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Agostinho Mulombo: 'Lusofonia: utopia ou um projecto pós-colonial?'

Agostinho Mulombo

Lusofonia: utopia ou um projecto pós-colonial?

Não é coincidente a coincidência de que lusofonia rima com utopia, talvez pelo facto de Angola ser uma verdadeira sociedade da utopia como escreve Pepetela (PEPETELA, 2013) ou uma autêntica sociedade do espectáculo, na qual o real está no espectáculo e o espectáculo na realidade (DEBORD, 2003). Porém, a problematização do termo lusofonia parece interessar não só a Angola, como aos demais países africanos de língua portuguesa.

O verdadeiro debate que se propõe, no presente texto, é, indubitavelmente, em torno da representação do termo lusofonia em África, em particular Angola, objeto dos nossos questionamentos. A ser assim, levanta-se a seguinte questão:

Em África, Angola em particular, pode-se falar de lusofonia? Que o leitor seja capaz de responder a essa pergunta após a leitura do texto…

O termo LUSOFONIA começou a circular em Portugal anos depois da descolonização. Só por volta de meados da década de 1980 é que Portugal – integrado formalmente à Comunidade Europeia em 1986 – volta a aproximar-se de suas ex-colônias africanas. Não certamente por acaso, é também o período em que se começa a falar por lá, com certa intensidade, de LUSOFONIA (…) (Faraco,2012 p.39) – o que parece que esse termo está associado sempre a interesses econômicos e políticos, entrosados numa utópica irmandade, com o intuito de Portugal (re) construir laços com as ex-colônias para ‘saciar os seus interesses económicos e políticos’

Em vários de seus textos, Ivo Castro, citado por Faraco (2009), comenta o que ele chama de a “separação estrutural entre a língua de Portugal, a do Brasil e a dos países africanos”. E, por considerar inevitável a fragmentação futura do sistema linguístico da língua portuguesa, argumenta que não parece existir qualquer futuro para a ideia de lusofonia.

De acordo com Mpanzu (2018, p. 21), importa reconhecer que o termo lusofonia e a carga semântica que ele acarreta não reúnem consenso, uma vez que há posições discordantes que encaram como um conceito que abrange até territórios não envolvidos na CPLP e que, mesmo dentro da CPLP, enquanto organização, há populações que não falam português nem mesmo encarnam nelas a cultura lusófona.  Razão que nos motiva a conduzir a nossa compreensão de forma ‘problematizadora’, para que possamos repensar ou eliminar o conceito lusofonia, num período em que continua a discussão sobre a perda dos nossos valores culturais em tempos pós-coloniais.

A primeira observação que deve ser feita é que o tema da LUSOFONIA parece
ser fundamentalmente de interesse português. Raramente é mencionado e discutido no
Brasil. A Professora (de origem são-tomense) Inocência Mata, citada por Faraco, diz o seguinte:
“De cunho e causa portugueses, os africanos oscilam entre sua aceitação e a sua recusa, enquanto entre os brasileiros o termo [lusofonia] não tem história”.

Analistas portugueses costumam apontar a questão da LUSOFONIA como sendo
de interesse estratégico e geopolítico para Portugal no sentido de que “seu peso real europeu depende essencialmente do facto de ser também extraeuropeu” (…) (NEVES, 2003, apud Faraco). Dito de outro modo, a criação da lusofonia pode compreender uma estratégia de Portugal querer possuir uma outra imagem a nível da Europa, do ponto de vista económico e político.

Por outro lado, há aqueles que – tendo em conta o facto de Portugal não estar entre as grandes economias da UE e ter ali peso político relactivamente pequeno – defendem os engajamentos fortes do país num bloco de países de língua portuguesa. Os que assim se posicionam veem aí uma forma de dar cacife político e económico ao país no interior da UE, na qual ele passaria a ser visto como o elo facilitador das relações da UE com o MERCOSUL e com a África e a Ásia. Define-se, por esta via, uma vertente conceitual e discursiva menos centrada no linguístico-cultural e mais nos interesses  político-económicos de Portugal (Faraco, 2009).

Numa primeira análise, a “Lusofonia” pode ser associada a palavra como a Francofonia ou a Anglofonia e acarretar consigo uma carga presumivelmente pós-colonial.

Dentre alguns estudos sobre esta matéria, realça-se o sentido geopolítico do termo que engloba um conjunto de países e de povos cuja língua materna, corrente ou oficial, é o português (…) (CPLP, 2008).
Essa concepção, porém, é entendida por vários autores – entre outros Eduardo Lourenço (1999), Alfredo Margarido (2000) e José Manuel Pureza (2005), todos citados por Faraco  – como um esforço de Portugal para reconstituir o antigo império colonial em novas bases.
Em consonância com os mesmos autores, sem precisar de muitas palavras para a nossa experimental conclusão, a LUSOFONIA é, portanto, um projeto pós-colonial/neocolonial, uma tentativa de instauração do poder “soft”, uma estratégia de continuidade de dominação com outra roupagem, um espaço inexistente do ponto de vista concreto, isto é, um espaço imaginário da nostalgia imperial. Aliás, quando se fala de lusofonia, Portugal costuma a ver-se sempre no “centro´´, embora os discursos oficiais simulem uma realidade.

Há, de facto, perspectivas para a LUSOFONIA? Ela é uma utopia ou um projecto pós-colonial?

Agostinho Mulombo

Obras Citadas:

CPLP. (2008). Encontros de Lusofonia em Torres Nova.

DEBORD, G. (2003). A Sociedade do Espectáculo. Projecto Periferia.

Faraco, C. A. (2009). Lusofonia: utopia ou quimera.

PEPETELA. (2013). Geração da Utopia. São Paulo: Copyright.

MPANZU, MONA (2018). Tendências Actuais no Ensino-Aprendizagem da Gramática das Línguas Não Maternas

 

 

 

 

 

 

 

Agostinho Mulombo Domingos
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