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Carlos Carvalho Cavalheiro: 'Religiões afro-caipiras de São Paulo – Do século XVIII ao início do século XX'

Carlos Cavalheiro

Religiões afro-caipiras de São Paulo – Do século XVIII ao início do século XX

RESUMO

O presente artigo pretende analisar algumas informações sobre as chamadas “feitiçarias” ligadas às tradições africanas e afro-brasileiras/afro-diaspóricas, restritas ao interior do Estado de São Paulo, do século XVIII até o início do século XX, quando tais práticas religiosas vão sendo superadas por formas mais estruturadas e organizadas de religiosidade como a Umbanda e o Candomblé. Pretende-se, ainda, produzir uma memória de tais eventos de maneira a estabelecer um referencial histórico sobre as transformações das religiões (e da religiosidade) africana e afro-brasileira no Estado de São Paulo. A análise de diversos casos revelou a predominância da cultura religiosa dos grupos bantos no interior paulista.

Palavras-Chaves: Macumba paulista; Religiões Afro-caipiras; Umbanda; tradições bantos; Batuque

 Introdução

Novembro de 2012. Dentro da Igreja construída pelo negro João de Camargo, no início do século XX, em comemoração ao dia de Zumbi e da Consciência Negra, ocorreu um ato ecumênico com a presença de um padre católico, um pastor protestante e lideranças do candomblé e da umbanda. O evento, mesmo no século XXI, pareceu inusitado, mas ocorreu com mútuo respeito entre os religiosos. 

Um século antes, o construtor daquele templo era processado e julgado por curandeirismo e charlatanismo. João de Camargo constituiu um culto específico, uma mescla de tradições africanas, católicas e espíritas. O ajuntamento de pessoas ao redor de sua capela motivou a ação das forças sociais e políticas da cidade que não viam com bons olhos o que acreditavam ser um culto calcado na ignorância e no fanatismo. Temia a elite da cidade, que se reproduzissem em Sorocaba, cidade do interior paulista, o mesmo que ocorrera com Antônio Conselheiro em Canudos ou com os monges místicos da Guerra do Contestado. Pior ainda, pois a liderança desse novo culto apresentava o seu templo como a “Igreja Negra e Misteriosa” da Água Vermelha (CAVALHEIRO, 2020). 

João de Camargo, porém, não foi o primeiro e nem o último dos “sacerdotes” de cultos religiosos de matriz africana a atemorizar as elites brancas de São Paulo. Pode-se mesmo dizer que houve uma infinidade de cultos dessa natureza que permearam a história paulista, permitindo-nos dizer que, em conjunto, tratava-se de religiões afro-caipiras. 

A proposta do nome advém da formação dessas tradições que mesclam aquilo que foi gestado em algum tempo na África, mas sob uma releitura no Brasil, especialmente, no espaço geográfico em que hoje se encontra o Estado de São Paulo. Por caipira, então, entende-se a cultura que se formou a partir da experiência de contato entre indígenas e luso-brasileiros em plena decantação nas terras piratininganas. 

O sociólogo Roger Bastide preferiu chamar a esses cultos de “macumba paulista”. O nome é simpático e traduz uma totalidade que abarca as diferentes experiências religiosas realizadas pelos africanos e seus descendentes no território paulista. Ocorre que, a despeito dessa funcionalidade, o termo “macumba” parece não ter sido utilizado em São Paulo antes do século XX. 

Aparentemente, salvo engano, o termo “macumba” foi mais utilizado no Rio de Janeiro. Em São Paulo era comum dizer-se de feitiço, calundu, mandinga, caiumba, calunga, cabula, cambinda (cabinda), zangús ou zungús. Ainda assim, esses termos não são exatamente específicos e podem ter conotações diferentes, mesmo em contextos parecidos. 

Caiumba, por exemplo, pode-se referir ao feitiço realizado durante uma celebração, como pode, também, se relacionar apenas a dança do batuque. Antônio Filogênio de Paula Júnior salienta que “Batuque de Umbigada é o termo que foi utilizado pelos pesquisadores para denominar a dança-rito da Caiumba. A palavra Caiumba é o termo utilizado pelos mais antigos membros desta tradição e revela algo mais significativo para os seus praticantes, pois indica a celebração de um encontro ancestral” (PAULA JÚNIOR, 2022, p. 69). 

O termo Calunga corresponde ao mesmo tempo às sepulturas e túmulos, como também a cruzes que indicam os locais derradeiros de pessoas, e, ainda, um culto realizado às escondidas no cemitério (CAMPOS, FRIOLI, 1999). 

Roger Bastide, apesar de cunhar o nome de “macumba paulista”, chega a problematizar o seu uso: 

As casas em que se reuniam os negros para celebrar os cultos denominavam-se aqui, nessa época, batuques. É um nome que permaneceu em todo o Sul para designar as cerimônias fetichistas, em particular, em Porto Alegre. Se o termo macumba substituiu em São Paulo o de batuque, o único empregado antigamente foi sob a influência do Rio e também em consequência da deturpação, que teremos de analisar, da verdadeira religião (batuque) em magia negra (macumba). Ora, temos várias posturas de Câmaras Municipais proibindo essas reuniões rituais, como por exemplo uma de Campinas, datada de 1876 (BASTIDE, 1983, p. 195 – 196). 

O vulgo entende, até os dias atuais, que macumba seja a prática de magias para o mal. Esse conceito é totalmente permeado de uma cosmovisão cristã que diferencia o que é bom daquilo que é mau. Porém, nas culturas africanas, sobretudo as de origem bantu, esse conceito não se ajusta. 

A princípio, o termo macumba designava o instrumento musical usado nos antigos terreiros afro-brasileiros, feito de um tubo de taquara ou ipê com cortes transversais, e tocado por duas varetas. Depois passou a identificar os cultos africanos praticados pelos escravos no Rio de Janeiro e, finalmente, foi associado à umbanda. Para os leigos, macumba é toda prática de feitiçaria dedicada ao mal, o que, aos olhos da umbanda, está a cargo da quimbanda e de outras modalidades de culto (CORTEZ, [1986], p. 4). 

No entanto, o vulgo não somente que associa a macumba às práticas de feitiçaria para o mal, como, também, utiliza-se do termo para “designar a totalidade dos cultos afro-brasileiros (candomblé tradicional, candomblé abrasileirado, umbanda popular, umbanda esotérica, quimbanda e demais variações), num sentido pejorativo, como sinônimo de ‘feitiçaria primitiva’” (DUBUGRAS et al, s/d, p. 34). 

Sobre esse artigo do Código de Posturas de Campinas, citado por Bastide (1983), o texto legal diz o seguinte: “Art. 93. – São prohibidas as casas conhecidas vulgarmente pelos nomes de – zangús e batuques. Os donos ou chefes de taes casas serão punidos com a pena de oito dias de prisão e 30$000 de multa, e o dobro nas reincidências”.[1] A Câmara Municipal de Santos publicou semelhante legislação em 1870: “Art. 44. – São prohibidas as casas de batuque, vulgarmente chamadas zungús, e bem assim os ajuntamentos dos escravos nas ruas e praças da Cidade: os donos das casas e os escravos serão punidos com dois dias de prisão”.[2]

É difícil captar os pormenores desses cultos. Primeiramente porque seus cultores não deixaram registrado por escrito os mistérios e segredos de sua religião. O que sabemos são, na mais das vezes, informações filtradas por olhares que, em geral, olhavam para tais manifestações com desprezo, desconfiança e presunção. Os que participavam do culto não tinham interesse em registrar por escrito as liturgias e crenças de sua religião, quer por ser originária de uma cultura ágrafa, quer para evitar a produção de provas contra si mesmo, uma vez que tais manifestações religiosas eram reprimidas como visto acima. 

