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A noite das vampiras: o ressuscitar do cinema fantástico nacional

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CINEMA EM TELA

Marcus Hemerly: ‘A noite das vampiras’

Entrevista com o diretor Rubens Mello


Banner sobre o lançamento do filme "A Noite das Vampiras"



Quando se lança um olhar linear sobre a evolução histórica do cinema nacional, inúmeros fenômenos ou movimentos exsurgem evidenciados. De um lado, apontamos o chamado Cinema Novo, com expoentes como Glauber Rocha, Cacá Diegue e Rui Guerra; estilo cinematográfico mais imerso em questões ou provocações sobre problemáticas sociais e existenciais, similar à Nouvelle Vogue francesa.


Aponta-se o Cinema Marginal, de pronunciadas feições experimentais e autorais, que se integrou às produções da Boca do Lixo paulistana, reduto onde se produziu o maior percentual de títulos no Brasil durante mais de duas décadas. Desde as chanchadas da Atlântida, a diversidade da Vera Cruz, e a multitude de temas tratados na também chamada Boca do Cinema (Boca do Lixo), é inolvidável reconhecer a gama criativa e força do cinema brasileiro.


Imprescindível ressaltar a palavra versatilidade, pois, filmou-se bangue bangue, policiais, musicais, seja estilo discoteca ou caipira, e até mesmo, o terror. E, à obviedade, quando se menciona o sinônimo de terror, o primeiro nome que assoma à mente é o do saudoso cineasta José Mojica Marins, mundialmente famoso como “Zé do caixão” ou Coffin Joe, no exterior, personagem por ele imortalizado em sua primeira incursão ao gênero na produção “À meia-noite levarei sua alma”, de 1964. A obra de José Mojica, seu tom fortemente inovador e criativo, quase no sentido visceral instintivo, merece não apenas um artigo, mas livros, ensaios e estudos fílmicos.


Nesse passo, Mojica era também conhecido pelos inúmeros discípulos, um em especial, sobre quem conheceremos um pouco da carreira. Recentemente, o cineasta guarulhense Rubens Mello, ator e autor de excelentes curtas-metragens encerrou as filmagens e processo de edição de seu primeiro longa, o terrir  “A noite das vampiras”.


O projeto conta com participações ilustres como as atrizes Nicole Puzzi e Débora Munhyz, musas do cinema paulista e estrelas de inúmeras produções famosas, além da atriz, roteirista e escritora Liz Marins Vamp, filha do mestre Mojica, falecido em 2020.


É cediço que a popularização e consumo do cinema nacional fortemente identificado nos anos 60, 70 e início dos anos 80, teve um decréscimo produtivo, inclusive concomitante à extinção da Embrafilme, nos anos 90. Desde então, o cinema brasileiro vem enfrentando dois extremos: vislumbrar-se, numa vertente, as produções com super financiamentos de concepção mais comercial, e de outro lado, um sufocamento à realização independente, tornando cada vez mais difícil fazer arte em terras brasileiras.


Digno de nota que o cinema fantástico e de terror, ainda sobrevive pontualmente, mesmo não revestindo-se de feições massificantes no que tange a distribuição ao grande público, mas permanecendo constante e crescendo cada vez mais em número e visibilidade. É o que se percebe pelos festivais e projetos cinematográficos governamentais ou privados daqueles que ainda ousam deixar a fera criativa da sétima arte se sobrepor às dificuldades práticas.


De forma recorrente, pontua-se que ao artista, além da capacidade criativa, agasalham-se as peculiaridades heroicas da ousadia e coragem. Nesse espaço, conheceremos um pouco sobre a carreira do diretor Rubens Mello e o processo de filmagem do longa que estreia no dia 05 de julho na Cinemateca Brasileira, um dos pontos mais celebrados da cultura nacional, o que, novamente, assimila dupla e inspirada congratulação ao cineasta e equipe.


ENTREVISTA: CONHECENDO O CINEASTA RUBENS MELLO



Compartilhe com os leitores um pouco da sua formação e cultivo da paixão pelo cinema. Como nasceu esse amor pela sétima arte, e, principalmente, o gênero de horror?

