Ivete Rosa de Souza: Crônica ‘O que você fez dos dias que viveu?’
Outra noite sonhei que alguém me fez esta pergunta: O que você fez nos dias que viveu?
Não sei quem era, só ouvi a voz, o lugar onde estava era diferente, não era terreno, ao menos em minha concepção. E eu ali, comecei a calcular: eu tenho 68 anos vividos, bem ou mal, tive minhas conquistas, que não cobriram os meus fracassos. Quanto tempo ainda tenho a ser vivido? Outra pergunta sem reposta.
Mas me recordo bem de ter tentado calcular 68×12=816 meses; contando 365 dias ao ano, multiplicados por 68 anos, lá se foram 24.820 dias, sem contar os bissextos, se contar em horas, 365×24=8.760, em minutos, cada hora tem 60, cada minuto 60 segundos, e por aí a soma vai aumentando. Confesso que fiquei preocupada ao me lembrar de quanto tempo perdido temos em nossas vidas.
Os momentos que nos esquecemos de falar uma palavra de carinho, ou de demonstrar que precisamos de alguém, ou que ficamos tristes com determinada ausência. Somos egoístas?
Distraídos, ou incompetentes?
Me lembrei de tanta tristeza causada por ignorância, por despeito, por medo, vergonha, ou simplesmente por não ter prestado atenção ao outro. A vida é curta, dizem alguns. E o que fazemos de nossas vidas? É a nossa escolha.
Muitas vezes deixamos trabalho, ou outra coisa qualquer interferir em nossos caminhos, em nossas decisões. Temos tanto a ganhar, e muito a perder. Somos humanos falíveis e incoerentes. O que fazemos de nossos dias, nossas horas, nossos minutos? Corremos atrás de tanta coisa, e deixamos de lado a importância de realmente viver.
Estamos no mundo, e o que construímos? O que fizemos de bom ou de mal? Será que realmente vivemos?
Será que escolhemos nossos caminhos? Será que fomos sinceros com nossa vontade, desejo e vida?
Fiquei encafifada, claramente uma única pergunta, me deu um grande choque de realidade. O que fiz nos meus dias de vida? Realmente respeitei a grandiosidade de ter nascido? De ser humana? Quantas vezes deixei a mágoa, a tristeza e a raiva me dominar, quanto tempo eu perdi, na grande contagem de cada segundo? Eu, que sempre me achei uma pessoa honesta, não tive honestidade comigo mesma; até o momento não sei o que fiz nesses dias vividos que passaram, com tanta pressa que eu nem sei como cheguei até aqui; não posso contar o que fiz de importante, de majestoso na caminhada desta vida.
O estranho é olhar o caminho percorrido, sem ter ideia de que realmente me importei comigo, ou com o que fazia em cada momento. Dói ver o desperdício, o tempo escorrido entre os dedos, sem poder ser recapturado. Cada um deve se fazer esta pergunta, e se der tempo, fazer um balanço do que pode mudar, melhorar e viver.
E você, leitor: o que você fez nos dias que viveu?
Ivete Rosa de Souza
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Natural de Santo André (SP) e ex-policial militar, é uma devoradora de livros. Por ser leitora voraz, para ela, escrever é um ato natural, tendo desenvolvido o hábito da escrita desde menina, uma vez que a família a incentivava e os livros eram o seu presente preferido. Leu, praticamente, todos os autores clássicos brasileiros. Na escola, incentivada por professores, participou de vários concursos, sendo premiada – com todos os volumes de Enciclopédia Barsa – por poesias sobre a Independência do Brasil e a Apollo 11. E chegou, inclusive, a participar de peças escolares ajudando na construção de textos. Na fase adulta, seus primeiros trabalhos foram participações em antologias de contos, pela Editora Constelação. Posteriormente, começou a escrever na plataforma online Sweek a qual promovia concursos de mini contos com temas variados, sendo que em alguns deles ficou entre os dez melhores selecionados, o que a levou à publicação do primeiro livro, Coração Adormecido (poesias), pela Editora Alarde (SP). Em 2022, lançou Ainda dá Tempo, o segundo livro de poesias, pela mesma editora.