Por conseguinte, a posse de tais conhecimentos trazia para as lideranças desses cultos – ou para quem tivesse acesso às informações “secretas” – o status de poder sobre as demais pessoas. 

Há outro fator a ser considerado também para a dificuldade em se identificar precisamente esses cultos que Bastide chamou de Macumba Paulista. Devido a uma imposição da própria estrutura criada pela escravização, diversas etnias – e com elas as mais variadas crenças – tenderam a se amalgamar dando forma a rituais diversos. Abguar Bastos (1991, p. 7) alega sobre a Macumba que: “adota orixás de várias origens” e que “Difícil se torna evitar a miscelânea de deidades que se apresentam ou são louvadas nos cultos, porquanto os povos aqui se misturavam como os mina, os haussá, os jejê, os nagô, os cambinda e os fulá”. 

Porém, sabendo-se de tudo isso, é, ainda, possível recuperar algumas informações sobre essas religiões afro-caipiras de São Paulo, de modo a compará-las entre si e com o paradigma que hoje temos dos rituais afro-brasileiros, e produzir assim uma memória sobre esses diversos cultos que proliferaram em terras paulistas. 


O medo da feitiçaria 

O imaginário do luso-brasileiro, desde a época da colonização, estava permeado pela crença supersticiosa no sobrenatural e na intervenção mágica no mundo. Subsidiário das perseguições da Inquisição Católica, esse imaginário se constituiu no português antes mesmo de aportar nesta terra de Pindorama. 

Aliás, as Visitações do Tribunal do Santo Ofício farejavam nos trópicos a degeneração dos princípios cristãos que, acreditavam as autoridades católicas, se afrouxavam tanto pelo intenso calor do sol como pelo contato com culturas fetichistas dos indígenas e dos africanos. 

Na segunda metade do século XVIII, a Visitação prendeu em Sorocaba um escravizado que portava um patuá. A documentação sobre essa prisão foi pesquisada por Luiz Mott que informou: 

O acusado era conhecido tão-somente pelo nome de João, Mulato Escravo. Ao ser agarrado pela autoridade eclesiástica, aberto o patuá que trazia no pescoço, dentro se encontrou um pedaço de sanguíneo (espécie de guardanapo utilizado na missa para limpar as derradeiras gotas do sangue de Cristo conservadas no cálice), um pedacinho de corporal (toalhinha destinada a abrigar partículas do corpo de Cristo caídas no altar), além da folha de um missal com oração e gravura de Jesus, uma hóstia consagrada – que, segundo declarou o réu, foralhe ofertada por um sacristão – “e muitas outras coisas, como raízes, dentes de cobra, etc. que por não serem da Igreja, foram queimadas” (MOTT, 2000, p. 120). 

A crença na intervenção mágica, portanto, estava presente em São Paulo, pelo menos, desde o século XVIII. Considere-se que esse escravizado era pertencente a um senhor da cidade de Itu, vizinha de Sorocaba. O trânsito de escravizados – e mesmo libertos – entre cidades é um fato curioso. Mais à frente discorrer-se-á sobre alguns casos em que os chefes de cultos transitavam por cidades diversas. 

O feitiço era temido e combatido em São Paulo por todo o século XIX, praticamente. Quando se diz aqui em combate, especificamente está se falando em ações direcionadas e organizadas para tais fins e com o uso dos poderes institucionais. Assim, praticamente todas as cidades paulistas emitiram posturas reprimindo as feitiçarias. 

Na maior parte das posturas pesquisadas para este trabalho, o negro – escravizado ou liberto – não aparece explicitamente, dando a impressão de que a feitiçaria não era uma prática associada imediatamente aos africanos e seus descendentes, mas sim a qualquer pessoa. É de bom alvitre retomar o que foi dito acima sobre o imaginário português acerca da feitiçaria. Livros como o de São Cipriano, por exemplo, eram consultados e guardados por muitos colonos. João do Rio, no início do século XX, afirmou que “a base, o fundo de toda a sua ciência [dos feiticeiros] é o Livro de São Cipriano” (RIO, 2015, p. 54). 

Assim, as posturas municipais (códigos de leis das Câmaras Municipais) tentavam coibir a prática da feitiçaria, impondo punições como prisões, multas entre outras. 

Em 1865, o Código de Posturas de Sorocaba trazia o seguinte artigo: “Art. 119. – Todo aquelle que se intitular advinhador ou curador de feitiços illudindo o povo incauto, quer para isso receba estipendio, quer não, será multado em oito mil réis, e oito dias de prisão”. Já a Câmara de Guaratinguetá promulgou a seguinte postura no mesmo ano: “Art. 113. – Os indivíduos que se fingirem inspirados por algum ente sobrenatural, e prognosticarem acontecimentos que possam causar sérias aprehensões no animo dos credulos, incorrerão na multa de 20 a 30$000 com prisão de 6 a 8 dias”. Por sua vez, Jundiaí, na mesma época, emitiu esta: “Art. 54. – Todo aquelle que se intitular advinhador ou curador de feitiços illudindo o povo incauto, quer para isso receba estipendio, quer não será multado em vinte mil réis”. 

Os textos variam pouco, mas, ao mesmo tempo, não são idênticos a ponto se se pensar que tenham sido produzidos como cópias. Há uma variação da penalização, bem como da descrição do que se entendia por “feitiçaria”. Em Sorocaba o adivinhador e curador de feitiços era o alvo principal dos vereadores, enquanto em Guaratinguetá, possivelmente por experiência de ocorridos naquela localidade, ampliava-se o conceito para abarcar aqueles que se fingiam inspirados por algum ente sobrenatural. Por outro lado, amenizava a situação ao informar que a repressão se daria sobre quem prognosticasse acontecimentos que pudessem causar “sérias” apreensões nos crédulos. 

A postura de Jundiaí é bem parecida, em seu texto, com a de Sorocaba. No entanto, não estipulava prisão ao feiticeiro, como ocorria na outra cidade. 

Essas posturas foram reeditadas em outras décadas e em outras localidades. Pindamonhangaba traz uma descrição interessante sobre como os vereadores viam o que consideravam como exercício de feitiçaria: Art. 180. – Todo aquelle que se intitular adivinhador ou curandeiro de feitiçarias, e effectivamente empregar orações, gestos ou qualquer embuste para curar, ou que se fingir inspirado ou prognosticador de cousas sobrenaturaes. Pena de 20$000 a 30$000 de multa. 

Neste caso, verifica-se que o emprego de orações e gestos compõe o quadro que determina quem possa ser considerado como feiticeiro. O emprego de orações, gestos, promessas de curas, inspiração sobrenatural, adivinhações, consultas a entidades, tudo isso acaba resvalando sobre as práticas ritualísticas afro-brasileiras. 

