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Sergio Diniz da Costa: 'Reflexões diante da morte'

Sergio Diniz da Costa – ‘REFLEXÕES DIANTE DA MORTE’

 

Sergio Diniz da Costa
Sergio Diniz da Costa

Hoje é 21 de setembro. O dia anterior do início da primavera. A manhã, porém, ainda é invernal, com grossas nuvens acinzentadas e um vento frio.

Estou no maior cemitério de minha cidade, acompanhando o enterro de um grande amigo (um verdadeiro pai!) de um amigo meu.

Conheci recentemente o falecido, tendo com ele um contato apenas momentâneo e, portanto, quando seus familiares e amigos olham para o rosto dele pela última vez, antes do sepultamento, as lágrimas que derramo não são minhas, porém, lágrimas alheias. Como não é minha a dor que assola meu coração. Ali, sofro solidariamente, lembrando o choro próprio que verti pelos muitos parentes e amigos que também já perdi.

A distância do relacionamento com aquele que está partindo permite-me, desta forma, distanciar-me do pesar que rodeia o ataúde. E essa separação leva-me a sentir sentimentos outros, aflorando outras reflexões.

Percebo, então, e plenamente, aquele ‘campo santo’. E vejo mais do que sepulturas desgastadas pelo tempo, restos de velas e flores secas. E ouço mais do que choros desconsolados.

O vento frio movimenta as folhas das árvores que margeiam o corredor principal e o seu farfalhar sugere um verde colóquio.

Fecho meus olhos e atento para a estranha conversa.  Sobre o quê palestram esses seres desprovidos de razão e de palavras? Estariam também solidários à dor reinante e o som das folhas seriam doloridos ais? Ou, aparentemente indiferentes, apenas celebrando a passagem do vento, qual mensageiro dos céus?

Em torno das árvores, andorinhas voluteiam num gracioso balé, como que regidas pelo vento. E esse delicado e inebriante balé parece ser-lhes todo o significado da existência.

Por entre os túmulos, alguns gatos ─ adotados por funcionários do cemitério ─ dormitam placidamente, embalados pelo som do vento.

Acima das preocupações humanas, as nuvens formam uma verdadeira cordilheira gasosa, entremeada de rasgos de uma paz infinitamente azul.

Um toque suave no ombro me traz de volta ao cenário terrestre. Quase que num sussurro, meu amigo, entre as últimas lágrimas, agradece minha presença.

Despeço-me dele com um demorado abraço (e lágrimas represadas) e começo a descer o corredor, rumo à saída.

Desço pelo longo corredor, sentindo o frio desta manhã ainda invernal, com grossas nuvens mescladas de cinza e azul.

Durante o trajeto, e mais uma vez diante da morte do corpo físico, reflito a respeito da efemeridade da vida terrena; a sensação de perda pela vida afora; a distância entre os dois mundos.

E, por um instante, sinto-me angustiado. Mas, a meia distância, sobre uma árvore, ouço o chamado de um bem-te-vi.

Bem-te-vi! Bem-te-vi!

Olho para o alto, procurando por aquele pássaro de peito amarelo e chamado insistente. E no galho onde ele se encontra, entre o verde das folhas, observo uma flor de cor muito intensa.

Bem-te-vi! Bem-te-vi! ─ ele repete.

E no seu chamado, de repente me lembro de que amanhã é 22 de setembro, o início da primavera, a Estação das Flores.

E uma nova floração de alegria enche meu peito, com a certeza de que é nesta efêmera passagem que, apesar das dores e das perdas, podemos deixar o nosso perfume no Jardim da Vida!

Helio Rubens
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