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Carlos Cavalheiro: 'Artigo sobre a Revolução de 1932 em Sorocaba'

Carlos Cavalheiro: ‘Artigo sobre a Revolução de 1932 em Sorocaba’ 

Prezados amigos:

Saúde e Paz!
Em anexo, segue o artigo que fiz sobre a participação de Sorocaba na Revolução Constitucionalista de 1932.
Carlos Carvalho Cavalheiro.
Historiador
Colunista dos jornais ROL e Tribuna das Monções
Colaborador Emérito do Núcleo MMDC de Itapetininga

A Revolução Constitucionalista de 1932 em Sorocaba

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                Sorocaba era uma importante cidade do interior paulista na década de 1930, contando com um aglomerado de fábricas de tecido de grande porte, além de outros empreendimentos que fizeram a fama da localidade como a “Manchester Paulista”.

Entre 1929 e 1930 havia 7574 operários em Sorocaba, na contabilidade feita pelo registro obrigatório na Polícia local, eis que para o “controle social”, os trabalhadores eram fichados (CRUZEIRO DO SUL, 21 fev 1929 e 05 fev 1930). Em 1932 o número de trabalhadores cresce para 8338, distribuídos da seguinte forma: a Fábrica têxtil de Votorantim possuía 2818 operários, a Fábrica Santa Rosália, 878, a Fábrica Santa Maria, 805, a Fábrica Santo Antônio, 1074, a Fábrica São Paulo, 229, a Fábrica Nossa Senhora da Ponte, 941, a Fábrica de Enxadas, 103, a Fábrica de Arreios, 46, a Fábrica de facas e facões, 14 e as Oficinas da Sorocabana, 1430 operários (CAVALHEIRO, 2001).

A população local era de 78937 habitantes. A cidade, 38775. Na zona rural, 20679 habitantes.  Os outros 19483 habitantes estavam distribuídos nos distritos de Votorantim (5217), Salto de Pirapora (888), Campo Largo (12019) e Brigadeiro Tobias (1359).

As organizações operárias giravam em torno dos ideais anarquistas e anarcossindicalistas, principalmente, sendo que o comunismo começava a adentrar no meio trabalhador sorocabano.

De outro lado, organizações de caráter fascista como a Legião Revolucionária e o Partido Nacional Fascista Italiano e o Dopolavoro também se faziam presentes. Em 1931 fundou-se em Sorocaba uma seção da Frente Negra Brasileira, organização que militava pela valorização social dos negros, especialmente em São Paulo. Do ponto de vista político partidário, permanecia o ideal liberal e os partidos tradicionais, como o Partido Democrático e o Partido Republicano Paulista, também disputavam o poder local.

A eclosão do movimento Constitucionalista de 1932 encontrará esse cenário em Sorocaba. Como bem salientou o historiador Boris Fausto, “O movimento de 1932 uniu diferentes setores sociais, da cafeicultura à classe média, passando pelos industriais. Só a classe operária organizada, que se lançara em algumas greves importantes no primeiro semestre de 1932, ficou à margem dos acontecimentos” (FAUSTO, 1999, p. 346). Em Sorocaba, os operários ligados os movimentos de trabalhadores também mostravam resistência aos apelos para a participação na Revolução que estourava no dia 9 de julho (CAVALHEIRO, 2001).

Porém outros setores da sociedade estiveram engajados no movimento revoltoso. Já nos primeiros dias após a eclosão da Revolução, o jornal Cruzeiro do Sul noticiou:

 

Movimento Constitucionalista de S. Paulo

[…]

Em Sorocaba a attitude de S. Paulo foi recebida com justificado jubilo popular, mantendo se o povo na praça cathedral em commentarios favoráveis. Á hora do concerto musical a banda executou o hymno nacional, ouvindo-se ao final vibrantes applausos e vivas. A população se mantem em calma e na mais perfeita ordem. E é preciso que isso continúe não só para o socego da família sorocabana como também porque é essa uma das melhores maneiras de se concorrer para a causa que nesta hora empolga todos os corações.

[…]

(CRUZEIRO DO SUL, 11 jul 1932, p. 1).

 

Nesse mesmo dia noticiou-se a espera de 800 praças provindas de Mato Grosso, que seriam alojadas no Teatro São Raphael, em Sorocaba. No dia seguinte, dia 12 de julho de 1932, foi aberto o voluntariado sorocabano com a partida, no mesmo dia, dos primeiros combatentes.

1932-boato-1A história registrou os seus nomes: Jorge Martins Passos, Francisco Amaral Rogich, Leão Amaral Rogich, Rubens Scherepel, Rubens Gonçalves, Álvaro Martins Filho, Brasil Melchior, Carmo Scarpa, Hylário Corrêa[1], José Vieira Rodrigues, José Ibrahim Saker, Líbero Mudini, Ovídio Cattuzzo, Floriano Pacheco e Ary Seabra. Concomitantemente fundou-se a sede do MMDC em Sorocaba, numa sessão em que estiveram presentes o prefeito Octacílio Malheiro, Porphyrio Loureiro, Capitão Augusto do Nascimento Filho, Affonso Vergueiro, José Carlos Salles Gomes, Hernani Ferreira Braga e João Pereira Ignácio, este último representando o distrito de Votorantim.

