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O gato e o velho

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Clayton Alexandre Zocarato: ‘O gato e o velho’

Clayton Alexandre Zocarato
Clayton A. Zocarato
Imagem gerada por IA do Bing – 16 de outubro de 2024 às 1:30 AM

Como de costume aquele velho rabugento, desdentado, carcomido e solitário chegou até o boteco da  sua  preferência.

Com a barba a fazer, e portando um andador surrado com tempo, enferrujado e cheio de bactérias, que um pequeno corte bastaria para pegar um tétano lascado, caminhou até o balcão já com o seu mau humor costumeiro.

– Hei! Seu balconista lerdo, me vê a mesma porcaria de pinga de sempre, por gentileza.

E lá vai o balconista cumprir as ordens daquele cliente que, ainda mesmo na casa dos oitenta e tantos anos,  não deixava  o costume de julgar, a mandar em todos, auscultando que estava no tempo da “Ditadura” ainda, já que era um grande simpatizante dos membros da “Caserna”.

E assim o velho se sentou isolado, e não gostava de ser importunado por ninguém.

Diante de suas artrites severas, e seus problemas pulmonares em virtude do tabaco, tinha noção que já  estava,  “fazendo peso na terra”.

E tampouco alguém se importaria com sua morte, então era aproveitar o pouco da diversão da vida de solteirão lhe proporcionava, que era se embriagar diante das poucas “migalhas financeiras” que tinha de sua aposentadoria de antigo funcionário da falida Companhia de Trens Intermunicipais.

Mesmo diante do marasmo de uma existência fajuta, tinha a consciência de que a morte seria somente um complemento para continuar respirando e resmungando em outro plano existencial, sendo uma forma de transmutação que viesse trazer algum relaxamento para suas limitações físicas, mas que, pelo contrário, desenvolveu uma mente perspicaz e assídua para falar mal da vida alheia, fazendo da fofoca uma das poucas coisas de valor que ainda poderia  esperar de seus dias.

No meio daquele bando de consumidores assíduos de álcool, de vez em quando aparecia algum vira-lata magricela, procurando silenciosamente alguma posta de salgado ou carne vencida, pelo qual teria companhia de larvas e mosquitos que  aí faziam sua “degustação diária de doenças e  incômodos zumbizante”, quando não tinham seu “alimento” vendido pela metade do preço para os clientes menos desavisados, ou que já estavam encharcados de tanta birita, e que não percebiam tal falta de higiene.

Ele  era um que comia dessas “fartas pachorras de guloseimas baratas”, e também não tinha a menor paciência com os “doguinhos” que ficavam ao seu redor, lhe causando importunos por causa que  sua medíocre solidão tinha sido interrompida.

Mas no meio daqueles cachorros, nesse dia surgiu um gato gordo, portentoso, forte, maravilhoso, que fez vários daqueles barrigudos  bebedores de cerveja prestarem atenção em sua virtuosidade e beleza.

E ele passa para lá e para cá, com seus olhos azuis cintilantes e fortes, prontos para dar um bote em quem ousasse se aproximar.

O velho, mesmo com sua catarata, avistou o felino, e voltando em suas memórias, tinha plena convicção que um dia tinha sido tão ágil, belo e sadio como a criatura que estava passeando em sua frente.

– Esse gato tem algo de especial… No meio de toda essa miséria e sujeira ele está aqui, passeando de um lado para o outro, como se estivesse pronto para pegar algum de nós, malditos infelizes e levar para o mundo dos mortos- pensou consigo mesmo.

Em um momento da sua vida tinha lido, que no Antigo Egito, o gato era considerado o guardião dos mortos, e dos submundos.

Lentamente o bichano, vai se aproximando, com suas cores branca e preta, mas de tanta bebedeira coletiva, quase ninguém nota sua presença.

Os cachorros famintos, quase nem tem forças para latirem para o intrépido invasor que aproxima daquele  local de  perdição e lamento.

E ele vai assim se constituindo imponente em sua jornada, demonstrando toda  a sua leveza e beleza, entre uma falta de elegância humana, mas aonde sobra ganância material, e pouca paz mental.

Ele empina o rabo, e diretamente vai até velho no fundo daquela espelunca e pula no seu colo, esfregando a cabeça no seu peito, como se estivesse  pedindo carinho, o que automaticamente recebe do ‘saco bípede  de reclamações ambulante’.

– Bem gatão, você é único que me deu atenção entre todos esses imbecis, e pelo jeito está sozinho assim como eu, nesse mundo hipócrita, já fui tão belo como você agora só aguardo o dia da minha morte.

Com muita dificuldade conseguiu um coleira, que era de um dos frequentadores do bar, e passou no pescoço do belíssimo animal.

Pegou seu andador e amarrou a corda que prendia o gato junto aos pés do seu fiel companheiro de  metal andante.

Como de costume deixou o dinheiro em cima do balcão e saiu seu cumprimentar ninguém, mas não sem chamar atenção, dos frequentadores do botequim.

– Esse gato vai perder toda a formosura e vai morrer de fome logo. Esse velho ao qual nem se quer sabemos o nome não vai tratar dele, de maneira alguma.

Comentou um dos clientes, que observavam “a partida do animal”, e do gato.

O velho não voltou mais ao bar, mas nem se quer notaram sua ausência.

Dias depois devido há um imenso mau cheiro que vinha de uma casa próxima do bar, e polícia foi chamada até o local para averiguar o odor de carne podre que vinha incomodando seus moradores, que vinha diretamente de suas residências. 

Arrombaram a porta da casa, e encontraram o velho coberto de moscas e em  estado de  decomposição.

Fazia dias que tinha morrido, e unicamente notaram sua ausência, através da difusão do cheiro insuportável do seu cadáver.

Enquanto o gato que tinha levado para casa ,dormia tranquilamente em sua cama de molas, se espreguiçando docemente, o que fez um policial levá-lo para casa, e assim ter um novo lar para fica

– Gatinho você tem um novo lar, mais tranquilo que esse muquifo em que enfiaram você! Disse o ingênuo policial.


Clayton Alexandre Zocarato


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