Marcelo Paiva Pereira: ‘EDIFÍCIOS GARAGEM: UMA MEDIDA À MOBILIDADE’
Os edifícios-garagem são objeto de discussões que almejam à melhoria do trânsito urbano. A Administração Pública do Município de São Paulo acolheu, no Plano Diretor Estratégico e no projeto-de-lei do zoneamento urbano, a criação de áreas estratégicas para edifícios-garagem, entendendo pela eficácia deles para a finalidade almejada. O presente texto abordará, mesmo superficialmente, o aludido tema como abaixo segue.
PRÓLOGO
O primeiro automóvel com motor de combustão interna e movido a gasolina foi inventado por Karl Friedrich Benz em 1885 na cidade de Mannheim, Alemanha, e a patente obtida aos 29 de janeiro de 1886. O primeiro edifício-garagem surgiu em 1925 na cidade de Berlim, Alemanha, no qual elevadores transportavam os automóveis para as vagas nos andares. No Brasil o primeiro edifício-garagem foi construído em 1954 em São Paulo/SP.
Ao longo de 130 anos o mundo acolheu milhões de automóveis circulantes por todas as cidades e em muitas áreas rurais, contribuindo para a redução dos espaços à fluidez do trânsito nas vias urbanas. No Brasil o número de automóveis cresceu desde 1950, quando havia aproximadamente 425 mil, atingiu 3,1 milhões na década de 70 do século XX e em 1997 atingiu mais de 54 milhões. Em São Paulo/SP há em torno de 7 milhões de automóveis para 11 milhões de habitantes, perfazendo a razão de 1,6 pessoa por automóvel.
Desde o surgimento o automóvel se apresentou como um meio de transporte confortável e resistente, capaz de transportar várias pessoas, protege-las da chuva, do frio e do sol, e garantir a mobilidade com mais rapidez do que as carruagens, tílburis, carroças e cavalos anteriormente existentes como meios de transporte.
Ele seduziu as pessoas de todas as sociedades e por todos os países, criando nelas o desejo pelo conforto, velocidade, elegância e “status”. O mundo se rendeu ao automóvel e as cidades do século XX o acolheram como meio de transporte de massa, que supriria as necessidades dos habitantes.
As cidades, entretanto, não acompanharam o exacerbado crescimento da frota de automóveis, porque malhas viárias insuficientes e por vezes inadequadas não os acolheram ao longo dos dias de trabalho e dos horários de lazer. Mesmo havendo projetos urbanos bem intencionados, com propostas valiosas para melhorar a mobilidade urbana, foi inevitável o crescimento da frota de automóveis em razão do desejo de conforto que cada pessoa tem e quer realizar, tanto para si quanto para seus entes familiares.
O conforto almejado pelas pessoas não se limita ao comodismo oferecido pelo transporte individual; também se estende ao espaço urbano para as atividades diárias, como são o trabalho e o lazer, assistidas pelo aproveitamento do tempo. Se estas atividades forem prejudicadas por transtornos urbanos, como o congestionamento de ruas e outras vias públicas, o então pretendido conforto desaparece e é substituído pelo desconforto, exaustão física e psicológica e outros efeitos gravosos ao organismo e à mente.
DOS EDIFÍCIOS-GARAGEM
A proposta da Prefeitura do Município de São Paulo de permitir a construção de edifícios-garagem em locais estrategicamente definidos resulta do entendimento de que se deve integrar todos os meios de transporte para melhorar a mobilidade urbana.
O atual Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (PDE) – Lei municipal nº 16.050, de 01 de agosto de 2014 – prevê expressamente a criação de edifícios-garagem no Título II (Da Ordenação Territorial), Capítulo II (Da Regulação do Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo e da Paisagem Urbana), Seção I (Das Diretrizes para a Revisão da LPUOS), art. 27, “caput”, XIV:
“criar condições especiais para a construção de edifícios-garagem em áreas estratégicas como as extremidades dos eixos de mobilidade urbana, junto às estações de metrô, monotrilho e terminais de integração e de transferência entre modais;”
À luz do texto da supra mencionada lei, o poder público deverá criar condições especiais para a construção de edifícios-garagem, que deverão ser implantados em áreas estratégicas, cujos exemplos são:
- Extremidades dos eixos de mobilidade urbana;
- Junto às estações de metrô;
- Junto às estações de monotrilho;
- Junto aos terminais de integração e de transferência entre modais.
É preciso, porém, definir o que são “áreas estratégicas”. Sem essa definição, que poderá ser por outro comando normativo (lei ou decreto) ou pela interpretação do operador do direito (juiz de direito, por exemplo), a mencionada expressão ficará vaga, também dificultando a orientação – pela Administração Pública – à identificação dos mais adequados locais de implantação dos edifícios-garagem.
Ao encontro do art. 27, “caput”, XIV, da Lei municipal nº 16.050/14, o projeto-de-lei municipal nº 272/2015, que prevê o parcelamento do solo urbano do município de São Paulo, estabelece no Título I (Conceitos, Diretrizes e Estratégias de Ordenamento Territorial), art. 2º, VII, “o incentivo à integração, no uso do solo, dos diversos modos de transporte”.