Desde pequeno sempre fui ligado no audiovisual. Grande parte da minha infância e juventude, ao contrário dos vizinhos, que brincavam empinando pipa, jogando bola e outras brincadeiras tradicionais para a época, eu sempre me vi sentado em frente à televisão. Assistia de tudo, desde os programas infantis a filmes e séries de aventura. 


Mas o cinema fantástico entrou em minha vida, quando, aos cinco anos de idade, assisti ao pé da escada o filme que meus pais assistiam: “O Fantasma da Ópera”, a versão de 1925 – com Lon Chaney. O contraste entre a luz e as sombras me assombrou por tempos, nas imagens oníricas que o filme proporcionou, e que ficarão imersas em meu subconsciente. O amor pelo fantástico se concretizou com “King Kong”, a versão original, de 1933. Imbatível até nos dias de hoje.




Sabemos que além de discípulo do saudoso José Mojica Marins, você foi cotado para ser o substituto do mestre, e com ele desenvolveu uma relação próxima. Conte-nos um pouco a respeito.

Minha avó morava próximo à “sinagoga” do Mojica, localizada no bairro do Brás.  Era inevitável cruzar com o “Zé do Caixão” quando íamos visitá-la. Eu, uma criança de colo com uns três anos de idade, acredito, morria de medo ao ver aquela figura de negro com unhas enormes.


Com o passar do tempo, desenvolvi o hábito de acordar de madrugada, para assistir filmes de terror na televisão, cuja programação vinha numa cessão dedicada a filmes de terror, nos jornais distribuídos no bairro, e assim, descobri os filmes do “Zé do Caixão”. 


Em 1998, descobri, por acaso, que  o Mojica procurava um ator que interpretasse o personagem “Zé do Caixão” no filme que encerraria sua trilogia, o “Encarnação do Demônio”, que originalmente, se passaria na época dos outros anteriores, “À meia-noite Levarei sua alma” e “Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver”.

O filme  acabou sendo produzido pela Gullane Filmes e Olhos de Cão, que queriam o Mojica como o personagem, sendo a história alterada para 40 anos depois dos eventos dos dois primeiros filmes.  Mas acabamos por criar uma relação de amizade incrível, e sempre colaboramos um com o outro em diversos projetos. Vivia ao seu lado em momentos cotidianos. Íamos ao mercado, jogávamos na loteria, assistíamos filmes juntos, fazíamos sonhos e planos e por aí vai. Até fui cobaia de seus experimentos culinários (risos).  São momentos que levarei para sempre com muito carinho.




Como você enveredou ao mundo do cinema?

Antes mesmo de conhecer o Mojica, eu já escrevia histórias e gravava os diálogos com amigos e vizinhos. Meu pai havia construído para mim uma caixa que eu chamava de “Lanterna Mágica”, que era uma caixa de madeira com o fundo recortado e uma peça de vidro transparente era colocada no espaço.  Dentro da caixa tinha duas manivelas e três lâmpadas, uma azul (para noite) uma branca/amarelada (para dia) e uma vermelha (para momentos tensos).  Na manivela inferior, eu colocava enrolado um rolo de desenhos colados sequencialmente, contando uma história, como um quadrinho sem balão de texto, pois os diálogos, como disse, eram gravados e sonorizados. 

Aos 16 anos, meu pai ganhou numa rifa um projetor e uma câmera de super 8. A câmera não funcionava, mas o projetor sim. Tenho guardado até hoje uma versão do “Drácula”(a versão de 1979) em película.  Depois, acabei ganhando uma câmera VHS.


Em meados de 2004, se não me falha a memória, a Liz Marins, filha do Mojica, que tinha um estúdio próximo à Paulista.  Nos reuníamos muito lá para assistir filmes, tomar vinho, fumar narguilé e fomentar arte e cultura.


Numa destas ocasiões, tinha exibido meu média metragem ‘Lâmia Vampiro”, e a Liz veio conversar comigo. Ela elogiou o filme, elogiou minha criatividade, mas também disse que eu tinha capacidade de fazer melhor, com enquadramentos etc. etc… ela me contou depois que ficou apreensiva sobre seu comentário, pois eu poderia interpretar mal o conselho dado.