Os primeiros voluntários escreveram uma eloqüente mensagem aos jovens sorocabanos, incitando-os a também partirem para a batalha:

 

Mensagem de moços

É da primeira leva de voluntários moços de Sorocaba a seguinte mensagem a nós entregue:

CONTERRÂNEOS: A época é de acções e não de palavras. Mentiríamos ao nosso honroso título de Paulistas, se nos deixássemos quedar indifferentes ante os acontecimentos históricos do momento. Eis porque partimos para a Capital do Estado, dispostos se mister for, a sacrificar a nossa vida em holocausto á causa Bandeirante. Ao partirmos, levamos a convicção de que somos acompanhados pelo vosso beneplácito, porque vós também sois Paulistas. Si, como tudo faz suppor, a causa Paulista for victoriosa, voltaremos satisfeitos de haver cumprido o nosso dever. Si tombarmos no campo da luta e da honra, vós conterrâneos queridos, irei nos substituir!

Gentes conterrâneas! Juntae as vossas orações ás de nossas mães, para que possamos brevemente regressar incólumes, trazendo a nova palpitante do triumpho da causa de nossa terra!

(aa) Hilario Correa – Ary Seabra – Jorge M. Passos – Francisco M. Rogich – Rubens Gonçalves – Rubens Schrepel – Alvaro Martins Filho.

(CRUZEIRO DO SUL, 13 jul 1932, p. 1).

 

A organização “MMDC” de Sorocaba tinha por fim o alistamento de voluntários e era filiada ao Comando Geral da Capital. O Dr. Adhemar de Sousa Queiróz, nomeado pelo Comando Geral do MMDC de São Paulo, presidiu a sessão de fundação da MMDC de Sorocaba, em 11 de julho de 1932, e da qual participaram ainda o prefeito Octacilio Malheiro, Porphyrio Loureiro, capitão Augusto do Nascimento Filho, Dr. Affonso Vergueiro, Dr. José Carlos de Salles Gomes, Dr. Hernani Ferreira Braga e o Sr. João Pereira Ignácio, representante do distrito de Votorantim (então pertencente a Sorocaba). Durante a Revolução, a organização “MMDC” ficou instalada em salas da prefeitura municipal.

A velha oligarquia paulista ressentiu-se da falta de exercício na política nacional. Os mandatários de antes agora estavam no ostracismo. E não eram somente os inimigos políticos da Revolução. Tanto o PRP quanto o PD paulista estavam relegados a um plano inferior na política nacional. Em Sorocaba essas duas forças, antes opostas, se uniram em prol da Revolução[2]. Igualmente fizeram os partidos regionais do Rio Grande do Sul, rompendo com Getúlio, e formando a Frente Única Gaúcha. Com isso, e com a promessa da entrada dos mineiros na revolta, os paulistas animaram-se para a luta.

No dia 13, fundou-se a Caixa Popular, com intenção de prestar auxílios aos voluntários pobres. Os estudantes do Ginásio Municipal e da Escola Normal (ambos no mesmo prédio) telegrafaram ao governador do Estado:

 

Exmo. Sr. Embaixador Pedro de Toledo, muito digno governador de S. Paulo. Normalistas e gymnasianos de Sorocaba, solidários na cruzada patriótica de constitucionalização do paiz, hypothecam seu apoio a V.Exa. Sorocaba, 13-7-932.”

 

Criou-se um Batalhão Infantil com mais de duzentas crianças. Também um Batalhão Feminino. A colônia espanhola realizou um espetáculo, através do G.D. Dicenta[3], apresentado no dia 15 de agosto no Teatro São José, cuja bilheteria foi destinada a causa paulista. Também a mesma colônia, através da empresa André Asensio & Irmãos, arrecadou alimentos, roupas e dinheiro para o triunfo da Revolução. Os clubes de futebol também fizeram a sua parte: o Esporte Clube Savóia, de Votorantim, o extinto Guarany Futebol Clube, o São Paulo Junior, o Sport Club Sorocabano, o Sorocaba-Paulista (reunidos) e o São Bento doaram suas gloriosas taças angariadas em diversos campeonatos. Esse material foi doado para o Material Bélico das Forças Constitucionalistas: virou munição. João Genésio de Luca esteve em Sorocaba arrecadando “utensílios imprestáveis de metal”, preferencialmente de cobre, zinco, chumbo e latão.

No dia 16 de julho o prefeito Octacílio Malheiro renunciou. Em seu lugar, provisoriamente, subiu o capitão Augusto César do Nascimento Filho. Posteriormente assumiu esse cargo o senhor Ernesto de Campos.

A Companhia Nacional de Estamparia, a maior organização industrial sorocabana, ofereceu ajuda financeira aos trabalhadores que se dispusessem partir para o front. A mesma Companhia forneceu material para a confecção de distintivos aos combatentes da MMDC. O jornal Cruzeiro do Sul noticiou que chegou a cifra de 105 os voluntários sorocabanos que pertenciam aos quadros de funcionários das fábricas do Comendador Pereira Ignácio, o qual garantiu o salário dos mesmos durante todo o tempo de incorporação ao exército rebelde (CRUZEIRO DO SUL, 3 set 1932, p. 4).

