 milhões de brasileiros de que eles estão errados e ela, certa. Enquanto insistir no mais do mesmo, o fosso entre governanta e governados irá se aprofundando cada vez mais, até tragá-la.
Poderia deter ou, pelo menos, retardar a marcha para o impeachment com mudanças de rumo de grande impacto, começando pela exoneração do Joaquim Levy e descarte do neoliberalismo. Mas, tudo indica que não fará isto e vá morrer abraçada com ele.
Concordo plenamente com o Guilherme Boulos: serão as ruas que vão decidir a parada. Nas pesquisas de avaliação do seu governo, Dilma está perdendo por 71% x 8%. Se esta goleada se repetir nas manifestações do dia 16 e do dia 20, o jogo estará decidido. Pretextos legais vão ser encontrados em 2015 como foram encontrados em 1992. Quem duvida, não está levando em conta que este é o país do jeitinho.
Resta saber como Dilma agirá até o dia 20. Já lhe deveria ter caído a ficha de que, faça o que fizer, não conseguirá impedir que multidões saiam às ruas no próximo domingo para pedir sua cabeça, e nem mesmo reduzir o volume dessas multidões. Será inútil perder tempo com quem não vai reconquistar nem a pau, Juvenal.
Mas, depende dela fornecer o estímulo necessário para que haja também muita gente no dia 20.
Tem de reavivar a chama da militância, mudando o que deu errado até agora, principalmente a política econômica traíra; as alianças oportunistas/heterodoxas e consequente loteamento do Ministério; e, enfim, a tentativa de ser fiel a dois amos, pois isto não dá mais pé com o fim da abastança.
A luta de classes andou sendo amortecida pelo PT, mas a burguesia é mais consequente: direciona-se a passos largos para o rompimento da política de conciliação entre capital e trabalho, pois há a conta do ajuste a pagar e ela tudo fará para impingi-la aos de sempre. Percebe que Dilma, por mais que se esforce para fazer-lhe a vontade, não oferece garantia nenhuma de que o serviço sujo será levado a bom termo (as bases do PT se indignam e indignarão cada vez mais). Então, diga o que disser o Trabuco do Bradesco, na hora da decisão a classe dele se pronunciará, unida e coesa, pelo impedimento de Dilma.
O tempo da ambiguidade passou na janela e só Dilmolina não viu. Agora, ou ela cai nos braços do povo ou os exploradores a descartarão. É simples assim.
Depende dela fazer História –levando a luta de classes no Brasil a novo patamar– ou ser personagem de farsa, expelida do governo tão facilmente como João Goulart, que foi derrubado pelo piparote de um fascista destrambelhado (Olympio Mourão Filho), sem esboçar reação.
A contagem regressiva segue.
A constatação de que o Zé Dirceu, afinal, não esteve envolvido com esquemas de corrupção apenas em nome de um porvir melhor para a humanidade, locupletando-se também, fez desabar sobre ele uma rejeição acachapante.
Até o Juca Kfouri o fulminou, no espaço que geralmente utiliza para detonar os ratos da cartolagem futebolística. Clovis Rossi o comparou ao Maluf. O Zé Simão fez piada com sua desgraça, “pichuleco Gold”. O PT o abandonou às feras, evitando inclusive citar seu nome.
Não fiquei nem um pouco surpreso, seja com os esqueletos que saíram do armário do Zé, seja com a atitude dos bons companheiros, de reprovação velada ou execração explícita. [Regra de ouro: é melhor juntar-se logo aos estilingues do que correr o risco de tornar-se também vidraça…]
A opção revolucionária nunca embotou minha perspicácia de jornalista ou, mesmo, meu senso comum. Desde o mensalão já dava para se perceber claramente que algum proveito pessoal ele tirara do imenso poder que detinha. Se o desejável for a moralidade no sentido estrito do termo, tráfico de influência é tão recriminável quanto receber uma mesada do demo.
Nada escrevi sobre isto, contudo. E não por ter telhado de vidro e temer um efeito bumerangue, pois nunca cedi às tentações do capitalismo. Grana e poder jamais foram cantos de sereia para mim.
Não foi o marxismo que me fez detestar as injustiças e a desigualdade social, foi por detestar a sociedade na qual vivia que acabei me tornando marxista. Nunca invejei os burgueses e seus privilégios. Queria é que os seres humanos, libertos da canga do trabalho alienado, tivessem existências gratificantes e solidárias. Queria ser um entre todos numa sociedade humanizada.
Por que poupei o Zé Dirceu, então?
Porque nunca esqueci quantos estavam ao nosso lado em 1968 e quão poucos continuaram ao nosso lado em 1969.
Porque era necessária muito idealismo, coragem e firmeza de caráter para lutar-se contra a ditadura depois do AI-5.
Porque a derrota final foi terrível demais e um impacto desses dificilmente é bem absorvido. À maioria, abala e traumatiza. A alguns, vira do avesso.
[O Vandré entrou em parafuso, o Dirceu se tornou um espertalhão e a Dilma, uma tecnoburocrata que engole até o neoliberalismo porque, tecnica e burocraticamente, lhe parece ser a melhor solução para fazer as coisas andarem sob o capitalismo, com cuja sobrevivência parasitária e catastrófica já se conformou.
99% dos companheiros agora dirão que o Dirceu fez pior. Mas, nunca desculparei a Dilma por nos ter igualado aos amorais que, na hora da necessidade, agarram sofregamente a primeira boia que lhe aparecer pela frente, mandando às urtigas tudo que haviam dito e jurado no passado.
Éramos cavaleiros da esperança, ela nos fez ser vistos como tão merecedores de desconfiança quanto quaisquer outros políticos. Da sua maneira atrapalhada, causou dano incomensurável à imagem dos revolucionários.]
Posso ser um sentimental, mas me machuca ver o que o Vandré se tornou, como o Dirceu vem sendo degradado e quão longe a Dilma está indo na destruição da sua biografia. Gostaria imensamente que tivessem saído de cena com dignidade. E penso que as ressalvas que lhes fazemos no presente não anulam sua grandeza no passado.
Brecht disse tudo:
“Infelizmente, nós,
que queríamos preparar o caminho para a amizade,
não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
Mas vocês, quando chegar o tempo
em que o homem seja amigo do homem,
pensem em nós
com um pouco de compreensão.”
OUTROS POSTS RECENTES DO BLOGUE NÁUFRAGO DA UTOPIA (clique p/ abrir):
- Como o jornalista Helio Rubens vê as coisas - 9 de janeiro de 2024
- Como o jornalista Helio Rubens vê o mundo - 27 de dezembro de 2023
- Como o jornalista Helio Rubens vê o mundo - 22 de dezembro de 2023
É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.