Nesse sentido, a cidade de Itu emitiu, décadas antes das posturas acima, uma em que associava a prática da feitiçaria aos escravizados. Diz Francisco Nardy Filho que em 11 de abril de 1855 a Câmara Municipal promulgou uma postura contra os feiticeiros, a qual dizia: “o escravo que for encontrado comerciando ou tendo em seu poder qualquer objeto vulgarmente chamado – Feitiçaria – quer mineral, quer vegetal, quer animal, será punido com 8 dias de prisão e pela reincidência 30” (NARDY FILHO, 2000, p. 185). 

Os edis de Itu não se esqueceram de prever o uso da feitiçaria pelas pessoas livres. Na sequência do texto legal, “as pessoas livres compreendidas no art. acima pela 1ª vez será [sic] punido com 15 dias de prisão e 30$000 de multa e pela reincidência em 30 dias de prisão e 60$000 de multa” (IDEM). 

Apesar de citar as pessoas livres, é bastante curioso que os escravizados apareçam por primeiro nessa postura. Aparentemente, havia em Itu uma associação direta da prática de feitiçaria aos africanos e seus descendentes.

Essa mentalidade explicaria a prisão, décadas depois, de um negro naquela cidade, sob a acusação de feitiçaria. O jornal O Estado de São Paulo, replicando uma nota publicada no jornal A Imprensa, conta que “foi preso alli [em Itu] um preto africano, mezinheiro e feiticeiro, tendo sido descoberto por haver medicado uma senhora estrangeira, que o procurara por instâncias de sua criada” (A PROVÍNCIA DE S. PAULO, 10 set 1878, p. 2). 

Este era outro problema enfrentado pelos curandeiros e “feiticeiros”: a concorrência com a medicina. Desde 1808 havia faculdades de Medicina no Brasil, na Bahia e no Rio de Janeiro, criadas pelo Príncipe Regente Dom João logo após a sua chegada ao país, fugindo de Portugal ameaçado pela invasão de Napoleão Bonaparte. Em 1839 foi criada a Faculdade de Medicina de Ouro Preto. Assim, na década de 1850, havia médicos formados no Brasil. Esses médicos disputavam com os curandeiros e feiticeiros a atenção dos precisavam de alguma cura. 

Seja por qual motivo for, o importante é atentar-se para o fato de que a feitiçaria era amplamente reprimida, especialmente no século XIX, sendo perseguida pelas autoridades. Apesar de não se restringir aos africanos e seus descendentes, a prática da feitiçaria tangenciava os rituais e práticas religiosas africanas e afro-brasileiras. 

Dessa maneira, os praticantes das artes mágicas e dos rituais de origem africana eram alvos da vigilância e da repressão institucional. Essa repressão tenderá a se fortalecer a partir da vigência da República, que trará consigo a visão de modernidade europeizante, incapaz de tolerar as práticas de religiosidades que ferissem a hegemonia e o monopólio do cristianismo católico. 

Não se pode, também, perder de vista o poder amalgamador desses cultos, emprestando um caráter de identidade a pessoas que haviam perdido seus referenciais de grupo por imposição das condições da escravização. E esse ponto é crucial para entender o temor de uma revolta de escravizados, o haitianismo em solo brasileiro. Como ocorreu com o caso dos malês na Bahia, a religião poderia ser usada como elemento organizador do grupo. 

Essa percepção pode ser vista na correspondência do Ministro do Império ao Governador da Província de São Paulo em 1832, três anos antes da Revolta dos Malês na Bahia, solicitando providências para que os escravizados mouros fossem removidos das terras paulistas: 

A S. Magd.e Se fez prez.te que nessa Cappitania andavão alguns Mouros, q’ forão Levados a ella Como Negros e Mullatos, e por que não convém, que semelhante Gente pellos Seus maos Costumes Se conservem na dita Cappitania; he o mesmo Sr. Servido, q’ todos Sejão remetidos a este Reino declarandoçe os nomes dos Senhores delles p.a se lhes restituir aos seus correspondentes o preço por que forem vendidos. Deos gd.e a V. S.a Lx. a Occ.al vinte e nove de Março de mil Sete centos e trinta e dous.—Sr. Governador, e Cap.m Gn.al da Capitania de São Paulo. Diogo de Mendonça Corte Real. 

Mesmo depois da eclosão da Revolta dos Malês, as autoridades de São Paulo estavam preocupadas com a possibilidade de ocorrência similar na Capitania. Diz o historiador Aluísio de Almeida que o presidente da Província de São Paulo, o sorocabano Rafael Tobias de Aguiar, oficiou ao Juiz de Paz de Sorocaba, em assunto reservado, no dia 11 de abril de 1835, dando conta de que “havendo notícia que da Bahia se enviaram emissários para a Corte do Rio de Janeiro, e dela para algumas Províncias com o fim de promoverem a insurreição geral da escravatura”, pelo que solicitava das autoridades que se conservassem “na maior vigilância possível para obstarem a qualquer diligência…” que pudesse ocorrer naquele sentido (ALMEIDA, 1950, p. 12). 


Alguns casos de rituais afro-caipiras em São Paulo 

Talvez um dos casos de maior repercussão sobre a ocorrência de um ritual de culto afro-caipira seja o ocorrido em 1841 com escravizados da Fazenda Passa-Três, de propriedade de Gertrudes Eufrosina Aires de Aguiar, mãe de Rafael Tobias de Aguiar. Segundo Campos e Frioli (1999, p. 41) “achando-se o referido administrador desta Vila pelos dias Santos do Natal, fora avisado por um escravo da casa que alguns outros escravos estavam reunidos para observarem certas raízes com aguardente em presença de uma imagem do Senhor Crucificado, a fim de conhecerem e descobrirem qualidades de venenos”. 

Essa ocorrência foi também citada por Roger Bastide (1983) ao lado de outras, como a de Manoel João, curandeiro vindo de São Paulo para residir na Vila de Santo Amaro, em 1839, e a de Policarpo, na mesma localidade, sendo este expulso em 1841 pela prática de curandeirismo e feitiçaria (BASTIDE, 1983, p. 195). Bastide acrescenta alguns detalhes ao caso de Sorocaba: uso de raiz de mandioca misturada a aguardente; e a origem dos escravizados que eram moçambicanos. 

Alguns detalhes apresentados ajudam a compor uma ideia sobre como eram esses cultos. O uso de aguardente misturada com raiz de mandioca induz ao uso ritualístico do álcool, possivelmente para atingir um estado alterado da consciência. A presença de uma imagem de Cristo pode ser entendida como parte de um processo de enculturação e de escamoteação da devoção às entidades ancestrais ou a seres divinizados como inquices e orixás. 


O Dr. Bulcão 

Alguns anos mais tarde, em 1854, ganhou fama um escravizado de Porto Feliz, interior de São Paulo, conhecido como Dr. Bulcão. Conhecedor de ervas e de outras mezinhas, Dr. Bulcão deve ter realizado diversas curas extraordinárias, pois houve proposta do governo da Província em remunerá-lo em troca das informações que possuía. 

