novembro 24, 2024
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Antônio Fernandes do Rêgo: 'Tardes de Vila Velha'

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Antônio Fernandes do Rêgo

Tardes de Vila Velha

Um dia, para nós Deus deixou a graça

Neste chão, nossa Escola se erguia.

Vem a vocação e à esperança se enlaça,

A Escola com nosso sonho se irradia.

 

Era um tempo de se plantar flores,

Um tempo de concórdia e de paixões,

De concretizar nosso pendores,

Partirmos para realizações.

 

Sessenta e dois anos já são passados,

Cheios de entusiasmos e felizes;

Vínhamos dos mais diversos estados,

Éramos Marinheiros Aprendizes.

 

Juntos vivemos sonhos de venturas,

E despertamos paixões pelos mares

Divisamos as projeções futuras

E alcançamos nossas formaturas.

 

Hoje nós não estamos tão dispersos,

Nossos sonhos de união são similares,

Portanto companheiros eu lhes peço

Peço a todos vocês por onde andares,

 

Que escutem a canção que escrevi

Que leva ao tempo de nossos arraiais

Um tempo em que sonhei e que vivi

Com alegrias que não voltam jamais:

 

Levo sob as cãs nevadas

Indestrutíveis saudades

Numa canção refugiadas,

Meus vergéis da mocidade

Estre as brumas das estradas.

 

Vila Velha, Vila Velha,

Da Enseada de Inhoá,

Olhando para ilha bela… (*)

Quantas lembranças de lá,

Porta aberta… uma aquarela.

 

Há lá no morro da Penha

Velando de sentinela,

Cravada em incultas penhas,

A monástica capela,

Onde o levita se empenha.

 

E no alto doutra colina

Eu via de lá do plantão

A trilha das peregrinas

Traçando curvas no chão,

Na romaria vespertina.

 

Vila Velha, Vila Velha,

Sonhos de tempos atrás,

Quando era o amor, Isabela,

Arrojado aos temporais,

Aos turbilhões e procelas.

 

Tudo era belo, Isabela!

Talvez te lembres, airosa,

Se é que tua alma revela

Aquelas tardes saudosas

Qual contos de Cinderela.

 

Quando para folga o apelo

Da corneta tagarela,

Eu ia soltar teu cabelo

Daquela fita amarela

Tratados com teu desvelo.

 

Eu ouvia os teus clamores:

“Volta, volta aqui na primavera!

Sente o olor destas flores,

Guarda em tuas escleras

Estes jardins, estes primores.”

 

Na barcaça a travessia,

Para o cine São Luiz,

Das matinês a alegria,

Quando contente e feliz

Cada instante se vivia.

 

Tua face tão serena

Me inspirava tanta calma,

Como noites de lua plena

Trazia-me no fundo da alma

Uma empatia tão amena.

 

O som de doces canções

Vinha de teus sábios risonhos,

Nos apertavam os corações,

Alimentavam nossos sonhos

As nossas loucas ilusões.

 

Lembras-te de que falei,

No cais daquela ilha bela?

Minha alma pra ti deixei,

Tu te lembras, Isabela,

O amor era nossa lei.

 

Os grumetes entoavam,

Do convés, canções singelas

Que minha voz entalavam;

Já era a saudade, Isabela,

Que aquelas vozes soavam.

 

E o vento soprava forte,

Teus negros cabelos voavam,

Seriam os cantos da sorte

Que aquelas ondas tocavam

Pra minha estrela do norte?

 

No mar, a rosa vermelha,

Lembras-te acaso, Isabela?

Oh filha de Vila Velha!

Sorriste ainda mais bela,

Que rosa em ti se espelha.

 

E eu te falava em apelos:

Tu levas minha alma, alma bela!

Nas ondas destes cabelos,

Do teu cabelo, Isabela?!…

Era um sonho… Meus castelos…

 

Caía o sol no poente

Da onda a crista dourada

Quebrava-se suavemente,

Da nave já afastada

Te vi triste e sorridente.

 

Pude ao longe vislumbrar

Teu vulto, um ar de gazela,

Com tua echarpe acenar;

Como eras bela, Isabela,

Com os teus olhos de mar!

 

Quando aquela nau zarpou,

Estavas em minha sina,

Mas o destino mudou

O que sonhei na colina,

Meu sonho o vento levou…

 

Um dia, a um porto me ancorar,

Lembrei-me de vila velha,

Pus em teus lábios sonhar,

Vi boiando uma flor vermelha,

Mas era onda de outro mar.

Antônio Fernandes do Rêgo

aferego@yahoo.com.br

(*) Uma referência à Ilha de Vitória (ES).

 

 

 

 

 

Sergio Diniz da Costa
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