Pedro Israel Novaes de Almeida
A reforma agrária sempre foi um tema de cunho ideológico, e como tal jamais será pacificado.
A posse e propriedade de terras envolve guerra de conquistas, usurpação, favores históricos de poderosos e outras modalidades pouco nobres. Envolve também o heroísmo de desbravadores em regiões inóspitas e a aplicação de recursos oriundos do trabalho lícito, não raro obra de gerações.
Nosso ordenamento jurídico submete a propriedade ao cumprimento de sua função social, aspecto igualmente tumultuado por visões ideológicas e pouco técnicas. Do abandono total ao máximo explorável, não é possível uma tabela fria e objetiva de produtividades, até pelo fato da agricultura não estar confinada ao intervalo entre o plantio e a colheita.
A decisão de plantio envolve uma centena de parâmetros, que vão do mercado à estrutura disponível, passando pela disponibilidade de recursos e conveniências técnicas, sociais e econômicas. É comum a opção por uma produtividade menor, com menores riscos e custos. A agricultura não é uma indústria, onde o somatório dos componentes sempre conduz, com precisão matemática, ao produto final.
Fingir que persegue uma safra, só para enganar a fiscalização, é como adquirir um bilhete de loteria para jogá-lo fora. Nenhum agricultor ou pecuarista é capaz de tal loucura.
O agricultor ou pecuarista, hoje, encontra-se submetido a ordenamento que obriga o cuidado com o meio ambiente, o cumprimento das obrigações trabalhistas e trato respeitoso com a saúde humana, vegetal e animal. A água é passível de outorga, e defensivos, em tese, necessitam de receituário.
A controvérsia da reforma agrária foi agravada pela artificial divisão entre o agronegócio e a agricultura familiar. O agronegócio nem sempre é pérfido explorador, e nem sempre a agricultura familiar é coitada. Ambos empregam e produzem.
A propriedade da terra já não é requisito essencial à produção, e aí estão posseiros, meeiros, parceiros e arrendatários, aos milhões, muitos preferindo o maquinário ao solo próprio. Indispensável é a segurança jurídica de ver garantida sua condição de acesso à terra.
A atividade rural não suporta, a qualquer título, a interrupção forçada, decorrente de invasões. As invasões constituíam meios de forçar a desapropriação oficial ou a apropriação ilegal, até que evoluímos para o dispositivo, por vezes descumprido, de que terra invadida não é desapropriável.
As invasões e ocupações forçadas desafiam nossa civilidade, constituindo tribunais de exceção e exércitos de execução. Na verdade, apesar dos apelos humanitários e sociológicos, negam validade ao próprio sistema político e constitucional, inimigos da propriedade e censores de explorações. O Estado brasileiro tem sido leniente com invasões e invasores.
A ideia de que toda reintegração deve ser precedida por tentativa de conciliação desprestigia a propriedade e posse, alongando invasões ilegais, injustas e, não raro, vândalas.
Dar terras, a quem terras não tem, é como dar caminhões a motoristas, marcenarias a marceneiros, escolas a professores e hospitais a médicos. Mais acertado seria um projeto de financiamento de lotes, urbanos ou rurais, com estrutura e condições para que seja edificada a moradia ou implantada a produção.
O autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.