Mateus Pinto: Crônica ‘À vossa atenção!’
– O que estás para aí a dizer? – vociferou o Editor-Chefe, interrompendo-me a palavra. Foram duas as vezes que perguntou ao telefone com quem lidavam. Andava às voltas com uma das mãos ao rosto, enquanto adiava o meu discurso com questões.
Dava para perceber que, de paciência, o homem não chegava nem aos pés do próprio escritor.
Os retratos afixados na vitrine do gabinete, entre elas fotos de José Paciência, Victor Evaristo, Haires Fernando e outros nomes da nova geração, possíveis pistas espalhadas sobre a mesa e um ar irritado era um pouco de tudo que se exibia, enquanto aguardava até mesmo o silêncio calar ao sinal do cigarro murcho entre os dedos.
O certeiro seria o caso estar nas mãos do Círculo de Estudos Literários encabeçado pelo atual Presidente Hélder Simbad ou órgão similar, cogitava, mas por ser uma situação sensível, decidiu-se tratar à portas fechadas. Ninguém, além do Editor-Chefe sabia sobre o ocorrido até por um pequeno deslize meu, ter sido achado no dia da venda do livro de José Paciência, porém sem o que lhes mordia o ser: possíveis provas de que em (Des)contos Em Poesias há uma provocação a uma possível parte dois de Os da minha Rua de Ondjaki.
Como aos leitores esse era um assunto que não monologava, e-mails após e-mails eram enfilados no correio do escritor que há muito não se apresentava aos sedentos, nem mesmo para saudar.
Por consequência do ocorrido, decidiu revisar tal obra ao som dos que tinham voz também, para ver de perto o que lhe tinha escapado na memória quando as sentenciou, mas nada achava, pelo contrário um punhado de riso ao reler O voo do Jika e outros mais. Sendo assim, remeteu uma mensagem ao Editor-Chefe sem omitir um detalhe sequer, e esse, por sua vez, com medo de que tivesse sido o sujeito dessa acção, começou a caçada sem mesmo perceber o que realmente lhe escreveu Ondjaki.
E como resultado da falta de paciência do homem, aí estava eu, Hánji Kiami, nas tentativas falhadas, a justificar a razão de levar os leitores a pedirem uma segunda edição de Os da minha Rua ou qualquer coisa de Ondjaki para, ao menos, no seio dos leitores ter paz de espírito literário.
À propósito, já leu OS DA MINHA RUA?
Hánji Kiami
Contatos com o autor
- Mão na massa e no saber - 27 de agosto de 2024
- À vossa atenção! - 22 de agosto de 2024
Hánji Kiami, pseudônimo de Mateus Passagem Pinto, natural de Luanda (Angola), é escritor, poeta e cronista. Licenciando em Ciências de Educação, na especialidade do Ensino da Língua Portuguesa no Cuanza Sul, no actual ISCED Sumbe. Ganhou o gosto pela escrita ainda pequeno, quando, de forma ousada e com auxílio de alguns docentes, passou a ser conhecido, por meio de recitais na escola e amante da literatura. Adotou o pseudónimo do kimbundu Hánji Kiami como uma das maneiras de valorização da sua identidade cultural angolana, o que nalguns momentos é notório nos seus escritos, influenciado por escritores como Óscar Ribas, Uanhanga Xitu, Ondjaki, Lucas Cassule e Dias Neto. Tem textos publicados no Portal Brasileiro Recanto das Letras. É Gestor de Projectos comunitários, Coordenador/Presidente da Associação de Jovens Escritores do Sumbe.
Muito inteligente sua escrita 👏👏👏👏👏