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Marcus Hemerly: 'Babenco, o poder da vontade'

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“Você não passa impunemente pelo que acontece com você. É óbvio que cicatrizes ficam. Não no corpo, mas na alma.” Hector Babenco

Existem diretores a respeito dos quais frequentemente pensamos que sua contribuição poderia ter sido mais numerosa, para deleite dos fãs e estudiosos do cinema. Esse é o caso de Hector, que não filmou de forma mais prolífica, não por falta de oportunidades – ou de vontade – mas em decorrência de sua franqueza e fidelidade consigo próprio. Após amealhar considerável fama internacional em decorrência de seus filmes distribuídos por produtores americanos, não foram poucos os roteiros lhe enviados, no entanto, o próprio diretor reconhece que não eram para ele, e uma vez não detectada a conectividade, seja de perfil ou sentimental, era o primeiro a dizer que projeto não era para o seu engajamento. Instintivamente, outras pessoas, não tão sensíveis à própria história, teriam aceitado direções apenas para manter-se no nicho de projeção, e até então, profissionais do cinema brasileiro não haviam desbravado, salvo raras exceções, e de forma tão proeminente, o mercado mundial.

Falecido em 2016, vítima de câncer, mas, evidentemente, nunca esquecido, Héctor Eduardo Babenco deixou uma filmografia completa em todos os sentidos. Aos amantes do cinema, uma vertente especial de análise salta aos olhos; o drama humano transmitido em cotejo à qualidade e técnica dos mestres, que se descortina no trabalho do cineasta argentino naturalizado brasileiro. Profissional que sempre elevou o nome do Brasil a vários panoramas, com produções que conquistaram plateias e se inseriram indissociáveis à história do cinema mundial, coadunando crítica e bilheteria.

A despeito de se sentir ao mesmo tempo acolhido e esquecido em terras brasileiras, nunca se divorciou totalmente do país, em especial, da capital paulista, mesmo diante do cenário global que conquistava.  Seu quarto filme, ‘O Beijo da Mulher Aranha’, de 1986, produção brasileira e americana, foi inteiramente gravado em São Paulo, até mesmo nas cenas ambientadas em Paris, havendo William Hurt recebido o Oscar de melhor ator, em 1985. Sentado na plateia do teatro em Los Angeles, Babenco dividiu os holofotes com Akira Kurosawa, John Houston e Sydney Pollack, vencedor da noite na categoria de Melhor Diretor, por ‘Entre dois Amores’. Após relativo sucesso com sua primeira incursão cinematográfica em ‘O Rei da Noite’, estrelada por Paulo José, no qual retratava a boemia paulistana, galgou as grades bilheterias com ‘Pixote, A Lei do mais fraco’, e o policial ‘Lúcio Flávio, O passageiro da agonia’.

O público brasileiro e mundial ainda foi brindado com o documentário ‘Babenco: Alguém tem que ouvir o coração e dizer: parou’, dirigido por sua esposa, Barbara Paz. Após seu lançamento em larga escala nas salas de cinema ter sido frustrado pela pandemia, o filme, indicado em novembro anterior pela Academia Brasileira de Cinema – ABC, para representar o país no Oscar 2021, acabou ficando fora da premiação. Na película, são retratados os últimos meses de Babenco, através de um olhar sensível, porém incisivo, ao traçar momentos importantes em sua carreira. Rememora-se, dentre outros momentos, a seleção para concorrer à estatueta de melhor diretor, quando foi diagnosticado com câncer pela primeira vez,  a produção do festejado ‘Pixote, A lei do mais fraco’, até o crepúsculo de sua existência dando dicas ranzinzas de enquadramentos de câmera à sua esposa/cineasta.

O resultado: Babenco, é uma ode visual às artes, e não apenas ao cinema, junção de várias modalidade de expressão, pois o diálogo entre a vida que vemos e sentimos pulsa de forma incontida a cada minuto da produção. Nessa visão, a arte como forma de escapismo, a criação aliada às complexidades da vivência – e aqui se separa o viver do simples existir – são aplaudidos de pé na imagem em movimento.

O tom de despedida entrelaçado à trajetória do responsável por obras como ‘Ironweed’ (1987) e ‘Carandiru’ (2003), registrado por meio da sétima arte, é impactante e comovente em sua belíssima fotografia em preto e branco.  Disse Babenco: “Eu já vivi minha morte, agora só falta fazer um filme sobre ela”, e o faz como protagonista, de forma magistral como o fez atrás das câmeras.

Seu último filme, produzido em 2015, ‘Meu Amigo Hindu’”, gravita em torno de um diretor de cinema que se descobre em fase terminal de câncer, interpretado por Willem Dafoe. As feições autobiográficas são patentes, e assim como no filme de Barbara Paz, não se detecta uma visão fatalista dos percalços humanos, mas a beleza encontrada em todos os desdobramentos da vida. Dafoe, que é um dos produtores associados de Babenco, ponderou sobre o diretor que sua obra e imaginação é “uma meditação poética, um poema de amor para ele, para a vida, para a morte e para o cinema”.

Recentemente, a distribuidora Versátil coordenou o relançamento em mídia física da filmografia completa do diretor, com amplo conteúdo extra aos interessados em um olhar que transborda o do mero expectador. Percepção complexa (e completa) que melhor honra a memória do artista.

TRABALHOS DE HECTOR BABENCO

1975 – O Rei da Noite

1977 – Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia

1980 – Pixote, a Lei do Mais Fraco

1985 – O Beijo da Mulher Aranha,

1987 – Ironweed

1990 – Brincando nos Campos do Senhor

1998 – Coração Iluminado

2003 – Carandiru

2007 – O Passado

2014    Words with Gods (Capítulo: O Homem que roubou um pato)

2016 – Meu Amigo Hindu

 

 

 

 

 

 

 

Marcus Hemerly
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