Os jornais paulistanos protestaram contra esse projeto. Escravo de Cândido José da Motta, Bulcão era o que os historiadores chamam de “escravo de ganho”, ou seja, aquele que em acordo com o seu senhor trabalhava em semi-liberdade, sendo obrigado a entregar ao final de algum tempo um valor previamente combinado. Assim, por exemplo, havia quituteiras que moravam de aluguel em alguma casa e vendiam seus quitutes, entregando aos seus senhores parte do que arrecadavam com esse comércio. Também, escravizados que realizavam serviços de limpeza, de consertos de ruas (para as Câmaras Municipais), vendedores ambulantes, prestadores de serviços… 

No caso de Bulcão, esse escravo realizava curas diversas: desde envenenamento – incluindo por picadas de aracnídeos ou mordida de cobras – até feitiços e possessões demoníacas. Por seu sucesso, propôs-se que ensinasse a uma junta de médicos os seus segredos, ficando, para isso, a Câmara Municipal obrigada a pagar-lhe a quantia de dois contos de réis, um dinheiro considerável à época. Com esse dinheiro era possível, em 1854, comprar até dois escravos. Uma página da internet oferece uma conversão hipotética de conto de réis para a atual moeda brasileira do real: cerca de R$ 246.000,00 (duzentos e quarenta e seis mil réis). 

Em contrapartida a essa proposta, um missivista enviou uma carta a imprensa, reclamando da atitude “complacente” do governo provincial: 

Acha-se o cofre provincial próximo á levar uma sangria de 2:000$000, para a compra do segredo de um feiticeiro que por estes lugares é conhecido pelo nome de Dr. Bulcão!! Com licença de seu Sr., este Dr. negro (dizem) faz applicações. Sendo só obrigado em cada final de semana á apresentar-se em casa com o jornal, á razão de dois mil reis diários; com escândalo das leis, e negligência das autoridades. Consentiu-se que um miserável escravo, sem o menor conhecimento scientífico, vá curando, com esses ridículos ingredientes, e por meio de palavras misteriosas a gente enfeitiçada, e indemoninhada, e dizem que envenenada. Dizem que este escravo vai ser examinado pelos médicos habilitados!! Um homem que possue um pergaminho, que se honre de possuí-lo, rebaixar-se a ponto de ir aprender de um escravo, sem princípios scientíficos, o modo porque se cura feitiço! Que farça ridícula, e que importância não tem o tal Bulcão!… (CORREIO PAULISTANO, 17 ago 1854, p. 4). 

O missivista alegou ainda que o delegado de polícia daquela vila era conivente com as práticas do Dr. Bulcão porque ele mesmo, o delegado, “crê em feitiços, em malefícios etc” (IDEM). Em defesa do escravizado Dr. Bulcão, apresentou-se o médico inglês Ricardo Gumbleton Daunt, que residiu em Itu e, posteriormente, em Campinas, onde faleceu em 1893. Gumbleton Daunt alegou que não poderia “imaginar um maior benefício á província, do que a vulgarisação dos meios para combater os aliás infalliveis effeitos dos lethiferos venenos do sapo, da cobra e de tantas substancias vegetaes que os envenenadores tem á sua disposição. O espírito em que o correspondente argumenta trahe uma ignorância da maneira em que os mais importantes conhecimentos therapeuticos forão adquiridos á sciencia política. Mui poucos dos nossos agentes medicinaes são devidos á um raciocínio á priori por homens da arte; em geral os agentes therapeuticos forão empiricamente conhecidos do povo e esse os transferio aos médicos” (CORREIO PAULISTANO, 5 set 1854, p. 3 – 4). 

Apesar da defesa do Dr. Ricardo Gumbleton, o fato é que Dr. Bulcão continuou sendo acusado de feitiçaria, de curandeirismo, de ignorância e até de sedição de escravizados: 

Consta que o tal intitulado Dr. Bulcão tem incutido nos escravos ideais de liberdade em algumas reuniões que tem promovido nos subúrbios da Villa, dizendo-lhes que quando voltar do Rio, para onde tam de ir chamado por S. M. para ensinar os médicos, há de trazer ordem de liberdade para todos (CORREIO PAULISTANO, 26 set 1854, p. 3). 

Pelo que se depreende do que se conseguiu levantar sobre essa história, o Dr. Bulcão possuía conhecimento de ervas e de antídotos para venenos – o que, na época, era um enorme trunfo, de acordo com o Dr. Gumbleton Daunt – e que era tido como praticante de feitiços e contrafeitiços. Por infelicidade, pouco se sabe sobre como se davam tais curas realizadas pelo Dr. Bulcão. Há uma breve menção, feita pelo Dr. Ricardo, na qual dizia o seguinte: “Não duvido que esse negro possa alguma vez empregar uma boa dose de aparato fantástico na applicação de seus remédios…” (CORREIO PAULISTANO, 5 set 1854, p. 3). Porém, logo em seguida, o médico ressalva: “o dito negro é bem comportado, leal, e parece muito mais livre de práticas supersticiosas do que os mais de seus collegas, de quem tenho notícia” (IDEM). 


Pai Gavião e a Maçonaria Negra 

O caso do Pai Gavião, da cidade de São Roque, foi minuciosamente relatado pela reportagem do jornal Correio Paulistano. Contemporâneo do Dr. Bulcão, o caso do Pai Gavião contém elementos interessantes que vão desde a formação de sociedades secretas de negros a organização de uma sedição. Se bem que não se possa comprar plenamente o que diz o jornal – um discurso indireto e permeado de preconceitos e ignorâncias acerca da religiosidade ali contida – pode-se, ao menos, pinçar alguma informação que ajude a compor uma ideia sobre o que foi o culto praticado por Pai Gavião. 

Diz o jornal Correio Paulistano que o nome de Pai Gavião é na realidade José Cabinda e que ele era grão-mestre de uma ordem dividida em três lojas: Filhas das Hervas, Maçonaria Negra e Campo Encantado. Numa dessas lojas havia uma rainha chamada Mambeque. Como na Maçonaria convencional, essa ordem possuía diversos graus e, de acordo com a reportagem, os irmãos que chegavam ao grau de encantado recebiam um nome dado pelo Mestre (CORREIO PAULISTANO, 27 jul 1854, p. 2). 

Esses “encantados”, aparentemente, representavam entidades ou espíritos de ancestrais. A reportagem informa que “os nomes dos encantados são entre outros os seguintes: – Grande Apaga-fogo, Rompe-ferro, Gaviãosinho, Chupa-flor, Quinuano, Sette pombas, Quatro cantos, etc.” (IDEM). 

Interessante é o fato de que alguns nomes, como Rompe-ferro, serem “reaproveitados” (ou terem reaparecido) na Umbanda atual. Há uma entidade de Umbanda que se denomina Caboclo Rompe-ferro, da linha de Ogum. Sete Pombas poderia ser uma referência a Pombagira Sete saias? 

Esses nomes estão registrados num jornal que circulou em 1854, mais de cinquenta anos antes da organização da Umbanda pelo médium Zélio Fernandino de Moraes, em 15 de novembro de 1908.

Sobre uma das cerimônias ritualísticas dessa ordem, o repórter do jornal assim a descreve, com alguns detalhes bastante curiosos: 

Para celebrar-se as sessões, ou para a admissão de novos adeptos, os irmãos formam um grande círculo.

Alguns dos assistentes tocam um tosco instrumento feito de cabaças com cabo de páo (chocalhos) que na gíria da ordem se – chama – Guayá-Cayumba.

