Tardes de Vila Velha
Um dia, para nós Deus deixou a graça
Neste chão, nossa Escola se erguia.
Vem a vocação e à esperança se enlaça,
A Escola com nosso sonho se irradia.
Era um tempo de se plantar flores,
Um tempo de concórdia e de paixões,
De concretizar nosso pendores,
Partirmos para realizações.
Sessenta e dois anos já são passados,
Cheios de entusiasmos e felizes;
Vínhamos dos mais diversos estados,
Éramos Marinheiros Aprendizes.
Juntos vivemos sonhos de venturas,
E despertamos paixões pelos mares
Divisamos as projeções futuras
E alcançamos nossas formaturas.
Hoje nós não estamos tão dispersos,
Nossos sonhos de união são similares,
Portanto companheiros eu lhes peço
Peço a todos vocês por onde andares,
Que escutem a canção que escrevi
Que leva ao tempo de nossos arraiais
Um tempo em que sonhei e que vivi
Com alegrias que não voltam jamais:
Levo sob as cãs nevadas
Indestrutíveis saudades
Numa canção refugiadas,
Meus vergéis da mocidade
Estre as brumas das estradas.
Vila Velha, Vila Velha,
Da Enseada de Inhoá,
Olhando para ilha bela… (*)
Quantas lembranças de lá,
Porta aberta… uma aquarela.
Há lá no morro da Penha
Velando de sentinela,
Cravada em incultas penhas,
A monástica capela,
Onde o levita se empenha.
E no alto doutra colina
Eu via de lá do plantão
A trilha das peregrinas
Traçando curvas no chão,
Na romaria vespertina.
Vila Velha, Vila Velha,
Sonhos de tempos atrás,
Quando era o amor, Isabela,
Arrojado aos temporais,
Aos turbilhões e procelas.
Tudo era belo, Isabela!
Talvez te lembres, airosa,
Se é que tua alma revela
Aquelas tardes saudosas
Qual contos de Cinderela.
Quando para folga o apelo
Da corneta tagarela,
Eu ia soltar teu cabelo
Daquela fita amarela
Tratados com teu desvelo.
Eu ouvia os teus clamores:
“Volta, volta aqui na primavera!
Sente o olor destas flores,
Guarda em tuas escleras
Estes jardins, estes primores.”
Na barcaça a travessia,
Para o cine São Luiz,
Das matinês a alegria,
Quando contente e feliz
Cada instante se vivia.
Tua face tão serena
Me inspirava tanta calma,
Como noites de lua plena
Trazia-me no fundo da alma
Uma empatia tão amena.
O som de doces canções
Vinha de teus sábios risonhos,
Nos apertavam os corações,
Alimentavam nossos sonhos
As nossas loucas ilusões.
Lembras-te de que falei,
No cais daquela ilha bela?
Minha alma pra ti deixei,
Tu te lembras, Isabela,
O amor era nossa lei.
Os grumetes entoavam,
Do convés, canções singelas
Que minha voz entalavam;
Já era a saudade, Isabela,
Que aquelas vozes soavam.
E o vento soprava forte,
Teus negros cabelos voavam,
Seriam os cantos da sorte
Que aquelas ondas tocavam
Pra minha estrela do norte?
No mar, a rosa vermelha,
Lembras-te acaso, Isabela?
Oh filha de Vila Velha!
Sorriste ainda mais bela,
Que rosa em ti se espelha.
E eu te falava em apelos:
Tu levas minha alma, alma bela!
Nas ondas destes cabelos,
Do teu cabelo, Isabela?!…
Era um sonho… Meus castelos…
Caía o sol no poente
Da onda a crista dourada
Quebrava-se suavemente,
Da nave já afastada
Te vi triste e sorridente.
Pude ao longe vislumbrar
Teu vulto, um ar de gazela,
Com tua echarpe acenar;
Como eras bela, Isabela,
Com os teus olhos de mar!
Quando aquela nau zarpou,
Estavas em minha sina,
Mas o destino mudou
O que sonhei na colina,
Meu sonho o vento levou…
Um dia, a um porto me ancorar,
Lembrei-me de vila velha,
Pus em teus lábios sonhar,
Vi boiando uma flor vermelha,
Mas era onda de outro mar.
Antônio Fernandes do Rêgo
aferego@yahoo.com.br
(*) Uma referência à Ilha de Vitória (ES).
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Natural de Sorocaba (SP), é escritor, poeta, revisor de livros e Editor-Chefe do Jornal Cultural ROL. Acadêmico Benemérito e Efetivo da FEBACLA; membro fundador da Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA e do Núcleo Artístico e Literário de Luanda – Angola e membro da Academia dos Intelectuais e Escritores do Brasil – AIEB. Autor de 8 livros. Jurado de concursos literários. Recebeu, dentre várias honrarias: pelo Supremo Consistório Internacional dos Embaixadores da Paz, o título Embaixador da Paz e Medalha Guardião da Paz e da Justiça; pela Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente o título de Conde; pela Soberana Ordem da Coroa de Gotland, o título de Cavaleiro Comendador; pela Real Ordem dos Cavaleiros Sarmathianos, o título de Benfeitor das Ciências, Letras e Artes; pela FEBACLA: Medalha Notório Saber Cultural, Comenda Láurea Acadêmica Qualidade de Ouro, Comenda Ativista da Cultura Nacional; Comenda Baluarte da Literatura Nacional e Chanceler da Cultura Nacional; pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos os títulos de Doutor Honoris Causa em Literatura, Ciências Sociais e Comunicação Social. Prêmio Cidadão de Ouro 2024