setembro 19, 2024
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O Leitor Participa: Arnelos Vieira: 'Deus existe – uma história de Natal!'

“Foi quando, após um ‘estalo’, eu conversei e convenci minha esposa e funcionários, que revolucionaríamos mais uma vez a noite de Cruzeiro.

Minha mulher e eu éramos proprietários do “Emanuelle Bar”, que inauguramos em julho de 1988, no centro da cidade de Cruzeiro. Tratava-se de um bar/lanchonete/dançante noturno que funcionou de terça a domingo a partir das 20 horas, até às 5 da manhã, não raro, 6, 7 horas e às vezes até um pouco mais nos finais de semana, dependendo do clima, das presenças e da nossa disposição física.

Mas a atividade noturna sequencial dos anos seguidos nos saturou, levando-nos a encerrá-la após o carnaval, na quarta-feira de cinzas de 1991.

Naquela época os estabelecimentos comerciais do ramo encerravam suas atividades por volta das 23 horas do dia 24 de Dezembro. Essa data ainda era reservada para o recolhimento em família com ou sem a tradicional “ceia da meia noite”. Aqueles que não tinham o hábito de organizarem ceias, geralmente iam para a cama mais cedo ou para a casa de parentes ou amigos, mas sempre respeitando a reunião em família. ‘Carnatal’, muito comum nos dias atuais, naquela época, nem pensar.

Foi quando, após um ‘estalo’, eu conversei e convenci minha esposa e funcionários, que revolucionaríamos mais uma vez a noite de Cruzeiro. Já havíamos criado um bar decente disponível noite à dentro, tornando-o destaque e lembrado com saudades até hoje. Nós manteríamos aberto o ‘Emanuele Bar’ durante toda a madrugada de Natal, contando com o “pós-ceia” e quebrando outro tabu na cidade com muita música, alegria e animação até o dia raiar.

Conversei com clientes e a aceitação foi geral, inclusive com muitas as promessas do comparecimento maciço.

Fui para as duas emissoras de rádio da cidade, onde divulguei com entusiasmo a mais nova novidade, contando com a corroboração dos nossos amigos radialistas e apresentadores nos seus mais diversos programas. As pessoas nos cercavam nas ruas empolgadas com a nossa decisão e acenavam favoravelmente com suas presenças após os compromissos familiares.

Sabedores que seriamos a novidade e os “únicos” da noite, dobramos e até triplicamos tudo aquilo que disponibilizávamos para o funcionamento rotineiro do bar. Para ter-se ideia, comprávamos em média 50 caixas de cervejas por semana, nessa ocasião, foram 70; em média eram 30 frangos por semana, nessa oportunidade adquirimos 50, e assim com todos os demais produtos de consumo. Fizemos uma faxina especial no salão, as toalhas das mesas foram substituídas por novas, confeccionadas pela minha esposa. Minha cabeça parecia máquina registradora, imaginando os “cifrões” que essa noite especial nos proporcionaria.

E eis que é chegado o grande momento. Abrimos o ‘Emanuelle Bar’ exatamente às 20 horas do dia 24 de Dezembro. Música ambiente, o entusiasmo a flor da pele de todos nós, proprietários e funcionários.

Deu meia noite, havíamos vendido apenas 3 caixas de cervejas, outras 67 encontravam-se distribuídas em dois freezers e um grande balcão frigorífico que mantínhamos no corredor como suporte. Mesmo assim nos confraternizamos, família e funcionários. Colocamos nossas crianças para dormir, e seguimos entusiasmados pelo que estava por acontecer.

Confesso que a priori nos sentimos frustrados, pois esperávamos um movimento razoável até às 23 horas, mas tudo bem, nossos esforços estavam voltados mesmo era para a partir das 2 horas da madrugada.

E deu 2, 3, 4, 5 horas, fracasso total, a frustração desabou sobre todos nós.

Das 70 caixas de cervejas haviam sido consumidas não mais que 10. A cozinha se mantinha quase que intacta, pois pouquíssimas vezes fora acionada. Geladeiras, freezers e até a geladeira da nossa residência localizada no fundo do bar, não cabiam mais nada, lotadas que estavam de carnes, linguiças, queijos, baicons, calabresas, etc.

Por volta das 5h30, com as feições transtornadas, pedi à cozinheira que me fizesse o “prato do chefe”, que constava de quatro fatias de pão pullmann, queijo mussarela, presunto, filé de boi, dois ovos, alface, tomate e maionese, enquanto tomava um copo duplo de cachaça acompanhado de cerveja, inconformado e blasfemando pelo momento que estávamos vivendo.

De costas para a rua, ouvi três batidas cadenciadas com os nós dos dedos, num vidro imenso que separava o interior do estabelecimento com o externo. Virei-me e deparei com um ancião, estatura mediana, barba longa e cabelos desgrenhados, brancos, porém amarelados pela falta de asseio, trajes surrados e maltrapilhos, segurando um saco de estopa em uma das mãos.

Foi à gota d’água que levou-me a explodir todo o furor que se encontrava atravessado na minha garganta. Deixei rapidamente o balcão do bar, dei um murro na porta de vai e vem, daquelas tipo salão de filmes de faroeste que acessava à rua, dirigi-me aos berros contra o assustado e acuado ancião (Com essas mesmas palavras!) – ‘Porra, o que o senhor quer aqui? …’

Ele, com um olhar calmo, porém assustado, sofrido, quase que balbuciando disse-me – “Meu filho, por favor, estou faminto. Dê-me um pedaço de pão!”

