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Carlos Carvalho Cavalheiro: 'Livros incendiados'

         Carlos Cavalheiro

“O desprezo social pela queima dos livros está escorado na memória sobre tais procedimentos. Nos momentos de maior obscurantismo da História, a incineração de livros se tornou uma prática comum.”

 

O período de retorno das aulas deste ano coincidiu com uma tétrica notícia: a da prisão de uma diretora e vice-diretora de uma escola pública de Salto de Pirapora, município vizinho a Sorocaba. O motivo, segundo divulgado pela imprensa, foi o fato de ambas participarem da queima de livros dentro da unidade escolar.

O ato, classificado como crime, gerou críticas de diversas pessoas, especialmente com opiniões contrárias manifestadas pelas redes sociais. O delegado de polícia que acompanhou o caso, Gilberto Montenegro, manifestou-se com indignação, dizendo: “Houve o crime de incêndio em prédio público, crime de dano qualificado e inutilização de documentos públicos. Elas disseram que estavam limpando e vendo a cena não tem nada de limpeza. Existe um procedimento de destinação para esse tipo de material, que não foi feito”.

O desprezo social pela queima dos livros está escorado na memória sobre tais procedimentos. Nos momentos de maior obscurantismo da História, a incineração de livros se tornou uma prática comum. Qualquer livro didático trará a informação de que durante a Inquisição – o Tribunal católico que levou milhares de pessoas à morte – houve fogueiras de livros cujos conteúdos eram considerados atentatórios aos dogmas da Igreja. Da mesma forma, os governos fascistas, sobretudo o nazismo de Adolf Hitler na Alemanha, produziram a incineração de pilhas e mais pilhas de livros que continham informações que questionavam a hegemonia daquele governo.

Simbolicamente, o livro carrega consigo a aura de liberdade de expressão e pensamento, portanto, com potencial extraordinário de subversão da situação posta. É pelo livro que se abre o horizonte do conhecimento, despertando a reflexão, a emoção e o intelecto. O livro é associado ao conhecimento produzido. É a concretude da elaboração do pensamento destilado após um intenso trabalho intelectual.

A escola, enquanto símbolo de lugar de produção do conhecimento, não deveria se coadunar, então, com a atitude de destruição de livros. Especialmente por fogo, tanto pelo que representa tal atitude – como um memorial aos tempos da ignorância – quanto pelo aspecto ambiental, porquanto poluidor, o que é inadmissível dentro de uma unidade de ensino que se pretende como tal.

No entanto, a pior notícia é que o ocorrido em Salto de Pirapora não é fato isolado. Há uma prática comum e aceita culturalmente de que livros didáticos, por exemplo, ou materiais antigos (que carregam, portanto, uma memória sobre a escola) devam ser descartados, muitas vezes de forma inadequada. É o culto ao instante, ao presente contínuo, no qual tudo o que se refere ao passado não importa e não possui valor. Reflexo de uma sociedade que valoriza sempre o que é novo, o que é atual, esquecendo-se de que o atual é sempre resultado de um processo que se iniciou no passado.

Não há prédio que se sustente sem alicerce, assim como árvore que se mantenha em pé sem raiz. Da mesma forma nenhum grupo humano poderá existir isento de identidade, formada pelo conhecimento acerca do passado. Faltará a esse grupo a coesão e o propósito de vida, atributos decorrentes da identidade.

Por outro lado, emissão de opiniões que condenaram a incineração de livros dentro de uma escola pode representar a esperança de uma sociedade que ainda consegue se indignar com tal atentado. Num momento em que o povo se encontra anestesiado diante da insistência de notícias de escândalos e incompetências nas administrações públicas, a indignação de parte da população pela queima de livros e documentos se assemelha ao canto do galo de madrugada, anunciando que a despeito da escuridão, a luz logo aparecerá.

 

 Carlos Carvalho Cavalheiro

30.01.2018

PS – Nas últimas edições o título “Achegas para a História de Porto Feliz” equivocadamente foi “revisado” para “Achegos para a História de Porto Feliz”. Esclareça-se que o termo achegas, embora não tão usual hoje em dia, tem o significado de colaborações, ajudas, contribuições, subsídios.

Sergio Diniz da Costa
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