Muitos dos sorocabanos partiram para Lorena, engajados no Batalhão Santos Dumont.

Oficialmente, a Frente Negra não quis participar desse Movimento. Com isso, ocorreu uma divisão nessa organização e fundou-se a Legião Negra, responsável pelo alistamento de homens negros que quisessem lutar pela constitucionalização do país. Com isso, em Sorocaba publicou-se a nota em que deixa claro que “O MMDC acceita inscripções dos valorosos homens de cor, para formarem batalhões da Legião Negra” (CRUZEIRO DO SUL, 13 ago 1932, p. 1). Sabe-se que dentre os sorocabanos que partiram pela Legião Negra estava o major João de Almeida Melces (CAVALHEIRO, 2013).

O Tiro de Guerra de Sorocaba enviou mais 100 homens, segundo os dados informados pelo historiador Aluísio de Almeida. Sobre o total de sorocabanos que partiram para os campos de batalha nessa Revolução, as informações são divergentes. Segundo o mesmo historiador Aluísio de Almeida, os números são bastante discrepantes. Diz o historiador:

Os primeiros voluntários são nitidamente nomes das classes não operárias. Em seguida, todos aderem. O jornal, refletindo a zoada popular, calcula em 2000 o número de sorocabanos nas fileiras. O M.M.D.C. ajuda-o nessa exaltação. Ora, ou as listas quase diárias das pessoas que seguiram foram injustamente incompletas ou o total não atingiu a 1000. Mas, 900 ou 950 é um número imponente (ALMEIDA, 2002, p. 401).

 

A segunda lista de voluntários sorocabanos contou com os seguintes nomes: Antonio Almeida Filho, José d’Ambrosio, José Soares, Abilio Soares Filho, Manoel Soares, Jorge Pilar, João Lisboa, Oswaldo Fasano, Sylvio Rocha, Germinal Signorelli, Pedro Oliveira e Antonio Antunes Almeida.

Em agosto, o hospital da Santa Casa de Sorocaba serviu quase que exclusivamente aos feridos nos combates. Também levantou-se um Hospital provisório no distrito de  Votorantim (ALMEIDA, 2002, p. 400).

Apesar da vontade e do empenho dos paulistas, as forças federais eram numericamente superiores. Diz o historiador Boris Fausto:

 

Mas a superioridade militar dos governistas era evidente. No setor sul, as forças do Exército contavam com 18 mil homens, além da Brigada Gaúcha e outros contingentes menores. Os paulistas não passavam de 8500 homens. As forças federais contavam também com munição suficiente e artilharia pesada, contrastando com a precariedade dos meios à disposição dos revolucionários. No ar, os paulistas perdiam nitidamente para a aviação do governo federal. A Revolução de 1932 marcou aliás o ingresso da aviação no Brasil como arma de combate, em proporções consideráveis.

Apesar do desequilíbrio de forças, a luta durou quase três meses. O ataque sobre o território paulista foi lançado a partir do sul do estado, da fronteira com Minas Gerais e do Vale do Paraíba (FAUSTO, 1999, p. 350).

 

Nos primeiros dias de outubro os jornais sorocabanos anunciam o armistício. Era o fim da Revolução Constitucionalista. Aos paulistas, a derrota com sabor de vitória: o Brasil teve a sua Constituição promulgada em 1934. Talvez por esse motivo essa seja a única Revolução não triunfante a receber, em sua homenagem, um feriado estadual.

 

 

Carlos Carvalho Cavalheiro

09.10.2016

Historiador

Colunista dos jornais ROL e Tribuna das Monções

Colaborador Emérito do Núcleo MMDC de Itapetininga

 

Bibliografia

 

ALMEIDA, Aluísio de. Sorocaba, 3 séculos de História. Itu: Ottoni, 2002.

CAVALHEIRO, Carlos Carvalho. Salvadora! Sorocaba: Crearte, 2001.

______________________. Nossa gente negra. Sorocaba: Crearte, 2013.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 1999.

 

Jornal Cruzeiro do Sul (Acervo do Gabinete de Leitura Sorocabano).

[1] Em um artigo intitulado “Nove de Julho”, o escritor Hilário Correia diz que “o primeiro voluntário sorocabano a partir para o front, arrastando atraz de si mais uma dúzia de êmulos (…) foi este seu amigo e criado”. Hilário Correia foi, portanto, o primeiro a se inscrever como voluntário na Revolução de 1932. O artigo citado foi publicado no jornal “O 3 de Março”, 14 de julho de 1957, 3ª página.

[2] “Aqueles ótimos novos governantes caíram ao sopro da Revolução de 1930, com os mesmos que combateram. Juntos se reergueram para a epopéia de 1932”. ALMEIDA, Aluísio de. Memória Histórica de Sorocaba (IX) – vol.XXXIX, nº 79. São Paulo: USP, 1969, p. 180.

[3] Grêmio Dramático Dicenta

Helio Rubens
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