Ao som do – Guayá-Cayumba, o grão-mestre dançando e cantando uma linguagem inintelligivel se dirige para o centro e ali colloca com todo o respeito uma luz, uma garrafa de aguardente, uma tigella diversas raízes, uma figura de páo, a meio corpo, sem braços e informe, que tem o nome de – Careta – e outra de cera com ventre tão obeso como o do cavalo de Troya, pois lhe sahe do pescoço e vai até os pés. O umbigo é formado por um pedaço de vidro. Collocam também ali uma raiz grande, a que dão o nome de – Guiné encantado – um corno de boi (de que já falamos) que tem o nome de – Vungo – um patuá envolto em casca de lagarto, dois Santo Antonio de nó de pinho, sendo um sem cabeça, e finalmente uma penellinha vidrada, betumada de cera, coberta por um vidro, que é conhecida pelo nome de Gallo (IDEM).

Quem conhece o instrumento chamado de guaiá, utilizado até hoje nos batuques de umbigada da região do Médio Tietê, sabe da semelhança desse instrumento com o xerê de Xangô (CAVALHEIRO, 2015). Também já foi dito aqui que caiumba é o nome originário do batuque. Não deve ser coincidência, apenas, que o guaiá-caiumba estivesse presente nesse ritual da ordem criada por José Cabinda, também chamado de Coroado e conhecido pelo nome religioso de Pai Gavião.

A matéria publicada no jornal dá sequência à descrição da cerimônia de iniciação de um neófito da ordem. Como em outras sociedades secretas, essa iniciação é repleta de ritos e de simbolismos.

O Pai Gavião entorna a garrafa sobre a tigela, e ordena que o novo irmão se aproxime.

Interrompe-se o chocoalho do Guayá-Cayumba para a augusta cerimônia.

O novo irmão se ajoelha ante o grão-mestre, e despe a camisa.

O grande chefe aponta a faca sobre o peito do noviço, e o faz prestar um juramento solemne de fidelidade, e segredo inviolável, sob pena de morte, e ainda mesmo que seja estrangulado ou queimado.

Depois abre-lhe uma cruz sobre o peito direito com a ponta da facca. Corre algumas gotas de sangue da epiderme rasgada. Passa-se alternadamente um patuá e uma raiz de Guiné encantada sobre a cissura da cruz, e depois esfrega-se uns pós brancos (IDEM).

Essa cena, descrita acima, lembra muitas outras semelhantes, descritas em documentos diversos como relatos jornalísticos e romances da literatura. O escritor Júlio Ribeiro, em seu famoso livro “A Carne”, descreveu uma cena de iniciação em culto de origem africana que guarda muitas semelhanças com o que se apresenta em relação a ordem do Pai Gavião. Eis o texto de Júlio Ribeiro:

Que era muito bom, explicou Joaquim Cambinda na sua meia língua, pertencer um preto à irmandade de São Miguel das Almas, mas que também era perigoso; que quem não tinha peito não tomava mandinga; que o branco queria, por força, saber o segredo dos irmãos de São Miguel, e que para isso surrava o preto, mas que o preto que revelava o segredo de São Miguel morria sem saber de quê. Fez o neófito beijar os pés de São Miguel, fê-lo beijar os cornos de Satanás a ele sotoposto, fê-lo beijar as partes genitais do manipanço; ditou-lhe os juramentos solenes, cominou-lhe penas terríveis no caso de infração. Recebeu dele dinheiro, trinta mil-réis, seis notas de cinco mil-réis, que estavam no bolso da calça, muito enleadas em um lenço de chita muito sujo. Passou à parte doutrinária, entrou a iniciá-lo na arte terrível dos feitiços e dos contras, a dar-lhe meios de matar, de curar. Ensinou-lhe que a semente do mamoninho bravo (datura stramonium), socada, macerada em aguardente, cega, enlouquece, mata dentro de poucas horas; que osso de defunto, cuja carne caiu podre, raspado e posto em uma comida qualquer, produz amarelão incurável […] (RIBEIRO, 1999, p. 64).

A cerimônia observada na ordem de Pai Gavião abarcava ainda o uso de incenso, de bebidas e de transe extático no qual o mestre consultava (e recebia respostas) de imagens e figuras. O famoso curandeiro João de Camargo, de Sorocaba, de quem se falará logo mais, também, diziam, conversava com as imagens dispostas dentro de sua igreja. Em edição posterior, o jornal publicou uma retificação sobre o processo de iniciação. De acordo com essa ressalva, a cruz feita no peito do iniciado não era riscada com a ponta, mas sim com o fio da lâmina da faca “batendo-se com um pedaço de páu 3 pancadas na costas da lâmina. Do mesmo modo se faz mais duas cruzes, uma no braço e outra no pé direito” (CORREIO PAULISTANO, 1 ago 1854, p. 1).

Outra descrição dada sobre esse culto é o de que Pai Gavião conversava com entidades por meio do vungo (corno) composto “de vidro, raízes e outras substâncias…” (CORREIO PAULISTANO, 1 ago 1854, p. 2). Era utilizado como oráculo e, segundo relatado, não poderia ser profanado por mãos “contaminadas” de infiéis e de “alguém que tivesse tido relações com mulheres” (IDEM). O intercurso sexual é entendido pelo vulgo – e, também, por praticantes de magia – como imunizante das defesas “espirituais”. A palavra vungo, aparentemente, é de origem banto.

Os seguidores de Pai Gavião acreditam que ele poderia transformar-se em pau, pedra, ave ou no que quisesse. Essa crença é bastante popular no Brasil e, em diversas localidades, sobretudo no Nordeste, é chamada de envultamento. Esse termo possui diversas acepções. Cândido de Oliveira, em seu Dicionário Mor da Língua Portuguesa, diz que o envultamento refere-se ao “feitiço pelo qual se representa uma pessoa num boneco a fim de que todo sofrimento causado nele seja transferido, magicamente, à própria pessoa” (OLIVEIRA, 1967, p. 895). Seria uma prática semelhante ao dos bonecos de vodu. Mas o mesmo lexicógrafo apresenta outra definição: “Técnica de magia pela qual as pessoas se transformam em bruxas ou lobisomem” (IDEM).

Porém, o envultamento refere-se também à crença de que algumas pessoas, a partir do uso de orações ou outros encantamentos, têm o poder de se “envultar”, ou seja, de se tornar invisível aos olhos dos demais, parecendo as esses como um toco de árvore, um pé de bananeira, uma pedra ou qualquer outra coisa assim. No livro de São Cipriano há menção aos feitiços para se tornar invisível aos demais.

Pai Gavião foi preso, juntamente com seus asseclas, acusado de feitiçaria, mas, também de tentativa de insurreição. O temor de uma revolta de escravizados repercutiu em outras cidades, como Porto Feliz, na qual o tenente Pimenta, responsável pela ordem pública, com “suas patrulhas, de dia e com especialidade nos sanctificados cruzão as ruas, e basta verem em qualquer casa de negócio reunidos três ou quatro pretos, cercão as portas, prendem-os e os levão para a cadêa” (CORREIO PAULISTANO, 6 out 1854, p. 3).


O Mestre Felisberto Cambinda

Em Sorocaba, na década de 1870, descobriu-se a existência de um culto secreto cujo mestre era um liberto chamado Felisberto Cambinda. Não parece ser apenas coincidência que o nome Cambinda ou Cabinda, designativo de origem, esteja presente em tantos casos associados à feitiçaria.

