SELVAGENS
Não atingimos, ainda, um grau satisfatório de civilização, e, em alguns aspectos, ainda somos selvagens.
Campanhas de vacinação raramente conseguem atingir os objetivos iniciais, e muitas doenças, já erradicadas, retornam a nosso meio. Vítimas e gastos públicos são consequências de tal deseducação.
Os bancos de sangue vivem esmolando doações, chegando a níveis perigosos de armazenagem. A maioria das pessoas só atende aos chamados quando algum parente ou amigo próximo está internado, necessitando de socorro.
Rios e terrenos alheios são os destinos preferenciais do lixo, orgânico ou sólido. A facilidade e impunidade de tal procedimento gera constantes insalubridade e enchentes.
Todos juram amor aos animais, mas poucos não chutam os animais alheios, quando julgam necessário. A solidariedade, quase sempre dispensada aos que habitam o mesmo teto, raramente é estendida aos não próximos.
Se algum morador resolver plantar uma árvore na calçada, esmerando solitários cuidados, a vizinhança fica aguardando o surgimento da sombra, para estacionar seus veículos. Egoisticamente versados em direito intuído, vizinhos sentenciam que a rua é pública.
Temos a tendência de dispensar melhor tratamento a pessoas tidas como poderosas, famosas ou abastadas, que a nossos semelhantes. As piadas parecem mais engraçadas, as opiniões mais acertadas e os defeitos naturais e perdoáveis.
Apesar de sermos tradicionalmente ignorantes em matéria política, adotamos chavões como verdades supremas, e saímos por aí, palestrando superficialidades. Optamos por um partido antes de tendermos para alguma ideologia, e nosso comportamento eleitoral é semelhante ao de uma torcida uniformizada de futebol.
No trânsito, ser ultrapassado é sofrer ofensa grave, e fingir que é idoso ou deficiente, por breve período, nada mais é que salutar esperteza. Ostentar equipamento de som soa como ser social e economicamente incluído.
Cultuamos com fervor e passividade as modernidades nos costumes, e julgamos que tudo é válido e deve ser tolerado, desde, é claro, que não sejam praticadas por nossos filhos. Somos, quase todos, liberalíssimos da porta para fora, e cruéis ditadores, da porta para dentro.
Muitos se compadecem dos animais de rua, alimentando-os porta afora, mesmo que tais animais vivam mordendo e empestando a vizinhança. Quando criam animais dentro de casa, saem em passeio, obrigando os transeuntes à mudança de calçada e intimidação.
Sanitários públicos são tratados como pocilgas, emporcalhados a cada uso. Pobres e negros sempre parecem suspeitos. Com tudo isso, não é verdade que somos um povo ordeiro, trabalhador e respeitoso.
Pedro Israel Novaes de Almeida
o autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.