Mas, ao contrário, entendi o que ela havia dito e guardei no coração e agradeço por tudo, pois logo após essa produção, produzi o curta que me deu 4 prêmios- “A História de Lia”. Inclusive, gravamos uma cena no estúdio dela.   Liz é para mim uma irmã e também minha madrinha no audiovisual. Tudo que sei e que faço, aprendi observando o Mojica e ouvindo os conselhos da Liz, minha maior incentivadora e apoiadora.


Minha saúde é muito frágil. Sou transplantado há 30 anos, e constantemente estou em hospitais por conta da baixa imunidade e doenças oportunistas, além de que, em decorrência da medicação que tenho que tomar, trouxe vários efeitos colaterais…e em todos os momentos, bons e ruins, ela esteve e está ao meu lado. 


Em  2002  dediquei parte da vida participando de filmes publicitários, participei de alguns curtas e longas metragens como “Carandiru’, ‘Meninos de Kichute’, “Encarnação do Dêmonio”. Sigo escrevendo e produzindo minhas histórias, tendo minha formação também como ator e locutor.




Quais as dificuldades principais em filmar no Brasil, e como se constrói as etapas de confecção de um longa-metragem?

O Brasil é um país complexo. Produzir arte-cultura não é tarefa fácil. Os instrumentos que possuímos, (editais e leis de incentivo) não são de fácil acesso e, geralmente, sempre ganham as “mesmas cartas marcadas”, mas toda regra tem exceção!


Meus filmes são produzidos de forma independente, ou seja, conto com apoio cultural, e todo o resto sai de meu bolso.  Já tentei duas vezes fazer essas plataformas de apoio e arrecadações virtuais e  por meio de vaquinhas, mas os apoios sempre foram poucos. Desisti!


A solução era: ou põe a mão bolso, ou não faz.   Ai, entra um grande exemplo que é do próprio Mojica, que vendeu até suas coisas pessoais para realizar o “À Meia Noite Levarei sua Alma”. E foi assim que realizei meu primeiro longa – “A Noite das Vampiras”, que tem sua estreia no dia 05/7 na Cinemateca Brasileira.


As etapas de produção  consistem em:

  1. Argumento/roteiro
  2. Pré-Produção
  3. Cronograma/orçamento
  4. Equipe/elenco
  5. Ensaios
  6. Estética
  7. Decupagem
  8. Filmagem/produção
  9. Montagem/Pós-produção
  10. Festivais/distribuição




A despeito de termos no Brasil grandes representantes do “Terrir”, união de horror a “pitadas” cômicas, a exemplo do cineasta Ivan Cardoso, tal vertente do cinema havia sido negligenciado nas últimas décadas, o que lhe inspirou a conceber o longa “A Noite das Vampiras” como uma releitura do gênero?

Antes de nos isolarmos por conta da pandemia, estávamos gravando, em fevereiro de 2020, o que seria meu primeiro longa, o filme “O Aniversário”


Estávamos na sexta diária e tivemos que interromper para ficarmos em quarentena.   No início de 2021, escrevi “A Noite das Vampiras”, inspirado por um curta que editei para a amiga Patty Fang, “Os Crimes da Rua do Arvoredo”. A ideia era fazer algo descontraído, um típico filme B, mas acho que derrubei fermento acidentalmente e o projeto cresceu, (risos).


Não quis retornar ao “O Aniversario”, pois a temática era pesada e cheio de temas tabus. Havia perdido muitos amigos, inclusive meu guitarrista. Então, queria algo leve, queria rir, descontrair, estar perto de pessoas que amo e me fazem bem.  Já tinha pensado em Debora Munhyz e Liz Marins “Liz Vamp”, e, numa conversa com a Debora, especulei sobre a possibilidade da Nicole Puzzi topar.  E que presente foi ela ter dito sim.   Hoje ela mora no meu coração e faz parte da minha vida. Sou só agradecimentos.