João do Rio relata que os cabindas tinham culto próprio disseminado pelo Rio de Janeiro. A despeito da descrição preconceituosa – os cabindas são tratados como “ordinários”, “burros”, “ignorantes” – o relato de João do Rio traz como informações curiosas o fato de que nesses cultos o nome dos orixás e dos santos era mudado: “Orixalá é Ganga-zumba; Obaluaci, Cangira-mungongo; Exu, Cubango; Orixá-oco, Pombagira; Oxum, a Mãe-d’água, Sinhá Renga; Xapanã; Cargamella. E não é só aos santos dos orixás que os cabindas mudam o nome, é também aos santos das igrejas. Assim S. Benedito é Lingongo; S. Antônio, Verequete; N. Sª das Dores, Sinhá Samba” (RIO, 2015, p. 35).

Esses nomes são referências que podem ajudar no rastreamento de cultos antigos e que foram suplantados pelas formas mais organizadas de religião como a Umbanda. “A primitiva macumba”, diz José Henrique Motta de Oliveira, “longe de sérum culto organizado, era um agregado de elementos da cabula, do candomblé, das tradições indígenas e do catolicismo popular, sem o suporte de uma doutrina capaz de integrar os diversos pedaços que lhe davam forma” (OLIVEIRA, 2008, p. 77).

Reencontrar esses “pedaços” é, talvez, uma das formas de tentar recompor a trajetória histórica percorrida por esses cultos e rituais. É, de outra feita, a maneira como podemos identificar a influência das diferentes tradições que ajudaram a amalgamar essas partes que compunham os rituais afro-brasileiros de antanho.

O caso de Felisberto Cambinda é bastante curioso, até mesmo pelo contexto em que ocorreu. Naquela época, havia sido preso na Corte (Rio de Janeiro) o afamado Juca Rosa, acusado de prática de feitiçaria, bem como de estelionato, defloramento, reuniões secretas, sortilégios entre tantos outros. Deve-se levar em consideração que a escravidão ainda vigorava e os aparelhos de repressão às manifestações e expressões dos negros eram constantes e institucionalizadas. Quase sem exceção, todos os Códigos de Posturas das cidades brasileiras contavam com artigos reprimindo os batuques, os ajuntamentos de negros, as diversas danças e expressões religiosas, a capoeira, os maracatus e congados (CAVALHEIRO, 2006).

Copiando a imprensa das grandes metrópoles na construção textual dos títulos das matérias jornalísticas, o jornal “O Colombo”, de Sorocaba, referiu-se à prisão de Felisberto Cambinda como “diligência importante”, da mesma forma como fora descrito o caso de Juca Rosa. A descrição do fato, embora longa, é importante por conta dos diversos elementos nela contidos.

Deligencia importante – Constando ao activo e intelligente delegado de polícia sr. tenente Joaquim Marques da Silva, que em casa sita á rua do Supiriry, abaixo do becco da Estação, teria lugar, na noute de domingo 22, uma reunião de pretos, sob a direcção do preto Felisberto Cambinda, morador em S. Paulo e que para essa reunião chegára a esta cidade no dia 9 do corrente, cujo fim era um arremêdo do que fez na côrte o celebre preto Juca Rosa, zeloso como é no cumprimento dos deveres do cargo oneroso que occupa dirigiu-se nessa noute a referida casa acompanhado de algumas praças, e do official de justiça, e penetrando nella com as formalidades legaes, encontrou na varanda, sobre um caixão que servia de meza, coberto em parte com um panno branco, ou toalha, o seguinte:

5 imagens, de diversos tamanhos que parecem ser de Santo Antônio, debaixo da maior estavam 13$000, em notas de 10$000, 2$000 e 1$000, aos lados estavam 2 notas de 500 réis, e em cobre 520 réis; em frente a imagem maior duas facas fincadas no caixão, crusadas em fórma de thesoura, entre as facas e as imagens, um pequeno papel contendo nomes de 3 pessoas. Aos lados 1 caramujo, uma raiz, uma lata com pólvora, duas laranjas, com galhos de arruda fincados nellas, 1 embrulho com salamargo, 1 outro com raízes e folhas socados, 1 masso de hervas diversas, uma tijella branca grande, com raízes e folhas esmagadas misturadas em aguardente, uma garrafa contendo aguardente com raízes e folhas diversas, uma dita com aguardente pura, uma dita com leite, uma caneca de louça branca, contendo flores, folhas, tomates, etc., 3 patuás grandes, sendo o maior capeado com couro de lagarto, aberto elles continham, folhas e raízes de cheiro muito activo, e duas continhas além das folhas e de cabellos negros, 2 castiçaes com vellas de cebo illuminavam, as imagens e os objectos descriptos.

Foram presos o dito Felisberto Cambinda, Antônio Cyrino de Oliveira Lopes, e sua mulher Anna Maria do Espírito-Santo, tendo-se escapado algumas pessoas pelo quintal, quando pela porta da rua entrava o delegado.

O delegado deixou-se ficar na casa acompanhado de algumas praças e do official de justiça. Ás 11 e meia horas da noute bateram a porta e voz feminina pergunta pelo Mestre, aberta ella, entram, Florinda, Izabel e Luiza, escravas do sr. João Aguiar de Barros as quaes foram conduzidas à cadêa. Continuando o delegado a permanecer na casa, ás 4 e meia da manhã batendo de novo a porta perguntaram pelo Mestre e entra Marcelina, escrava da exma. sra. d. Guilhermina Grotildes da Cunha Soares, que teve o mesmo destino das outras. Ás 7 horas da manhã, foi que retirou-se o sr. delegado, com o resto das praças.

Foram soltos no dia 23 todos a excepção de Felisberto, e Marcelina, aquelle porque está sendo processado, e esta por não ter sua senhora reclamado a soltura.

É digno de louvor o acto do sr. tenente Marques que mais uma vez deu provas de sua perspicácia em negócios desta ordem.( COLOMBO, 28 out 1876, p. 2).

Do material apreendido pela polícia, alguns são recorrentes nas outras descrições aqui feitas: pólvora, facas, patuás com pele de lagarto, imagens de santos (como Santo Antônio), ervas e raízes, tigelas, velas. Esses produtos e objetos são comumente encontrados nos relatórios policiais de apreensão realizada durante as ações repressivas. A presença de imagens de santos católicos pode indicar uma assimilação de culturas ou sincretismo, comum entre os bantos. Essa mistura de culturas entre os bantos não se restringe ao catolicismo e as tradições africanas. Renato Ortiz afirma, sobre o grupo banto, que “É esta etnia que tende a sincretizar, com maior facilidade, suas crenças com a corrente espírita kardecista, dando assim nascimento ao que se costuma vagamente chamar de baixo espiritismo” (ORTIZ, 1999, p. 36 – 37).

Fato curioso é que Felisberto Cabinda (ou Cambinda) residia na capital, mas era muito conhecido em Sorocaba. Ademais, ao seu culto ritualístico frequentavam escravizados que burlavam as vigilâncias para participarem, durante a madrugada, das sessões. Qual era a extensão de sua influência?

