A gadanha*
Os anjos caídos cuspiram sombras
sobre a árvore de magnólia
refletida em um espelho de metal antigo
um movimento nas luzes projetadas pelo espelho
e os fantasmagóricos duendes do abismo abriram seus olhos
e riram
e eles atravessaram as paredes que separavam os séculos
e palavras antigas como ‘pandemia’ e ‘fim do mundo’
renovaram-se com o poder das sombras
e voltaram a habitar os lábios e estremeceram
gargantas e corações
alguns verbos como viajar tornaram-se proibidos
mas outros verbos como amar e acreditar
foram erigidos em herdeiros do trono de Cronos
e Cronos (matreiro) ergueu a gadanha
e cortou cabeças e triturou pescoços
e ficou sozinho como aquele pedaço de pão velho
que permanece esquecido em um banco de madeira de uma praça
onde alguns mendigos (cansados da vida) matam as horas
enquanto esperam serem mortos pela gadanha impiedosa de Cronos.
* Gadanha. Foice de cabo comprido para cortar feno; alfanje, gadanho.
Isabel Furini
isabelfurini@yahoo.com.br
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Natural de Avellaneda, cidade portuária da Província de Buenos Aires – Argentina, e radicada em Curitiba/PR, é escritora, poetisa e educadora. Publicou 35 livros, entre eles, ‘Os Corvos de Van Gogh’. Recebeu Comenda Ordem de Figueiró (RJ); Embaixadora da Palavra pela Fundação César E. Serrano (Espanha, 2017). Tem poemas premiados no Brasil, Espanha e Portugal. Realizou recitais poéticos na 36ª Semana Literária do SESC, 2017, PR, e na Biblioteca Pública de Burlingame, Califórnia, USA (2018). É Conselheira da AVIPAF (Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia).