Carlos Carvalho Cavalheiro: ‘Ursulina Lopes Torres, a nossa primeira médica’ – Parte 2
Parte 2
Ursulina Lopes Torres tem seu nome registrado, enquanto médica, no Livro de Serviços Sanitários nº 5, de acordo com Olga Sofia Fabergé Alves, na sua dissertação “Farmacêuticos diplomados e algumas estratégias de institucionalização da Farmácia em São Paulo (1892 – 1934), apresentada para obtenção de Mestre em História pela Universidade de São Paulo (USP).
Por tradição oral, sabe-se que Ursulina foi a primeira médica a clinicar em Porto Feliz no ano de 1916. Por ter nascido em Sorocaba, Ursulina também é considerada a primeira médica de Sorocaba. Não foi a primeira do Brasil, como se aventou alguma vez. A primeira brasileira a receber a diplomação de médica foi a carioca Maria Augusta Generosa Estrela, que obteve apoio do governo imperial para estudar nos Estados Unidos, já que as leis brasileiras impediam o acesso da mulher ao curso superior de Medicina. Ela cursou medicina em Nova Iorque de 1875 a 1881, tendo validado seu diploma na Faculdade do Rio de Janeiro em 1882.
Com a reforma Leôncio de Carvalho, em 1879, as mulheres foram admitidas nas faculdades brasileiras. A primeira brasileira a se diplomar médica no Brasil foi a gaúcha Rita Lobato Velho Lopes, que iniciou o curso na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1881 e concluiu na Faculdade de Medicina da Bahia, em 1887.
Portanto, quando Ursulina Lopes Torres terminou a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1908, já havia se formado há 9 anos a Rita Lobato. No entanto, Ursulina foi pioneira na região de Sorocaba: a primeira dessa cidade e a primeira de Porto Feliz.
Em 1930, o jornal Correio Paulistano publica uma nota em que se induz que a nossa médica trabalhava como médica perita para a Prefeitura:
“[…] do sr. Celso de Sousa, adjunto do grupo escolar de Porto Feliz, pedindo licença. – Submetta-se a inspecção médica, em Porto Feliz, dirigindo-se aos drs. Antonio Pires de Almeida e Ursolina Lopes Torres” (Correio Paulistano, 09 jul 1930, p. 10).
Consta que Ursulina Lopes Torres clinicou em Porto Feliz de 1916 a 1940. Há informações de que possuía uma cultura invejável, era poliglota e morou por dois anos na Europa.
Por intermédio da historiadora Sônia Belon, que muito ajudou nesta pesquisa, eu pude entrar em contato com a professora Maria de Lourdes Rodrigues, professora aposentada da Escola Coronel Esmédio, e que morou com Ursulina nos últimos anos em Sorocaba. Ursulina era prima da mãe da professora Maria de Lourdes. Nessa época, anos 1940 provavelmente, moravam na rua Miranda Azevedo.
Ursulina Lopes Torres reviveu os tempos primeiros em que lecionava e ajudou a menina Maria de Lourdes nos exames de admissão da escola “Estadão”, de Sorocaba.
Em 1943 fundou-se a Sociedade Médica de Sorocaba. Dentre os mais de 30 sócios fundadores, Ursulina Lopes Torres é a única mulher: Aldemar de Castro, Atílio Bruni, Cássio Rosa, Celso César Machado de Araújo, Clóvis César Machado de Araújo, Fernando Carvalho Santos, Fernando Vieira de Mello, Francisco Ribeiro Arantes, Frederico Hoppe Júnior, Heitor Avino, Heitor Ferreira Prestes, Itagiba Martins Villaça, Jacy Magalhães, João Almeida Tavares, José Carolino Divino, José Celidonio Mello Reis Filho, José Felipe Camargo Barros, José Júlio Fernandes Barros, Júlio da Cunha, Leon Hirsh, Linneu Mattos Silveira, Luiz Baptista, Manoel Nogueira Soares, Marcelo Guimarães Leite, Mário Peres Navas, Milton Tavares, Olavo Silva Souza, Tácito Costa Filho, Thomaz Cortez, Ursulina Lopes Torres e Victor Araújo Homem de Mello.
A médica e farmacêutica Ursulina Lopes Torres é um exemplo de que não há preconceito que se sustente diante de fatos. A mulher tem a mesma capacidade que a do homem, não existindo motivos plausíveis para que continue a imperar a discriminação e o preconceito.
Por toda a biografia que construiu para si, Ursulina Lopes Torres foi homenageada com o nome de uma rua em Sorocaba, nomeação essa instituída pela lei 133 de 16 de setembro de 1949. Nessa rua foi instalada a Faculdade de Direito de Sorocaba.
Ursulina está enterrada em Porto Feliz, juntamente com seu pai Anastácio Lopes Torres (1850 – 1931). Infelizmente, não há placa indicando o dia de seu falecimento.
Carlos Carvalho Cavalheiro.
27.12.2016.
Curiosidades: Alice Hess Maeffer obteve o título de farmacêutica em 1901, pela Escola Livre de Pharmacia e de Chimica Industrial. Tornou-se médica em 1904 pela 1ª turma da Faculdade de Medicina e Farmácia de Porto Alegre. Casou-se com Dr. Carlos Emílio Hardergger, da sua turma de formandos, que a proibiu de continuar exercendo a profissão (Fonte: http://www.amrigs.org.br/centromemoria/diplomacao.pdf).
Anastácio Lopes Torres, pai de Ursulina, lecionou em Sorocaba numa escola do Clube Literário, ligado à Loja Maçônica Perseverança III, em 1882, segundo José Aleixo Irmão.
Ursulina Lopes Torres era especialista em Pediatria, mas atendia como clínica geral, uma vez que a cidade contava com apenas 3 médicos: ela, dr. Antonio Pires de Almeida (Dr. Antoninho) e dr. José Sacramento e Silva, segundo a historiadora Sonia Belon. Em Sorocaba a médica atendia às Irmãs do Convento de Santa Clara.
Jornal O Estado de São Paulo, 1º abril 1904
Jornal “A Reforma” (RS), 22 abril 1899
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.