A nova colunista Tereza Du’Zai é natural de Itajaí/SC
O nome da nossa nova colunista é Tereza Du’Zai. Ela é poeta, contista, cronista e professora de Língua Portuguesa e Literatura. O tempo, a loucura, a solidão e a morte são temas recorrentes na obra de Duzai que, desde 2015, tem se dedicado, também, à literatura fantástica e gótica. Vencedora do III Concurso UFES de Literatura na categoria poesia, participou também de coletâneas publicadas entre 2016 e 2017. Nesta edição do ROL, suas primeiras contribuições: poesias fantásticas, interessantes, revolucionárias e combativas, todas vibrantes e, surpreendentemente belas, apesar do vigor dos temas abordados. Repare, leitor(a), no estilo literário simples da poetisa Tereza. E na clareza de exposição dos assuntos e na força das palavras. Seja muito bem vinda ao nosso time de colunistas, Tereza! (Helio Rubens, editor)
Os Meus Ninguéns
Os meus ninguéns não são os ninguéns de Eduardo Galeano;
Os meus ninguéns, também filhos de ninguéns, pensam que são donos de tudo;
Os meus ninguéns vivem a vida explorando alguéns;
Os meus ninguéns, pouco são, embora acreditem muito ser;
A maioria dos meus ninguéns desconhece a própria língua, mas propaga estrangeirismos;
Muitos dos meus ninguéns são religiosos e supersticiosos;
Vislumbrados e insensíveis, compram excentricidades por obra de arte,
Gastam exorbitâncias em shoppings centers
E pechincham artesanatos à beira-mar.
Os meus ninguéns não são hum+mas aberrações humanas;
Desconhecem o significado de cultura, desprezam o folclore, mas se julgam cultos sobre todos os alguéns,
Eles não têm feições, têm maquiagens e plásticas;
Eles não conversam, encenam;
Eles não têm identidade, têm aparências;
Eles aparecem nas colunas sociais,
Mas valem menos do que a vaidade que os mata.
…
Poemas
Não gosto de poemas de amor, nunca gostei.
Poemas devem ferir, excitar, provocar fugas, mudança de página;
Poemas devem ser escritos não para serem lidos, ou suportados, até o final,
Mas para serem sentidos, admirados ou repudiados, desde o início.
Gosto de poemas hemorrágicos, catastróficos, assassinos, incendiários;
Gosto de poemas malcheirosos, estúpidos, invasivos;
Aqueles que denunciam, provocam, ofendem;
Aqueles que desenterram cadáveres esquecidos
E com eles dançam um bom twist sobre mármores e flores artificiais.
Gosto, sobretudo, da poesia que denuncia os significados
das insignificâncias do mundo
…
Brasil
Em Lisarb existe uma máquina de triturar sonhos,
Com dentes humanos,
Movida por um grande braço de dor.
Em seu corpo, vermes holográficos
Deslizam contorcendo-se em vórtices
Engolidos por uma grande mola propulsora
Que os transforma numa massa uniforme,
Modelável, humana.
…
Volúpia
Todas nós, mulheres do mundo, somos Virgens Marias,
parimos virgens e continuamos virgens;
todas nós, mulheres do mundo, temos um José ausente, insuficiente;
todas nós, mulheres do mundo, queremos um anjo Gabriel que nos visite ao anoitecer;
todas nós, mulheres do mundo, temos um amante invisível,
que nos acende, nos santifica e nos penetra com sua luz;
todas nós, mulheres do mundo,
somos o nosso próprio milagre, o nosso próprio Deus, o nosso próprio diabo.
Somos mães, irmãs e filhas de nós mesmas.
…
Maldade
A maldade dança rua afora
rodopia cada vez mais perversa,
coberta com seu manto rubro,
transbordante de alegria;
escarra à minha porta,
beija a boca da vizinha,
faz-lhe filhos deformados
e rodopia, rodopia invencível,
entre cacos de agonia.
Apenas seus pés choram
o sangue ciclo da menina morta: Esperança.
Morta entre um riso e um grito de bom dia.
…
Alegorias
A poesia grudou no céu da minha boca, na minha língua solta,
nos meus lábios secos.
Ai de ti!
Não me olhes!
Não me beijes!
Ou te tornarás um verso avesso,
o espelho de minh’alma inversa,
nas estrofes tortas de teu corpo travesso, que se atravessa,
que se arremessa sem pressa,
refletido em mim.
Em mim.
…
Divino
Não quero ouro, nem incenso, nem mirra;
não quero o menino, nem a mãe do menino.
Basta de milagres!
Basta de falsas puritanas!
Eu quero os três reis magros,
eu quero José com seu cajado sagrado,
eu quero sonhar com a estrela de Davi viva entre minhas pernas.
Sou um anjo em quatro dimensões.
Dê-me um pouco de calor e eu serei tua salvação.
…
Condor
A noite se encheu de estrelas mortas,
estrelas de sombra,
filhas, netas, bisnetas de meus antepassados;
esposas de Deus, amantes de Maria,
penetradas e lambidas.
Invejei-as,
clamei pelo sêmen divino.
Desnudei-me, santifiquei-me.
Um minuto de silêncio, um sussurro débil,
e renasci como um poema oculto no ventre de uma casa vazia,
presa à sombra de um verso nu.
Um dia, talvez, Deus haverá de me comer.
…
Santa Clara
Se eu fosse Eva, eu amaria Deus sobre e sob todas as coisas:
sobre o solo sagrado, sobre as plantas miúdas;
sobre as folhas secas da figueira;
sob o céu ensolarado, enluarado, estrelado;
sob os olhares voluptuosos dos anjos e dos santos guardiões.
Conceberia eu o seu filho unigênito,
filho do prazer, não da submissão.
Que comesse Adão da árvore do conhecimento,
e que fosse a serpente sua fiel procriadora.
Eu permaneceria ignorante e feliz no Jardim do Éden.
Seria eu a eterna sedutora do Grande Criador
e seríamos o princípio, o verbo, o prazer.
…
Fatal
Eis meus mortos, acoados sob o mármore frio,
ocultos em suas cavernas púrpuras.
Inúteis.
Sem esperanças, sem milagres,
sem lágrimas ou dores.
Fulminados, aniquilados,
vestidos para a eternidade.
Vencidos.
Não mais o sol os aquecerá, não mais a chuva os banhará,
nenhuma honra os envaidecerá, nenhuma glória os ressuscitará.
Suas sentenças foram cumpridas.
O amor não os salvou.
….
Mudez
Desprezo o silêncio,
mesmo o mais diabólico,
a quem dedico o pior de mim.
Desprezo seus nervos, sua respiração,
deixo-o, porém, que deslize por minha língua, que desça por minha garganta,
e adormeça em meu peito,
Deixo-o,
este assombroso asilo de morcegos,
apenas para que eu possa cavalgar
e errar,
e errar,
e errar.
In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti. Amen.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.