Renata Barcellos: ‘Considerações sobre texto literário’


A última semana foi de polêmicas no cenário cultural e político. Estou acompanhando nas redes sociais as diversas posições e argumentos utilizados. Quanto ao último, sou avessa a discussões desta natureza. Já, no que se refere a primeira, enquanto professora, pesquisadora e escritora, sinto-me no dever de tecer algumas considerações. Antes disso, ao me reportar a alguns pesquisadores sobre o fato, parte deles declararam não ter conhecimento da ‘frase do momento’: “ITAMAR, ERNAUX E FERRANTE SÃO INTERESSANTES, MAS NÃO LITERATURA” (Aurora Bernardini). Como? Diversas considerações foram e estão sendo tecidas nas redes sociais.
De acordo com Claudio Daniel (poeta, romancista, crítico literário e professor), Aurora Bernardini (professora aposentada da USP e tradutora renomada de italiano, inglês e russo) é uma “das mais respeitáveis vozes da crítica literária, tradução, ensino e pesquisa da literatura em nosso país, com imensa contribuição no ensino universitário, na tradução de autores russos e italianos, como Khlébnikov e Ungaretti, além de sua importante lista de publicações – artigos, livros, ensaios. É possível concordar ou não com as suas recentes opiniões publicadas em um jornal de São Paulo (eu concordo em gênero, número e grau), mas destratá-la com ironias mesquinhas nas redes sociais é desprezível e revela apenas a ausência de argumentos de quem nāo está habilitado a participar de um debate de ideias serio.
No fundo, revela a fragilidade daqueles / daquelas que se sentiram atingidos, por saberem que os seus escritos têm pouca qualidade estética, ainda que sejam indicados em listas de semifinalistas de concursos viciados, que há muito tempo não se preocupam com a qualidade da escrita. Embora desnecessária, deixo registrada aqui a minha solidariedade a Aurora Fornoni Bernardini”. Entrevista com o crítico literário disponível em: https://www.youtube.com/live/Ie0yIErAWSA
A partir de toda minha formação acadêmica e prática pedagógica da Educação Básica à Superior, destaco algumas questões: ao privilegiar o conteúdo em detrimento da forma, a literatura contemporânea seria de ‘qualidade inferior’? Será o problema COMO se escreve ou FORMA que se lê. Esta ratificada por pesquisas quanto ao mau desempenho de competência leitora e escrita. Assim, fica o questionamento: o texto foi mal redigido ou o leitor não tem ‘maturidade’ para lê-lo? Sendo isso ou não, o fato é, segundo Teresa Silvestre: a literatura é “sempre guerra. Guerra com as palavras, que nunca se deixam domar; com as ideias, que resistem ao contorno; com as estruturas, que se fecham e se abrem ao mesmo tempo. E, mesmo quando julgamos ter terminado uma frase, um período, um texto, o combate apenas se suspende — para logo recomeçar”.
Outra questão a ser refletida: urgência da discussão teórica das fronteiras: literário e não literário, crônica jornalística e literária, artes plásticas e poesia visual, crônica jornalística x literária… Sabe diferenciá-los?
Ao longo da historiografia literária, vale ressaltar quantos autores foram cancelados, apagados… e, na contemporaneidade, como ainda o são. Conforme Ezra Pound: Literatura é “novidade que permanece novidade”. Dessa forma, cabe dizer que o ‘Mercado’ é o principal balizador. O escritor precisa ‘entrar no circuito’ para ser visto… Para isso, precisa ser editado por uma grande editora, a fim de colocá-lo em destaque na imprensa, nas vitrines das livrarias, nas festas e concursos literários. Tudo isso compõe o Sistema Literário.
Quem são e qual a formação dos ‘profissionais que selecionam quem será editado por uma grande editora? Ao eleger um grupo de autores e obras como mais conhecidos, outros serão excluídos do circuito. Dessa forma, a visibilidade de determinadas obras (e seus autores) está relacionada à invisibilidade de outras. Ao longo dos séculos e das escolas literárias, quantas obras e autores foram e ou estão ‘cobertos pelo manto’ da invisibilidade? Cada vez mais, isso me faz refletir sobre o papel da crítica literária, dos jornais literários cujo espaço era destinado a diversas questões literárias: jornalismo x ficção, prazer e reflexão, resenha…
Para concluir esta reflexão, de tudo que li e ouvi sobre as considerações da professora Aurora Bernardini, independente do posicionamento de cada um de nós, cabe reconhecermos a urgência de uma reformulação no ‘sistema literário’, nos juris dos concursos literários, nas programações das feiras literárias, na formação dos professores e críticos, na melhora das competências leitora e escrita, na abertura e no funcionamento de bibliotecas públicas, no acesso a livros, no retorno de jornais literários de qualidade, no domínio de gêneros literários diversos…
Dessa forma, se formarmos um bom leitor, emanará um ESCRITOR. Seu texto terá CONTEÚDO E FORMA. E, assim, o nascer de textos literários e o reconhecimento de autores de boa qualidade. DIGA NÃO AO CANCELAMENTO CULTURAL!!!
Renata Barcellos
- Educação fim de linha - 2 de dezembro de 2025
- Textos literários no Enem 2025 - 24 de novembro de 2025
- Projeto Com a palavra o autor - 14 de novembro de 2025
Natural do Rio de Janeiro (RJ), é pós-doutora em Língua Portuguesa e em Literatura Brasileira pela UFRJ e professora da Educação Básica à Superior. É membro de diversos sodalícios: APALA, ALAP, AJEB RJ, SCLB MA, AMT, AOL, ABRASCI, ABRAMIL, Pen Clube; membro correspondente do Instituto Geográfico de Maranhão, da Academia Maranhense de Letras e da Academia Vianense de Letras. Membro dos grupos de pesquisa GELMA e do Formas e Poética do Contemporâneo – ForPOC (CNPq/ UFMA/ CCEL). Âncora do Programa Pauta Nossa na Mundial News e fundadora do Barcellartes. Escreve matérias e entrevistas para o saite Facetubes, para o Jornal Terra da Gente e A voz do Escriba e para revistas como 7 Literário News, LiterArte SP, Revista Sarau e Voo livre.


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