Não se obteve maiores detalhes sobre as práticas religiosas em que o mestre Felisberto Cabinda era liderança. Em busca por jornais da capital paulista, encontram-se, na mesma época, diversas citações desse nome, associadas a prisões por desordem e embriaguez, mas nenhuma em relação a prática de feitiçaria (A PROVÍNCIA DE S. PAULO, 5 e 6 mar 1880, p. 2; 25 mar 1880, p. 2; A CONSTITUINTE, 25 mar 1880, p. 3; CORREIO PAULISTANO, 11 jan 1880, p. 3; 4 e 5 nov 1886, p. 1; JORNAL DA TARDE, 24 mar 1880, p. 1 e 27 nov 1880, p. 2). De um tal Felisberto Cabinda estava sendo cobrado o imposto predial sobre sua residência, na rua da Liberdade, nº 104, em São Paulo, no exercício dos anos 1886 a 1887 (CORREIO PAULISTANO, 21 out 1886, p. 2).

Assim como apareceu de repente, da mesma forma, na década de 1890 em diante, as pistas sobre Felisberto Cabinda desaparecem.


João de Camargo, de Sorocaba

Dentre os mais afamados praticantes de religiosidades afro-brasileiras, possivelmente, desponta o nome de João de Camargo. Sobre ele publicaram-se diversos livros, dissertações e teses, reportagens de jornais e revistas. Esse personagem histórico foi interpretado no cinema por Lázaro Ramos no filme “Cafundó”, dirigido por Paulo Betti.

Nasceu João de Camargo em uma fazenda no bairro dos Cocais, em Sarapuí, região de Sorocaba, no dia 16 de maio de 1858. Após a Abolição, ou pouco antes, teria se mudado para Sorocaba. Casou-se com Escolástica do Espírito Santo, mas o matrimônio durou pouco tempo.

Dizem – e o próprio João de Camargo confirmava – que trabalhava em trabalhos braçais, sendo um trabalhador dedicado, mas que ao final do expediente, embriagava-se todos os dias. Certa feita, ao sair do bar, completamente embriagado, teria se dirigido até a sua casa. Porém, no caminho, resolveu acender uma vela em uma capelinha em devoção a alma de um menino que naquele local.

João de Camargo disse, posteriormente, que teve uma visão do espírito desse menino, chamado de Alfredinho, que juntamente com Nossa Senhora e o espírito de Monsenhor João Soares ditaram a ele novas regras de vida, a qual dedicaria a partir daquele momento à caridade e a cura.

Por volta de 1906, constrói uma capela na beira da estrada do córrego da Água Vermelha (atual Avenida Barão de Tatuí, em Sorocaba), templo esse logo ampliado devido o número elevado de fiéis que o procuravam.

Em 1913 é preso e processado por curandeirismo e perturbação da ordem social. Para sua defesa atuou o advogado Juvenal Parada que não somente conseguiu absolvê-lo das acusações, como, ainda, orientou-o a registrar a capela como uma Associação Espírita, de maneira a não ter mais problemas com a polícia e a Justiça. No começo da década de 1920, João de Camargo seguiu a orientação de seu advogado e, a despeito do preconceito da elite branca da cidade, não teve maiores problemas com a Justiça (CAVALHEIRO, 2020).

Antônio Francisco Gaspar descreve João de Camargo como um curador que “em estado de extase ou transe, tem a graça de poder responder a consultas e indicar remédios aos padecentes, subjugado por esse agente invisível que d’elle se serve como de um apparelho ou instrumento para curar enfermos” (GASPAR, 2020, p. 66).

Originalmente, o testemunho de Gaspar foi registrado em 1925, data relativamente próxima do inicio do culto criado por João de Camargo, ou seja, cerca de 19 anos. Gaspar também descreve o cotidiano dos trabalhos realizados na igreja construída por João de Camargo:

O DIA DE CONSULTAS. A capella da “Água Vermelha” regorgita de povo. São seis horas da manhã. […] Por entre o vozeio intensivo da multidão que chega e espera abrir-se a porta principal da igreja, ouve-se, ao lado, o som brando das águas do córrego da “Água Vermelha” […] Alli se encontra a mãe que chora ao ver o filhinho doente, sem esperança de salval-o; acolá, é a jovem que vem pedir melhoras para seu velho pae; além é o infeliz agricultor que, vendo a plantação rechitica, vem pedir a João de Camargo que lhe dê um “arranjo” á lavoura […] No interior da capella, […] João de Camargo ajoelha-se, concentra-se e, segurando a extremidade d’uma fita que pende da mão da imagem do Senhor Bom Jesus do Bomfim, intuitivamente ouve a voz occulta e vae ministrando e indicando o remédio para este ou aquelle consultante (GASPAR, 2020, p. 51 – 53).

CAMPOS e FRIOLI (1999, p. 30) encontraram foi da influência angolana da macumba e do culto da calunga que desabrochou o culto de João de Camargo. Encontraram esses autores, também, elementos de diversas tradições como o catolicismo popular e até mesmo do espiritismo.

Como ocorreu com os outros casos de curandeiros e feiticeiros, João de Camargo sofreu perseguições das instituições. O ajuntamento de pessoas ao redor de sua igreja preocupou as autoridades que não desejavam ver surgir algum movimento religioso de “fanáticos”. Ademais, ao redor de sua igreja, João de Camargo constituiu uma territorialidade negra que rivalizava com o ideal burguês e branco do progresso industrial de Sorocaba (CAVALHEIRO, 2020).

Considerações finais

Seria por demais de extenuante indicar outras referências de cultos de matriz africana ou afro-brasileira que tenham se desenvolvido no interior de São Paulo. Os casos aqui citados servem, ao menos, para que possamos formar uma síntese e, ainda, apontar para a formação de uma memória dos rituais afro-caipiras de São Paulo nos séculos XIX e XX.

A maior parte dos casos apontados aqui são tidos como cultos de origem banto. Por banto, conforme dito antes, entende-se um grupo linguístico dos quais participam os congos, angolas, moçambiques, macuas, cabindas, benguelas, monjolos, entre outros. Os nomes dos participantes, as palavras designativas de objetos ou ações cultuais, o nome das divindades, tudo indica a origem banto.

Ao tratar da “macumba paulista”, Roger Bastide salienta que “os negros paulistas eram em grande maioria bantos e que, no Brasil, é entre os bantos que se encontra a maior parte dos fatos ligados aos cultos dos astros, em estado puro…” (BASTIDE, 1983, p. 197). Os grupos bantos baseavam suas crenças no culto aos antepassados (ORTIZ, 1999). Esse culto aos antepassados conheceu diversas formas e tendências, como o culto da cabula, da macumba e da calunga, transformando-se e adaptando-se conforme as circunstâncias, organizando-se posteriormente em uma nova religião. Com isso, conforme atesta Monique Augras, a macumba “passou a integrar uma nova religião que congrega elementos africanos, indígenas, católicos, espíritas e ocultistas, ou seja, a umbanda” (AUGRAS, 2008, p. 30).

Os rituais afro-caipiras de São Paulo serão combatidos a partir do temor da elite branca acerca de duas possibilidades: a do uso do feitiço e a da aglutinação de negros para insurreição.

A primeira está ligada ao imaginário criado desde a Europa acerca dos poderes “demoníacos” que as bruxas e feiticeiros exerciam. O Tribunal do Santo Ofício, numa perspectiva de manter o monopólio sobre o “mercado religioso”,[3] prendeu e combateu os acusados de feitiçaria.