É impossível não relacionar o filme ao Ivan Cardoso –  Mestre do Terrir Nacional – até porque a Nicole já tinha trabalhado com ele no longa “As Sete Vampiras”.




Como você vislumbra o cenário atual do cinema brasileiro fantástico, e existe ainda espaço para os amantes da arte se aventurarem no processo de movie making?

Segundo Carlos Primatti, mestre no horror Brasileiro, cenário atual é a época mais prolífica em quantidade, qualidade e diversidade de propostas do horror no cinema brasileiro ao longo de toda a trajetória do gênero nas telas, desde o surgimento de Zé do Caixão, na metade dos anos 1960, passando pelo experimentalismo udigrúdi, o horror existencialista, o Cinema da Boca, de horror e as comédias e paródias de terror dos anos 1970 e 80, bem como o Cinema da Retomada, dos anos 1990 e 2000.


Atualmente, o cinema nacional circula mais que nunca fora do país. A disponibilidade de filmes em diversos formatos – e principalmente formatos digitais – aumentou bastante nos últimos anos, não apenas em festivais e mostras, mas também em locadoras e serviços de streaming.


Portanto, o espaço para novas produções existe e está acessível à produções que tenham um mínimo de qualidade.




Sabemos que, além de ator e cineasta, também é músico. Quais são seus futuros projetos artísticos, seja no cinema ou em outras veredas criativas?

Penso em retomar “O Aniversário”, também já tenho o argumento para “A Volta das Vampiras” e um sonho que é realizar “O Asema”, meu primeiro roteiro para longa, mas de difícil realização por conta de efeitos e maquiagens. “O Asema – Quando a Noite Chega” é um filme caro.


Também compus algumas canções e estou louco de vontade de entrar um estúdio para tirar do papel.


A Noite das Vampiras (2023)

Estreia: Dia 05/07/2023, na Cinemateca brasileira.

Endereço: Largo Sen. Raul Cardoso, 207 – Vila Clementino, São Paulo – SP, 04021-070

Os ingressos poderão ser retirados com uma hora de antecedência.



Sinopse:
Justine, uma famosa atriz de TV, criada por pais adotivos, é convidada para conhecer sua família biológica. O encontro se dá às vésperas de uma festa, que acontece anualmente, para celebrar o sucesso do açougue gerido pela sua família.  Mas, o que era para ser apenas uma reaproximação com sua verdadeira família, se torna algo sinistro, onde coisas absurdas acontecem, levando Justine a conhecer o verdadeiro segredo do sucesso dos negócios da família.


Elenco:

Debora Munhyz – Lenôra

Nicole Puzzi – Alecsandra

Liz Marins – Caterina

Alice Tarsitano – Justine

Marcio Farias – Eduardo

Petter Baiestorf – Dr. Hellstilingue

Cleiner Micceno – Astolfo Margarino

Dominique Brand – Marcela

Larissa Brito – Camila

Morgana Loren

Asteroides Trio


Equipe Técnica:

Direção e roteiro – Rubens Mello

Assistente Direção – André Okuma/Cleiner Miceno

Direção de Arte -André Okuma

Figurinos – Reiko Otake e Mayumi Otake (OTAKE-UP)

Fotografia – Nelson Simplício e Wesley Gabriel

Produção e produção executiva – Paulo Aros

Coprodução – Rubens Mello

Direção de Produção: Albino Ventura 

Produção DE SET – Filipe Fritos 

Assistente Produção – José Lino Silva

Som Direto – Guilherme Andrade

Gaffer – Filipe Fritos

TRILHA Kalau Franco

Efeitos Práticos – Estúdio Marítimo e Rubens Mello

MAQUIAGEM FX –  Willyam Ferrari, Ales de Lara e Karen Furbino

MAQUIAGEM – Reiko e Mayumi Otake

ANIMAÇÃO –Vinícius Martins

Stopmotion – Moises Pantolfi


Marcus Hemerly
marcushemerly@gmail.com

WhatsApp: 28/99994-1202



Voltar: http://www.jornalrol.com.br

Sergio Diniz da Costa
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