Clayton Alexandre Zocarato: ‘O silêncio de um amor juvenil’
Ficava praticamente todos os intervalos a admirá-la em seu silêncio.
Afinal, os grandalhões do time de futebol tentaram de tudo para conquistá-la e falharam, miseravelmente.
Sabia que ela adorava ouvir músicas românticas de grupos pops que marcaram sua época da década 1980, como Roxette, Genesis, Duran Duran, Cultura Club…
Mas não tinha coragem para sequer tentar dizer um “oi!”, e assim iniciar um “bate-papo” juvenil acerca de seus afazeres do cotidiano.
Ficava admirando-a sempre de longe.
Ela, com os seus cabelos longos cor de ouro, jovem, com uma mistura de pureza e sedução o deixava cada vez mais encantado.
Quando acabava as aulas, ficava olhando suas fotos pelas redes sociais por horas, tentando deduzir o que estaria fazendo naqueles momentos em que estava longe um do outro, até amanhã seguinte.
Chorava como uma criança desesperada de saudade, em silêncio, e muitas vezes a única companhia para seus sonhos de amor cheios desilusões e insônia, causados por sua timidez, era testemunhado em seu quarto pintado em um banco tosco, com alguns postes de bandas de rock envelhecidos, que o faziam viajar psicodelicamente, em como seria fabuloso ficar dançando com ela a boate de sábado inteira, sem se importar com o que os “outros” iriam dizer.
Mas todo dia acordava e já tinha plena noção do que o aguardava até o final do ano letivo: ficar de longe admirando-a, sem ter coragem de tentar dizer algum “oi!” para iniciar algum tipo de conversação que propiciasse um doce xaveco, que viesse assim a preencher o vazio de um coração apaixonado, que sonhava com seus olhos cor de esmeralda e sua pele lisa como o mais sedosos sabonetes, e seu cheiro eletrizante como os mais requintados perfumes.
Já havia pensado em tudo, mas sua timidez era maior do que sua vontade de estar perto dela.
– Meu Deus, ela é um formosura, de relva de paixão que poucos podem entender, como ou que queria poderia fazer para apreciá-la perto de mim? Em emprestar meus ouvidos para seus mais variados problemas e assim poder realmente ser seu amante, e não um projeto petulante de malandro que viesse apenas a querer seu corpo.
E assim aquele ano letivo foi se passando, e ele continuava voltado para dentro de sua imaginação sem projetar uma ação concreta que pudesse, assim, mudar aquela situação de dor.
Secretamente tentava ensaiar alguns passos de dança, para quem sabe tentar tirá-la para dançar e, dessa forma, poder declarar o quanto ela tinha se tornado importante para seus mais duros vácuos em não conter uma namorada, assim como os outros garotos da sua idade já tinham sua garota, pois ele era o único solteirão, e já vinha sofrendo com zueras desnecessárias perante o poder de uma libido impregnada em muitos corpos, que não perdoaria um romantismo puro guardado no coração de qualquer jovem inocente.
“Comer e depois procurar outra refeição do sexo frágil, era norma de boa parcela dos garotos”.
Ficava muito triste com toda aquela situação, mas não era só tesão que tinha, desejava poder pegar em sua mão, levá-la ao cinema, tomar o mais refrescante sorvete, na mais pomposa sorveteria da cidade.
Mesmo sendo um tremendo “cdf”, com as melhores notas da turma, pouca bola ela dava para ele, para dizer que sua existência era praticamente irrisória aos seus olhos.
“Mudou seu visual, desde o ‘mauricinho mais engomadinho, ao projeto de bad boy desleixado”, mas de nada adiantava.
Sua mágoa e tristeza foram aumentando vertiginosamente.
Passava noites em claro, e sua ansiedade estava tomando proporções de perder o controle de dentro de si, levando a um estado de loucura, que necessitaria de muitas doses de tarjas pretas para assim poder acalmá-lo.
Tentou academia para ficar bombado, mas seu fenótipo franzino não contribuía para adquirir uma massa muscular consistente, e tentou até tomar algumas “bombas”, mas a única coisa que conseguiu foi uma infecção no fígado que o fez tomar medicamentos pesados para assim desinchar o órgão.
