O homem do metrô
Todo dia útil ela já criava a expectativa de vê-lo. Sabia que o encontraria na mesma estação de metrô, no mesmo vagão, ambos indo para o trabalho. Ele ingressaria duas estações após ela: alto, elegante, cabelo devidamente penteado, com um leve toque de gel, cheiro suave de perfume amadeirado, sapatos impecáveis. Olharia para ela sutilmente, que, desconcertada, desviaria o olhar, no instante seguinte. E, logo após, ela olharia para ele e ficariam nesse jogo de sedução até descerem juntos, numa das várias estações do centro da cidade. Manteriam um certo contato visual, até cada um seguir uma direção diferente. Todo dia era assim. Ela não dava sinais de que ele pudesse se aproximar, conversar com ela ou sentar-se a seu lado. Ele já tentara, mas em vão. Ela era muito insegura, mesmo nunca tendo visto uma aliança em no dedo daquele passageiro especial. Receava que seu admirador fosse comprometido ou que não gostasse de sua conversa.
Assim, os meses foram passando… Até que uma pandemia se espalhou pelo mundo e foi decretado um confinamento global. Teria que trabalhar de casa. A princípio, o período seria de duas semanas. Mas, para sua infelicidade, foi sendo estendido por mais duas semanas, dois meses, seis meses, até que a situação de teletrabalho durou por tempo indeterminado.
Dois anos após o confinamento, com a pandemia já controlada, sua empresa determinou o retorno às atividades presenciais. Ficou bastante animada: poderia rever o homem do metrô, no qual, inacreditavelmente, ainda pensava. No primeiro dia, pegou o mesmo vagão, na hora costumeira. Ele não ingressou nas estações seguintes. Passaram-se duas semanas e nada. Decidiu, então, antecipar-se em meia hora. Todavia, ele também não apareceu. Tentou sair um pouco mais tarde, mas seu objetivo de o encontrar restou frustrado, novamente. Estava ansiosa e triste. Muitos pensamentos tomaram sua mente e seu tempo: ‘Será que ele fora demitido durante a pandemia?; Será que mudara de bairro; Será que trocara de emprego?; Será que estaria trabalhado remotamente, em definitivo?; Será que morrera de Covid-19? Será? Será?….’
Então, ela refletiu: ‘Por que eu não me aproximei dele, enquanto tive oportunidade?’ – estava atormentada com esse pensamento. Afinal, o homem do metrô era bastante atraente, educado, charmoso e a admirava. E ela não estava envolvida com ninguém. O mínimo que poderia ter acontecido é que não houvesse afinidade na conversa e decidissem se afastar. E o máximo? Ah… isso sua imaginação já havia desenhado diversas vezes… Infelizmente, nunca saberá. Não permitiu que o destino – que batia à sua porta – entrasse e tomasse um café. A ocasião escapara. O tempo passara. O mundo mudara. Não havia mais o homem do metrô.
Patrícia Alvarenga
patydany@hotmail.com
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Natural do Rio de Janeiro/RJ, é escritora e poeta. Trabalha como Analista (área processual) do Ministério Público do estado do Rio de Janeiro. É Bacharel em Letras (UFRJ) e Direito (Uerj), pós-graduada em Educação (UFRJ). Dra.h.c. e Pesquisadora em Literatura. É autora do livro de poemas ‘Tatuagens da Alma – Entre Versos e Reflexões’, editora AIL, publicado neste ano, que foi escolhido como semifinalista do concurso ‘Livro do Ano 2021’, pela Literarte (o resultado do certame ainda não foi divulgado até a presente data). Participou do projeto ‘Parede dos Imortais’, na Casa dos Poetas, em Petrópolis-RJ, através da Associação Internacional de Escritores e Artistas. É coautora de, aproximadamente, 25 coletâneas. Detentora de prêmios literários, títulos e comendas, é também Embaixadora da Paz da Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos – OMDDH.
Membra vitalícia de seis academias literárias: ACILBRAS, FEBACLA, AIML, AIL, ALSPA (fundadora) e AILAP (fundadora). É ativista cultural nas redes sociais e participa de inúmeros saraus literários. Redes sociais:
Instagram: @patriciapoeticamente. Facebook: Patrícia Alvarenga