“Em primoroso trabalho de pesquisa, que recupera parte importante de nossa História, o pesquisador Dr. Reinaldo Crocco Junior assegura que foi em Porto Feliz que nasceu a maçonaria paulista.”
Em primoroso trabalho de pesquisa, que recupera parte importante de nossa História, o pesquisador Dr. Reinaldo Crocco Junior assegura que foi em Porto Feliz que nasceu a maçonaria paulista. Em seu livro “Intelligência – a Loja-mãe da maçonaria paulista”, Reinaldo Crocco informa que em 19 de agosto de 1831, os militares João Baptista Lobo de Oliveira e Luiz Luciano Pinto, oriundos de Cuiabá, “fundaram oficialmente a primeira Loja Maçônica do Estado de São Paulo, com o título de Intelligencia” (p. 45).
Em 15 de dezembro daquele ano, os fundadores da Loja Intelligencia procederam à iniciação de um terceiro membro, João Gaudie Ley, que chegou a ocupar o posto de Tenente na 1ª Companhia de Cavalaria da Legião de Cuiabá, quando optou por estudar Direito na recém-inaugurada Academia de Direito de São Paulo, criada em 11 de agosto de 1827 e instalada em 11 de março de 1828.
João Gaudie Ley foi assassinado em 1839, em Goiás. Diz o jornal “A Phenix”, edição de 3 de julho de 1839, página 4, que “Pela meia noite, mais ou menos, veio o Doutor Gaudie, a escolta gritou: – Quem vem lá? – Sou João Gaudie; o que querem os Srs.? – E ao mesmo tempo dizem que disparára uma pistola que negou fogo. Então o cabo e mais 4 soldados fizeram fogo e cahio o doutor. Accrescente-se que não estando morto, um dos soldados lhe dispara uma pistola na testa…”.
A narrativa, um extrato do Jornal do Commercio, apresenta o trágico fim do advogado e maçom. Ernesto Cerveira de Sena, em tese de doutorado, intitulada “Entre anarquizadores e pessoas de costumes – a dinâmica política e o ideário civilizatório em Mato Grosso”, informa que João Gaudie Ley foi nomeado Juiz de Mato Grosso pela Regência, mas antes mesmo de assumir, foi assassinado em Goiás por “questões políticas do lugar” (2006, p. 211). Já José de Mesquita, ao tratar da vida e da descendência de André Gaudie Ley, pai de João, traz um relato mais cauteloso, dizendo que “Este trágico acontecimento que sacrificou, aos 28 annos, uma vida que se iniciara sob os mais favoráveis auspícios e cheia das mais risonhas esperanças, foi o epílogo doloroso de um lamentável drama de família, acerca do qual existem as mais desencontradas versões, sendo certo, entretanto, prender- se o caso á morte de Antonio Luiz Brandão, cunhado do Dr. João Gaudie e primeiro marido de D. Rita Delphina, filha do Capitão-mór” (1922, p. 53 – 54).
Nos primeiros anos de atuação, a Loja Intelligencia de Porto Feliz fundou outras congêneres em cidades como Areias (Harmonia Areense, em 1833), Bananal (União e Fraternidade, 1834); Capivari (Azilo da Virtude, em 1844); São Paulo (Ypiranga, 1847); Campinas (Independência e Fraternidade Campineira, ambas em 1859) entre outras.
A fundação da Loja Intelligencia desnuda outro fato interessante: apesar do declínio das Monções (como episódio à parte da história do bandeirantismo paulista, ou seja, dentro do conceito de expedição fluvial que partia de Porto Feliz para as regiões auríferas de Cuiabá), ainda era estreita a relação entre a província de Mato Grosso e a Vila de Porto Feliz. A “Intelligencia” foi fundada por cidadãos do Mato Grosso.
Outros fatos, ocorridos na década de 1830, reforçam essa assertiva. Em 1832, o então presidente da Província de São Paulo, o sorocabano Rafael Tobias de Aguiar, oficia ao Presidente e demais membros da Câmara Municipal de Porto Feliz acerca do “prejuízo, que deve resultar ao Commercio estabelecido entre esta Província e a de Matto grosso se não houver meio de cohibir-se a fuga dos Camaradas empregados na tripulação das Canoas…” (O NOVO FAROL PAULISTANO, 28 mar 1832, p. 1).
Na mesma época, há uma representação solicitando informações ao Juiz Municipal da Villa de Porto Feliz pelo fato de ter expedido ordem de Habeas-Corpus a presos conduzidos pelo Alferes João Ferreira, provenientes da Província de Matto Grosso (O PAULISTA OFFICIAL, 22 ago 1835, p. 2).
Assim, fica entendido que os nossos caminhos fluviais, entre eles o Tietê, continuaram sendo utilizados como meio de ligação entre as duas Províncias, mais de cem anos depois do início da grande epopeia das monções.
Carlos Carvalho Cavalheiro – carlosccavalheiro@gmail.com
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Natural de São Paulo (SP, atualmente reside em Sorocaba. É professor de História da rede pública municipal de Porto Feliz (SP). Licenciado em História e em Pedagogia, Bacharel em Teologia e Mestre em Educação (UFSCar, campus Sorocaba). Historiador, escritor, poeta, documentarista e pesquisador de cultura popular paulista. Autor de mais de duas dezenas de livros, dentre os quais se destacam: ‘Folclore em Sorocaba’, ‘Salvadora!’, ‘Scenas da Escravidão, ‘Memória Operária’, ‘André no Céu’, ‘Entre o Sereno e os Teares’ e ‘Vadios e Imorais’. Em fevereiro de 2019, recebeu as seguintes honrarias: Título de Embaixador da Paz e Medalha Guardião da Paz e da Justiça e Medalha Notório Saber Cultural, outorgados pela FEBACLA – Federação dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes e o Título Defensor Perpétuo do Patrimônio e da Memória de Sorocaba, outorgado pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos. É idealizador e organizador da FLAUS – Feira do Livro dos Autores Sorocabanos