Eu senti o chão sumir debaixo dos meus pés, o ar faltou-me nos pulmões, meus olhos inundaram-se de lágrimas, um nó doído de arrependimento apertou minha garganta quase impedindo a minha fala. Pela minha cabeça passou em segundos um turbilhão de pensamentos; meus filhos dormindo felizes com os brinquedos de Papai Noel, minhas geladeiras e freezers, empaturradas de comida, meus funcionários bem alimentados, minha família saudável, e aquele senhor, numa Noite de Natal, sem ninguém com quem confraternizar-se, sem um canto sequer para encostar, implorando por um pedaço de pão! …

Peguei o saco de estopa que ele carregava, segurei levemente em um de seus braços e lhe disse – “Entre, o senhor vai assentar-se a minha mesa e comerá comigo. Será meu convidado de Natal”.

Ele quis resistir, dizendo – “Mas eu estou sujo, mal vestido, não posso entrar na sua casa e nem sentar à sua mesa”.

Retruquei – “Nada disso, o senhor vai cear comigo, é o meu convidado especial de Natal”. E assim solicitei a minha cozinheira que fizesse um prato igual ao meu, para o nosso inesperado convidado.

Nos cerca de uns 40 minutos que levou da preparação do alimento até o seu consumo final, esse senhor comeu em silêncio, tomou refrigerante, e eu, sem abrir a boca, apenas observava-o. Depois de saciado ele levantou-se, e da mesma forma, em silêncio, pegou os seus pertences, deu a volta por trás de mim e com uma de suas mãos depositou-a em meu ombro, dizendo quase que em sussurro ao meu ouvido, com palavras cadenciadas e doces – “Meu filho, na tua casa nunca haverá de faltar nada. Deus sempre estará presente na sua vida”, e saiu tomando rumo ignorado.

Meditando suas palavras, levantei-me segundos depois e dirigi-me a rua, na esperança de vê-lo mais uma vez, porém ele já havia desaparecido como se fosse fumaça. Naquele momento, pensativo, eu assistia o dia amanhecendo e ouvindo os passarinhos despertando numa sinfonia de pios insistentes, numa árvore existente na porta de entrada do nosso estabelecimento, e vivenciando uma sensação de paz interior, uma calmaria há muito não experimentada e meio que inebriado com aquele acontecido incomum, fui trazido a realidade quando a Carminha, minha mulher, aproximou-se pegando um de meus braços e disse – “Vamos entrar? …, o pessoal está querendo ir embora”, referindo-se aos nossos colaboradores.

Ao voltar minhas costas para a rua com a intenção de arriar a porta de correr do nosso estabelecimento, isso, já por volta de umas 6h30 da manhã, para nossa surpresa começou a chegar e estacionar veículos que não paravam mais. Era gente a dar com pau, vinda de todos os cantos da região; Cachoeira Paulista, Lavrinhas, Queluz, Passa Quatro, e também de Cruzeiro. Parecia que haviam combinado de chegarem juntos. Dos dois lados da rua era só veículos estacionando.

Olhamo-nos assustados, funcionários e nós, proprietários, sem acreditar que aquilo estava acontecendo. O sorriso aflorou em nossas faces, e o ânimo tomou conta de todos, levando-nos a arregaçar as mangas e partir para a luta, numa corrente pra frente.

Resumindo; até as 13 horas dia do dia 25, as 24 mesas disponíveis no salão mantiveram-se ocupadas. A cozinha se perdia nas filas de pedidos de porções, caldos e canjas, as bebidas eram servidas celeremente. No final da festa, com o salão já fechado, estávamos moídos de tanto trabalhar, mas todo o nosso estoque de cervejas havia sido consumido, quase não sobraram comestíveis nas geladeiras, a cozinha parecia que havia sido tomada por um vendaval, tamanha a bagunça e o “caixa”, abarrotado de dinheiro. Até então eu nunca havia visto tanto dinheiro junto.

Como explicar esse ocorrido? …

Algumas pessoas afirmam ter sido a presença de Deus em nossas vidas, na figura desse andarilho, que nos recompensou pelo fato de termos lhe dado atenção. Mas eu acredito numa versão mais lógica. Mesmo revoltado e frustrado pela situação vivida até aquele momento, ao manter o bar aberto motivado pela presença misteriosa daquele nosso visitante especial, permitiu que essas incontáveis pessoas não batessem com a “cara na porta”, e assim, numa surpreendente invasão eles superlotaram e devastaram todo o estoque de consumo do nosso ‘Emanuele Bar’, como nunca havia acontecido antes. Tivesse eu apenas atendido o ancião na porta e mandado ele seguir, nada disso teria acontecido.

E assim vivemos esse momento mágico de intensa e rara felicidade, proporcionando-nos uma excelente soma de “cifrões” que se esvaíram no cumprimento de compromissos e aquisição de bens de consumo, porém a experiência inesquecível desse Natal, perpetuou-se para sempre em nossos corações, fazendo-nos acreditar que realmente DEUS EXISTE; ele está no meio de nós, nos nossos atos, atitudes, desejos e na nossa capacidade de perceber e sensibilizar que a vida é muito mais e maior do que imaginamos e que as soluções para os nossos problemas, que muitas vezes as vemos inalcançáveis, geralmente estão do nosso lado, bem próximo e não percebemos! …

QUE TENHAM TODOS UM FELIZ NATAL E UM ANO NOVO PROFÍCUO, DE MUITA PAZ, SAÚDE, MUITOS SONHOS REALIZADOS, AMOR E, PRINCIPALMENTE, O CORAÇÃO SEMPRE ABERTO PARA RECEBER NOVAS EMOÇÕES!  …

 

Arnelos Vieira – arvelosvieiraneto@gmail.com

Sergio Diniz da Costa
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