“Vinicius havia terminado um novo poema que falava de Itapoã, que pretendia entregar para o baiano Dorival Caymmi musicar, era ‘Tarde em Itapoã'”
Em 1970, Vinicius e Maria Creuza foram fazer uma turnê em Buenos Aires, e levaram Toquinho para terem um violão brasileiro no acompanhamento. A turnê foi um sucesso total. O show contava com canções conhecidas de Vinicius, em parcerias com Tom Jobim, Baden Powell e Carlos Lyra e “Que Maravilha” de Toquinho e Jorge Bem. Não havia ainda uma parceria entre Toquinho e Vinicius. No navio, de volta para o Brasil, Toquinho mostrou ao poeta um samba sem letra, Vinicius gostou do tema e ficou com a ideia de fazer uma letra.
Com o sucesso da turnê argentina, Gessy Gesse, a mulher de Vinicius, na época, sugeriu que se fizesse um show no Teatro Castro Alves, em Salvador, Bahia. Maria Creuza tinha outros compromissos, então Vinicius convidou Marília Medalha e, mais uma vez, Toquinho. No ônibus, a caminho de Salvador, ele se lembrou do samba que Toquinho havia lhe mostrado, terminou a letra, chamando-a de “Como Dizia o Poeta”, que foi também o nome do show. O enorme sucesso, advindos dos três dias do show, inaugurou a parceria, deixando antever o futuro que teria a dupla.
Com a temporada na Bahia, e o sucesso de “Como Dizia o Poeta”, surgiram novas canções como “A Bênção Bahia” e “Mais Um Adeus”. Toquinho julgava que a parceria fosse parar por aí, o que já estaria de bom tamanho para quem estava em início de carreira como ele.
Vinicius havia terminado um novo poema que falava de Itapoã, que pretendia entregar para o baiano Dorival Caymmi musicar, era “Tarde em Itapoã”. Toquinho ficou maluco, queria porque queria, de qualquer maneira musicar aquele belo poema, mas disputar com o bom baiano Caymmi seria uma tarefa árdua demais para um quase iniciante e, ainda por cima, paulista.
A solução foi furtar a letra. Numa noite, antes de embarcar para São Paulo, onde teria de resolver assuntos particulares, simplesmente pegou a letra e viajou. Três dias depois, voltou à Bahia com a melodia pronta e, conta ele, que:
Vinicius ficou ouvindo um tempão a música, e não falava nada. Ficava ouvindo no gravador, quieto, fumando, meio indeciso, tentando não se convencer. E o pessoal já começava a cantar na casa. Aí, ele me chamou e me disse que não ia dar mais ao Caymmi. Foi nessa que ganhei o poeta!
Foi um dos maiores sucessos da música brasileira. A dupla fez uma gravação simples, só com violão e voz, e enviou para a Rádio Difusora de São Paulo. Quando a música começou a ser tocada, havia entre os ouvintes gente de peso, como João Gilberto, que telefonou a Toquinho dizendo: “acho que você não sabe o que fez nessa melodia…”. Logo depois, foi a vez de Baden Powell confessar que “essa volta no refrão, essa mudança harmônica na frase ‘ouvindo o mar de Itapoã’, é uma das coisas mais bonitas que já ouvi”. Opinião semelhante à que Gilberto Gil emitiu, quando gravou a música para o CD “30 Anos”.
Se Vinicius tinha ainda algum receio em relação ao novo parceiro, ele desapareceu por completo. Depois de “Tarde em Itapoã” a produção da dupla deslanchou, tornando-se um fenômeno pouco visto na MPB.
Gonçalves Viana -vianagaparecido@gmail.com
TARDE EM ITAPOÃ
Um velho calção de banho
O dia pra vadiar
Um mar que não tem tamanho
E um arco-íris no ar
Depois na praça Caymmi
Sentir preguiça no corpo
E numa esteira de vime
Beber uma água de coco
É bom
Passar uma tarde em Itapoã
Ao sol que arde em Itapoã
Ouvindo o mar de Itapoã
Falar de amor em Itapoã (bis)
Enquanto o mar inaugura
Um verde novinho em folha
Argumentar com doçura
Com uma cachaça de rolha
E com o olhar esquecido
No encontro de céu e mar
Bem devagar ir sentindo
A terra toda a rodar
É bom… (bis)
Depois sentir o arrepio
Do vento que a noite traz
E o diz-que-diz-que macio
Que brota dos coqueirais
E nos espaços serenos
Sem ontem nem amanhã
Dormir nos braços morenos
Da lua de Itapoã
É bom… ( bis)
(Toquinho e Vinicius)
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Natural de Sorocaba (SP), é escritor, poeta, revisor de livros e Editor-Chefe do Jornal Cultural ROL. Acadêmico Benemérito e Efetivo da FEBACLA; membro fundador da Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA e do Núcleo Artístico e Literário de Luanda – Angola e membro da Academia dos Intelectuais e Escritores do Brasil – AIEB. Autor de 8 livros. Jurado de concursos literários. Recebeu, dentre várias honrarias: pelo Supremo Consistório Internacional dos Embaixadores da Paz, o título Embaixador da Paz e Medalha Guardião da Paz e da Justiça; pela Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente o título de Conde; pela Soberana Ordem da Coroa de Gotland, o título de Cavaleiro Comendador; pela Real Ordem dos Cavaleiros Sarmathianos, o título de Benfeitor das Ciências, Letras e Artes; pela FEBACLA: Medalha Notório Saber Cultural, Comenda Láurea Acadêmica Qualidade de Ouro, Comenda Ativista da Cultura Nacional; Comenda Baluarte da Literatura Nacional e Chanceler da Cultura Nacional; pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos os títulos de Doutor Honoris Causa em Literatura, Ciências Sociais e Comunicação Social. Prêmio Cidadão de Ouro 2024