Nessa terra mágica, desperdiçar grandes quantidades de materiais e alimentos é algo normal e sem propósito
Era uma vez um mundo de risadas sem fim, piadas e brincadeiras sem nexo, besteirol na máxima potência e muito, muito desperdício. Para fazer parte desse mundo fantástico basta acessar a tela do smartphone, tablet, computador ou outro dispositivo com acesso à internet.
Esse espaço está disponível para todas as idades, mas é principalmente destinado aos mais jovens – crianças e adolescentes ou adultos com idade mental semelhante – que ficam petrificados diante desses vídeos e, em alguns casos, abobalhados.
Como em quase tudo, quando generalizamos, obviamente, injustiças são cometidas. O vasto universo da comunicação digital possui de tudo, mas entre os maiores sucessos no YouTube há verdadeiros atentados ao bom senso, à sanidade mental e tão grave quanto, incorre na apologia ao desperdício de materiais e alimentos.
São banheiras e piscinas preenchidas com, por exemplo, 200 quilos de Toddy; 80 quilos de Nutella; centenas de pacotes de batatas chips; açaí, chantilly, marshmallow, refrigerantes e slime (um tipo de massinha encontrada em lojas infantis), Listerine, etc, etc, etc.
Essas “experiências” feitas por youtubers, como eles mesmos se referem, de relatar as sensações de entrar nessas banheiras e piscinas, recebem milhões de curtidas e, consequentemente, quantias significativas em suas contas bancárias.
O processo, no meu entender, é nefasto, pois quanto mais essa prática receber curtidas, e consequentemente audiência, mais as tais “experiências” vão se repetir.
Quero deixar claro que nada tenho contra jovens que se divertem e fazem experiências, mas os casos citados são só e tão somente jogar essas coisas fora. Esses vídeos não resultam em algum ensinamento? Se existe algum, eu não vi!
Eles normalmente alertam para não repetir o experimento em casa, o que não é garantia nenhuma que a bobagem não será replicada. Ao entrar nessa piscina ou banheira cheia de alguma coisa, os youtubers apenas soltam exclamações, gritos guturais diversos e alguns palavrões relacionados à sensação de ter o corpo inteiro imerso nesse produto. Portanto, nada que a obviedade ululante já não seria capaz de imaginar.
Vale lembrar que quase um bilhão de pessoas ao redor do planeta passam fome todos os dias. E o grande problema não é a falta de alimentos, mas a má distribuição e o desperdício. Segundo o relatório do Fundo das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, a FAO, em sua sigla em inglês, divulgado em outubro do ano passado, de 30% a 50% de todo o alimento produzido vão parar em lixões ou aterros sanitários, são incinerados ou servem de ração para animais.
Tenho consciência que não são 200 quilos de um achocolatado que farão diferença num mundo repleto de desperdícios e destruições cotidianas e mais graves, mas é de assustar os malefícios potenciais que esses jovens influenciadores estão a causar nas cabeças de nossas crianças e adolescentes.
Enquanto as escolas têm buscado fazer um ótimo trabalho de conscientização quanto à reciclagem, reuso de materiais e aproveitamento de alimentos, entre outros, esses comunicadores fazem o contrário. Na busca desenfreada por cliques e aumento no faturamento, apelações não têm limite. E, mesmo que façam crer alguns desses youtubers, esse mundo de recursos ilimitados não existe.
Orientar nossos filhos para evitar ou criticar esses vídeos é uma boa maneira de começar a mudar essa realidade.
Aproveito para convidar os leitores a acessar o site do livro de minha autoria que trata exatamente de consumo e desperdício, Um Dia no Dia da Ana Luiza e da animação Rebelião das Águas.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.