Ella Dominici: Poema ‘Ouro derretido à deriva’


pergunta-me onde me achava morrendo
como um navio incendiado em alto mar
deixando tombar o ouro que se fundia em pleno amar lava
incandescente derretendo aos poucos a formar arte deslumbrante
sem ar no pulmão das águas frias
pergunta-me as palavras que te dissera
foram de audácia as correntes que te prenderam
algema líquida que te segurou bem firme
deixara-te deslizar como peixe escorrega das mãos
redimes, lembra-te e salta em águas conhecidas
reconhece teu habitat
peixe que passa por minhas pedras limosas de cheiro do mar
marulho te cante aos ouvidos
salgado salino ao teu paladar
brinda e não esqueças do molhado na borda da taça
folga-te das bolhas que se formam na boca que beijas
palavras poéticas feitas de um nada
se agitam e dizem o tudo de uma só vez
brigas comigo que o tudo é teu é meu
é demais e de mais ninguém
nademos sem rumo de mãos enamoradas
se me afundas te sossego, se te afundo nadas de braçadas
e boias de prazer comigo
olha-me molha-me debaixo d’água
meu corpo se dilui e a visão é ilusão
o movimento é nosso no insustentável
até que morras até que acordes
de tuas águas que me quiseram e me amaram
pergunta-me onde me achava
morrendo como um navio incendiado em alto mar,
à deriva
Ella Dominici
- Ouro derretido à deriva - 4 de dezembro de 2025
- O que mora na seca do sonho - 28 de novembro de 2025
- Mulheres de São Paulo - 21 de novembro de 2025
Natural de São Paulo (SP), é endodontista por profissão e formada no curso superior de Língua e literatura francesa. Uma profissional que optou por uma ciência da área da saúde, mas que desde a infância se mostrava questionadora e talentosa na Arte da Escrita, suscitando da parte de um mestre visionário a afirmação de ela ser uma escritora nata, que deveria valorizar o dom que recebera. Atendendo ao conselho recebido, na maturidade Ella cumpre o vaticínio e lança o primeiro livro solo de poemas (Mar Germinal), rompendo com a escrita meramente contemplativa, abraçando fragmentos, incertezas e dualidades para escancarar oportunidades a si como ao outro. Dribla o autoritário tempo, flagra mazelas psicológicas em minúsculas e múltiplas impressões exteriores e internas. É membro da AMCL – Academia Mundial de Cultura e Acadêmica Internacional da FEBACLA. Coautora de várias antologias. Publica na Revista Internacional The Bard e se inscreveu no 8º Festival de Poetas de Lisboa, participando da antologia promovida pelo evento