O uso de forças sobrenaturais para diversas finalidades povoou a imaginação popular dos luso-brasileiros, gerando um temor desmedido em relação aos cultos afro-caipiras. Negrão (1996, p. 47) recorda um fato ocorrido 1876, na cidade de Tietê, em que o inspetor de quarteirões não teve coragem de impedir a reunião na casa de Mamã Catharina “porque teve medo de feitiços”.

O ajuntamento de escravizados e libertos foi uma preocupação que permeou toda a instituição da escravidão. Afinal, o chamado “haitianismo” – receio de uma insurreição de escravizados ao modo de como ocorreu na Guerra de Independência do Haiti – tinha a sua razão de ser devido a crueldade e injustiça nas relações escravocratas.

Esse temor se estenderá pelas primeiras décadas do século XX, alimentado pela ocorrência de movimentos messiânicos como o de Canudos e do Contestado, amparados por figuras religiosas que poderiam aglutinar um número considerável de pessoas ao seu redor. João de Camargo, por exemplo, foi comparado a Antônio Conselheiro num relatório oficial de saúde pública (CAVALHEIRO, 2020).

Procurando fugir das perseguições institucionais, alguns desses cultos afro-caipiras acabaram se organizando em irmandades e confrarias católicas, em sociedades “espíritas” e, posteriormente, assumindo o nome da Umbanda (CAVALHEIRO, 2020; OLIVEIRA, 2008; CAMPOS e FRIOLI, 1999; KOGURUMA, 2001; BASTIDE, 1983, NEGRÃO, 1996; AMARAL, 1991; AUGRAS, 2008; ORTIZ, 1999).

O fato de encontrarmos elementos nesses relatos do século XIX e início do século XX com os quais possamos relacionar com o que conhecemos hoje dos cultos e rituais afro-brasileiros demonstra uma resistência cultural que atravessou os tempos:

A velha feitiçaria dos escravos negros, que começou quinhentos anos atrás, noturnamente, às escondidas, nos terreiros das senzalas e nos arredores das fazendas, e que passou às rezas e comemorações nas confrarias católicas, nas igrejas e nos adros, acabando por dançar nos batuques das congadas, dos lundus e dos cateretês, essa feitiçaria foi persistindo nos calundus quase dois séculos, até que ganhou seus templos nas casas das cidades e acabou desabrochando em seus múltiplos arranjos pelos Brasil afora (CAMPOS, FRIOLI, 1999, p. 34).

O estudo dos rituais afro-caipiras do passado, portanto, permite olhar em perspectiva para a trajetória percorrida até os dias de hoje pelas diversas formas e modalidades da religiosidade africana no Brasil, especialmente dos grupos bantos, ocorridas por imposições sociais e econômicas, como apontou Ortiz (1999), culminando no surgimento, posteriormente, da Umbanda.

Referências

AMARAL, Raul Joviano. Os pretos do Rosário de São Paulo. São Paulo: João Scortecci Editora, 1991.

AUGRAS, Monique. O duplo e a metamorfose – A identidade mítica em comunidades nagô. Rio de Janeiro: Vozes, 2008.

BASTIDE, Roger. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Editora Perspectiva, 1983.

BASTOS, Abguar. Vocabulário dos ritos mágico-brasileiros de origem africana. In: D.O. Leitura, 10 dez 1991.

BERGER, Peter. O dossel sagrado. São Paulo: Paulus, 2009.

CAMPOS, Carlos de., FRIOLI, Adolfo. João de Camargo de Sorocaba – O nascimento de uma religião. São Paulo: Ed. Senac, 1999.

CAMPOS JUNIOR, João de. As religiões afro-brasileiras – Diálogo possível com o cristianismo. São Paulo: Salesiana Dom Bosco, 1998.

CAVALHEIRO, Carlos Carvalho. Vadios e Imorais. Sorocaba: Crearte, 2010.

______. Scenas da Escravidão. Sorocaba: Crearte, 2006. 

______. João de Camargo, o Homem da Água Vermelha. Maringá (PR): A. R. Publisher, 2020.

______. Tradições negras sorocabanas e memória. Sorocaba: Do autor, 2015.

COUCEIRO, Luiz Alberto. Pai Gavião e a Coroa da Salvação: crença e acusações de feitiçaria no Império do Brasil, Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia – IFCS/UFRJ, 2004.

CORTEZ, Edmundo Maranhão. Religiões africanas: Umbanda. São Paulo: Editora Três, [1986].

DUBUGRAS, Elsie., GRAZIANO FILHO, Romeo., DOLIS, Rosângela Maria. Cultos afro-brasileiros. São Paulo: Editora Três, s/d.

GASPAR, Antônio Francisco. O Mystério da Água Vermelha. (ed. Fac-similar). Sorocaba: Gilberto Tenor, 2020.

KOGURUMA, Paulo. Conflitos do Imaginário. São Paulo: Annablume, 2001.

MOTT, Luiz. Paulistas e colonos de São Paulo nas garras da Inquisição. In REVISTA USP, São Paulo, n.45, p. 116-128, março/maio 2000.

NARDY FILHO, Francisco. A cidade de Itu – vol. 3. Itu: Ottoni, 2000.

OLIVEIRA, José Henrique Motta. Das macumbas à umbanda. Limeira (SP): Editora do Conhecimento, 2008.

ORTIZ, Renato. A morte branca do feiticeiro negro. São Paulo: Brasiliense, 1999.

NEGRÃO, Lísias Nogueira. Entre a cruz e a encruzilhada. São Paulo: Edusp, 1996.

PAULA JUNIOR, Antonio Filogenio. Saberes no pé do Tambu. Rio de Janeiro: Malê Edições, 2022.

RIBEIRO, Júlio. A Carne. São Paulo: Martin Claret, 1999.

RIO, João do. As religiões do Rio. Rio de Janeiro: José Olympio, 2015.

[1] Resolução nº 71 de 2 abr 1876 – Código de Posturas da Câmara Municipal de Campinas. Acervo ALESP, texto disponível em: https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/resolucao/1876/resolucao-71-02.04.1876.html Acesso em 29 jan 2023. Interessante perceber que essas Casas de Batuques não se confundem com os batuques que são dançados. Na mesma postura, aparece outro artigo reprimindo a dança do batuque: “Art. 199. – Ficão prohibidos dentro da Cidade, ou chacaras proximas á Cidade, batuques, cantorias e dansas de pretos ou escravos que possão incommodar a vizinhança e o publico. O dono da casa ou chacara será multado em 20$000”. [2] Resolução nº 103 de 3 maio 1870 da Câmara Municipal de Santos. Acervo ALESP, texto disponível em: https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/resolucao/1870/resolucao-103-03.05.1870.html Acesso em 29 jan 2023. [3] O termo é emprestado do sociólogo Peter Berger que ensina que com o fim dos monopólios religiosos (separação entre o Estado e a Igreja), as instituições religiosas “não podem mais contar com a submissão de suas populações”. Assim, “a tradição religiosa, que antigamente podia ser imposta pela autoridade, agora tem que ser colocada no mercado” (BERGER, 2009, p. 149). As diferentes tradições religiosas, portanto, com o fim do monopólio, disputam o mercado religioso entre os possíveis fiéis / consumidores.


Carlos Carvalho Cavalheiro

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