Mariana: Essa não é uma tragédia ambiental
O que aconteceu em Mariana é uma catástrofe para as vítimas, para a região, para o país e para o mundo. É uma tragédia e ponto
O distrito de Bento Rodrigues, na zona rural de Mariana (MG), foi completamente encoberto por lama após o rompimento da barragem
O rompimento das barragens de rejeitos de mineração da Samarco, em Mariana (MG), é mais um entre muitos exemplos do desleixo e da falta de responsabilidade que congrega e une todos os setores direta e indiretamente envolvidos com a fiscalização e o licenciamento ambiental no Brasil.
A destruição ainda está longe de conseguir ser devidamente contabilizada, pois o movimento da onda de rejeitos continua a se espalhar, sepultando em seu caminho rios, plantas, animais, cidades e pessoas. As próprias autoridades já decretaram a morte de Bento Rodrigues, pois o distrito de Mariana não deverá ser uma localidade habitável tão cedo. Faltam ainda também descobrir os danos que serão causados na passagem dessa lama pelo estado do Espírito Santo.
A multa de 250 milhões de reais aplicada recentemente pelo governo federal à Samarco representa apenas um pequeno paliativo quando o que deveria ter sido feito é trabalhar a prevenção, evitando o caos. Atividades suspensas, novas multas e até mesmo o encerramento dos trabalhos realizados nessa planta mineradora são esperados, mas nem de longe vão compensar o absurdo desse acontecimento.
Para piorar, o Congresso, que deveria estar atuando para impedir casos semelhantes, está a discutir o afrouxamento das leis que tratam exatamente dos riscos ambientais de grandes obras.
Em recente artigo, Mauricio Guetta, advogado e assessor do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA), apontou que entre outros, tramita um projeto de Lei, o de número 654/2015, do senador Romero Jucá (PMDB-RR), criando um “diminuto rito de licenciamento ambiental” para os empreendimentos de infraestrutura “estratégicos para o interesse nacional”, tais como, rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos e de energia ou quaisquer outros destinados à exploração de recursos naturais.
Para o advogado do ISA, isso significa que “as obras com maior potencial de causar significativos danos socioambientais seriam justamente às que seriam contempladas com menores controles e prevenção”.
Poderia e deveria ser uma brincadeira de mau gosto, mas não é. Até porque historicamente, quaisquer medidas compensatórias ou preventivas sempre foram consideradas empecilhos ao desenvolvimento. Mesmo que a realidade se imponha, a ganância ainda consegue prevalecer em detrimento do futuro.
O circo de horrores provocado pela lama da Samarco está longe de cumprir seu roteiro destruidor. Mas, pelo que podemos vislumbrar ao cessar esse espetáculo nefasto, nossas autoridades certamente irão nos contemplar com novos capítulos. Empenho não deverá faltar.
O que poderíamos tentar, ao menos, é usar as expressões mais próximas da realidade, como por exemplo, substituindo licenciamento ambiental, simplesmente por “licenciamento responsável e sustentável para o futuro de todos” e nomear corretamente uma tragédia como tal e não como ambiental.
Para muitos, a tragédia ambiental ainda soa como algo distante da vida das pessoas, o que demonstra cabalmente a sua inverdade no caso da Samarco. Tragédias que matam pessoas, destroem casas, sepultam rios e consomem florestas são tragédias, simples e tragicamente assim.
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