Já não sabia mais o que organizar para tentar chamar a atenção de sua musa, que ficava totalmente encarcerada em sua imaginação.
A melancolia era seu consolo e sua companhia cotidiana, e de forma silenciosa como um câncer devastador, o consumia por dentro.
Andava pelas ruas, de um lado para o outro, para assim quem sabe a “encontrar”, mesmo que fosse somente para admirá-la por alguns segundos.
Sabia também que era uma menina difícil, mas o que nutria um pouco sua esperança é que, mesmo diante de tantos rapazes com uma condição corporal melhor do que a sua, não deixava se impressionar facilmente por isso.
Ficava às vezes imaginando, “ela seria um tipo de Queen of Rain”, que viria para abençoar os pingos de tempestade que faziam sua imaginação ficar cada vez mais pensativa em arranjar, alguma maneira de ao menos tentar chegar perto de sua musa inspiradora, que assim passaria a sua fase juvenil a sempre sonhar com ela.
Pensava em muitas alternativas para tentar ganhar um oi ao menos, um alento, um olhar dócil que assim fizesse seu dia valer a pena, e por fim ter algum tipo de consolo e alegria.
Mas seu silêncio era algo assustador, seu maxilar travava só pode pensar em abrir a boca e pronunciar algumas poucas palavras que a fizesse prestar atenção em sua pessoa.
Certa vez passeando pelo jardim perto do liceu em que ambos estudavam, estudavam, a viu lendo um livro de poesias, o titulo pouco importava, mas uma brisa leve tocava o rosto de ambos, massageando suas bochechas, como um toque divino, anunciando que Cupido estava espionando-os.
Suas pernas tremiam freneticamente.
Ela estava sozinha, como se aproximar dela sem parecer um perfeito otário? O que dizer? Como abordá-la sua timidez era maior de que todas as suas vontades.
Ficou atrás de uma jabuticabeira enorme, observando-a, mas de tanto encanto que estava com a sua beleza, acabou por pisar em um graveto seco, e com um pequeno estalo chamou a atenção de sua musa.
Ela o olhou docemente, ele quase teve um colapso por completo de todas as suas funções vitais.
Ela sorriu alegremente, ele ficou vermelho como um caqui.
Um suave silêncio se fez naquela tarde de verão, enquanto ambos os jovens se entreolhavam.
Ela foi o primeiro a quebrar o silêncio.
– Olá meu jovem admirador, me chamo Maya e você?
Ele suando frio como uma pedra de gelo.
– Ooooo…. laaaaaá! Me, me, me, me chamo Átila!
Ela ficou lisonjeada com a dose de timidez e pureza dentro do coração daquele jovem.
– Átila! Nome de um carrasco da Idade Média, mas que entre suas franjas de cabelo liso preto, e de olhos negros, refletiam a leveza de uma pessoa bem-aventurada, que tem medo de chegar perto de mim! Acho você muito fofo, sabia!…
Átila estava nas nuvens, em poucos minutos havia trocado algumas palavras com sua ninfa inspiradora, e agora até seu nome sabia.
– Eu queria sentar perto de você, permite?
– Sim, claro seu bobo, venha aqui para perto de mim?
Passaram aquela tarde ensolarada, conversando de tudo um pouco, e criando laços de afinidades, que foram se fortalecendo com seus encontros diários na escola, e assim quebrando o silêncio juvenil de ambos.
Rumo à maturidade incerta, bem como uma conectividade de paixão, desértica de razão, mas contendo muita atração, e estrema emoção…
A juventude é um eterno quinhão de excitação e aflição, sem muita razão.
Clayton Alexandre Zocarato
Contatos com o autor
- A morte e a sorte - 19 de novembro de 2024
- Amenizando - 12 de novembro de 2024
- Falante - 7 de novembro de 2024
Natural de São Paulo, Capital, possui Licenciatura em História pelo Centro Universitário Central Paulista – Unicep – São Carlos/SP e graduação em Filosofia pelo Centro Universitário Claretiano – Ceuclar – Campus de São José do Rio Preto/SP. Escreve regularmente para o site Recanto das Letras (www.recantodasletras.com.br) usando o pseudônimo ZACCAZ, mesclando poesia surrealista, com haikais e aldravias. É Comendador da Ordem Cultural Beethoven.