Referido projeto-de-lei classifica o edifício-garagem no Título V (Do Uso do Solo), art. 87, sob a categoria “nR” (uso não residencial) e no inciso III, sob a subcategoria “nR2” (uso não residencial tolerável com a vizinhança residencial).
Os trechos dos mencionados PDE e projeto-de-lei abordados acima apontam para o interesse da Administração Pública pelos edifícios-garagem, integrando-os aos outros meios de transporte urbano, com o objetivo de melhorar a mobilidade urbana, a qualidade de vida, devolver o conforto urbano aos moradores da mencionada urbe e reduzir os riscos à saúde pública.
A eficácia da lei dependerá, contudo, do cumprimento por todos, incluindo-se a Administração Pública, as pessoas que habitem São Paulo ou por ela estejam de passagem e pelos profissionais habilitados, tais como os arquitetos e urbanistas, engenheiros, tecnólogos e outros profissionais que atuem em favor da mobilidade na capital paulista e do conforto almejado pelos moradores e visitantes.
A eficácia desses edifícios dependerá do número de vagas que cada edifício poderá abrigar, em função das regras de ocupação do solo a serem definidas a eles. Além deste elemento jurídico, também há de se examinar as técnicas de construção e os materiais mais apropriados para cada edifício (aço, concreto, tijolos, etc), em razão das condições geológicas, climáticas e urbanas do local.
Desenhar e implantar edifícios-garagem pelos engenheiros e arquitetos e urbanistas nos locais definidos pela Administração Pública Municipal será tarefa complexa, porque a dimensão de cada projeto estenderá seus efeitos ao entorno, atingindo outras áreas urbanas, modificando a movimentação de bens, serviços e pessoas, que se deslocarão com mais facilidade, inclusive às pessoas fora da capital paulista que, ao nela entrarem, poderão fazer uso desses edifícios para guardarem seus automóveis pelo tempo que permanecerem.
Daí a conveniência e oportunidade de distribuir esses edifícios-garagem em áreas estratégicas distantes do centro expandido da capital e distantes umas das outras, formando centralidades de comércio e serviços (previstas no PDE, Título III (Da Política e dos Sistemas Urbanos e Ambientais), Capítulo I (Da Política de Desenvolvimento Sustentável), Seção II (Centralidades Polares e Lineares), arts. 180 e 181).
Em relação às centralidades de comércio e serviços, o PDE, Título II (Da Ordenação Territorial), Capítulo III (Dos Instrumentos de Política Urbana e de Gestão Ambiental), Seção III (Dos Instrumentos de Ordenamento e Reestruturação Urbana), Subseção V (Das Áreas de Estruturação Local (AEL)), prevê o fortalecimento de centralidades, como consta do disposto no art. 149, § 1º, V. Este comando normativo permite a criação de bolsões de comércio e serviços – com autonomia financeira do centro da capital paulista – e a redução dos trajetos entre o local de trabalho e o de domicílio, por aqueles que trabalharem e morarem nessas áreas.
CONCLUSÃO
A criação e implantação de edifícios-garagem no município de São Paulo tem o escopo de melhorar a mobilidade urbana, devolvendo o conforto aos moradores e visitantes e diminuindo os riscos à saúde pública.
Para essa finalidade ser realizada é preciso integrá-los aos outros meios de transporte urbano e distribuí-los por diversas áreas estratégicas, distantes do centro expandido da capital junto à criação de centralidades de comércio e serviços com autonomia financeira para as atividades de trabalho, consumo e lazer, também diminuindo as distâncias entre os locais destas atividades e os de domicílio.
Em suma, os edifícios-garagem são uma medida à mobilidade porque tem por objeto o dimensionamento dos espaços urbanos e por finalidade o conforto aos moradores e visitantes, desenhados pelos arquitetos e urbanistas e engenheiros, amparados na exata medida da lei. Nada a mais.
Marcelo Augusto Paiva Pereira.
(o autor é aluno de graduação da FAUUSP)
FONTES DE PESQUISA
CAMARA.SP.GOV.BR. Disponível em: http://www2.camara.sp.gov.br/dce/projeto_de_lei.pdf. Acessado aos 02.09.2015.
FUMEC.BR. Disponível em: http://www.fumec.br/anexos/cursos/mestrado/dissertacoes/completa/rodrigo_luiz_pinheiro.pdf. Acessado aos 20.09.2015.
GESTAOURBANA.PREFEITURA.SP.GOV.BR. Disponível em: http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/arquivos/PDE-Suplemento-DOC/PDE_SUPLEMENTO-DOC.pdf. Acessado aos 21.11.2014.
NOSSASAOPAULO.ORG.BR. Disponível em: http://www.nossasaopaulo.org.br/noticias/novo-zoneamento-estimula-criacao-de-edificios-garagem-em-sp. Acessado aos 01.09.2015.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.