Dica de Leitura: ‘MAGMA’, de João Guimarães Rosa
“Neste livro – Magma – Rosa canta toda beleza do nosso Brasil, a terra; a gente; a alma; o bem e o mal em poemas tais como: Iara, Caboclo d’Água, Ritmos Selvagens, Gruta do Maquiné, Luar do Mato, Boiada e em outros quatro poemas sobre o Araguaia – verdadeiro épico verde-amarelo.”
Uma lenda
22 de novembro de 1936, vai ser anunciado o parecer da Comissão Julgadora dos Concursos Literários de 1936 da Academia Brasileira de Letras. O relator da Comissão, Guilherme de Almeida enuncia o seguinte:
Vinte e quatro foram os originais a mim apresentados, que este ano se inscreveram no Concurso de Poesia da Academia.
A todos esses trabalhos dediquei, na leitura, uma firme, livre e igual atenção. Fiz-me assistir, no cuidadoso exame, por um único, bem simples critério: buscar e premiar poesia, poesia autêntica e completa, que é beleza no sentir, no pensar e no dizer.
Ora, a meu ver, um único, dentre os trabalhos apresentados, tem isso, e no mais puro, elevado grau. Poesia que está sozinha – parece-me – no atual momento literário brasileiro. Neste, como em quaisquer outros torneios, tal obra mereceria sempre um primeiro prêmio. E tão altamente distanciada paira ela sobre as demais, que não parece possível à concessão, a qualquer outra, de um aproximador segundo prêmio.
O livro em questão era MAGMA, o primeiro livro de um jovem escritor de 28 anos. Ainda na opinião de Guilherme:
… extraordinariamente atual, mas de atualismo certo e proveitoso, tanto nas concepções, como no verso livre tão dominador que nele nem sequer se nota a ausência do metro ou rima; e – o que é notável – na linguagem “nossa”, porém, correta sempre, sem um único abuso inútil, sem nenhuma dessas bobas, contra producentes negações da gramática, com que alguns “novos” pretendem ser… novos. E nem se diga que o autor de Magma não mede nem rima por não saber medir ou rimar…
O jovem escritor era nada mais nada menos que João Guimarães Rosa e esse, o seu livro de estreia. Foi o primeiro e também o último de poesias.
Justamente esse primeiro livro, que Rosa resolveu inscrever no Concurso, causou tanto alvoroço que a Comissão decidiu não atribuir o segundo prêmio a nenhum outro trabalho inscrito, tal a disparidade que havia entre o livro de João Guimarães Rosa e os demais, nenhum outro poderia sequer se aproximar – em qualidade – do dele.
Neste livro – Magma – Rosa canta toda beleza do nosso Brasil, a terra; a gente; a alma; o bem e o mal em poemas tais como: Iara, Caboclo d’Água, Ritmos Selvagens, Gruta do Maquiné, Luar do Mato, Boiada e em outros quatro poemas sobre o Araguaia – verdadeiro épico verde-amarelo.
Além disso, há também todo o lirismo de poemas como: Elegia, Impaciência, Delírio, Ausência, Toada da Chuva, Saudade, etc.
Dentre os poemas de Magma destacam-se nove tercetos enfeixados sob o título de “Hai-kais” – o que na época era novidade – mas, julgo que isso deve ter despertado a simpatia do relator, pois nessa altura dos acontecimentos, Guilherme de Almeida já havia publicado vários haicais em seus livros.
Mas, voltando ao Magma, poder-se-ia dizer que o poeta esgotou nesse livro todas suas possibilidades, não conseguindo escrever mais poesias.
Mas sabemos que não é bem assim, pois se ele não deu mais vazão à sua veia artística na poesia, consolidou-se posteriormente como um dos maiores prosadores em língua portuguesa. Qualifica-o para tanto, os romances: Sagarana, Noites do Sertão, Corpo de Baile e a sua obra-prima: Grande Sertões: Veredas.
Magma ficou por 60 anos sem ser publicado e ganhou o status de lenda. Conhecido de uns poucos, inacessível a muitos; tinha existência clandestina.
Confesso que, já tendo ouvido a história do livro, julgava – assim como muitos outros – que realmente se tratava de uma lenda. Até que um livreiro, amigo meu, alertou-me que o livro existia e já havia sido publicado em 1996 ou 1997. Não sosseguei enquanto ele não conseguiu um exemplar para mim. Concordo com tudo que Guilherme de Almeida disse sobre o livro na época. Hoje, mais de 80 anos passados, o livro continua atualíssimo.
Para quem gosta do prosador João Guimarães Rosa, tem por obrigação conhecer também este livro, que foi a única manifestação de Rosa como poeta.
Há somente um porém, Magma foi publicado pela Editora Nova Fronteira em 1997, e encontra-se esgotado atualmente. Pesquisando na Estante Virtual, encontram-se exemplares a partir de R$ 200,00, passando por R$ 400,00; R$ 650,00, chegando mesmo a R$ 1000,00.
Gonçalves Viana
v_aparecido@ig.com.br
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Natural de Sorocaba (SP), é escritor, poeta, revisor de livros e Editor-Chefe do Jornal Cultural ROL. Acadêmico Benemérito e Efetivo da FEBACLA; membro fundador da Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA e do Núcleo Artístico e Literário de Luanda – Angola e membro da Academia dos Intelectuais e Escritores do Brasil – AIEB. Autor de 8 livros. Jurado de concursos literários. Recebeu, dentre várias honrarias: pelo Supremo Consistório Internacional dos Embaixadores da Paz, o título Embaixador da Paz e Medalha Guardião da Paz e da Justiça; pela Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente o título de Conde; pela Soberana Ordem da Coroa de Gotland, o título de Cavaleiro Comendador; pela Real Ordem dos Cavaleiros Sarmathianos, o título de Benfeitor das Ciências, Letras e Artes; pela FEBACLA: Medalha Notório Saber Cultural, Comenda Láurea Acadêmica Qualidade de Ouro, Comenda Ativista da Cultura Nacional; Comenda Baluarte da Literatura Nacional e Chanceler da Cultura Nacional; pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos os títulos de Doutor Honoris Causa em Literatura, Ciências Sociais e Comunicação Social. Prêmio Cidadão de Ouro 2024