outubro 05, 2024
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Uma nova colaboradora dá mais brilho ainda para a Equipe de Colunistas do ROL – REGIÃO ON LINE: Tereza Du'Zai

A nova colunista Tereza Du’Zai é natural de Itajaí/SC

O nome da nossa nova colunista é Tereza Du’Zai. Ela é poeta, contista, cronista e professora de Língua Portuguesa e Literatura. O tempo, a loucura, a solidão e a morte são temas recorrentes na obra de Duzai que, desde 2015, tem se dedicado, também, à literatura fantástica e gótica. Vencedora do III Concurso UFES de Literatura na categoria poesia, participou também de coletâneas publicadas entre 2016 e 2017. Nesta edição do ROL, suas primeiras contribuições: poesias fantásticas, interessantes, revolucionárias e combativas, todas vibrantes e, surpreendentemente belas, apesar do vigor dos temas abordados. Repare, leitor(a), no estilo literário simples da poetisa Tereza. E na clareza de exposição dos assuntos e na força das palavras. Seja muito bem vinda ao nosso time de colunistas, Tereza! (Helio Rubens, editor)

 

Os Meus Ninguéns

Os meus ninguéns não são os ninguéns de Eduardo Galeano;
Os meus ninguéns, também filhos de ninguéns, pensam que são donos de tudo;
Os meus ninguéns vivem a vida explorando alguéns;
Os meus ninguéns, pouco são, embora acreditem muito ser;
A maioria dos meus ninguéns desconhece a própria língua, mas propaga estrangeirismos;
Muitos dos meus ninguéns são religiosos e supersticiosos;
Vislumbrados e insensíveis, compram excentricidades por obra de arte,
Gastam exorbitâncias em shoppings centers
E pechincham artesanatos à beira-mar.
Os meus ninguéns não são hum+mas aberrações humanas;
Desconhecem o significado de cultura, desprezam o folclore, mas se julgam cultos sobre todos os alguéns,
Eles não têm feições, têm maquiagens e plásticas;
Eles não conversam, encenam;
Eles não têm identidade, têm aparências;
Eles aparecem nas colunas sociais,
Mas valem menos do que a vaidade que os mata.

Poemas

Não gosto de poemas de amor, nunca gostei.
Poemas devem ferir, excitar, provocar fugas, mudança de página;
Poemas devem ser escritos não para serem lidos, ou suportados, até o final,
Mas para serem sentidos, admirados ou repudiados, desde o início.
Gosto de poemas hemorrágicos, catastróficos, assassinos, incendiários;
Gosto de poemas malcheirosos, estúpidos, invasivos;
Aqueles que denunciam, provocam, ofendem;
Aqueles que desenterram cadáveres esquecidos
E com eles dançam um bom twist sobre mármores e flores artificiais.
Gosto, sobretudo, da poesia que denuncia os significados
das insignificâncias do mundo

Brasil

Em Lisarb existe uma máquina de triturar sonhos,
Com dentes humanos,
Movida por um grande braço de dor.
Em seu corpo, vermes holográficos
Deslizam contorcendo-se em vórtices
Engolidos por uma grande mola propulsora
Que os transforma numa massa uniforme,
Modelável, humana.

Volúpia

Todas nós, mulheres do mundo, somos Virgens Marias,

parimos virgens e continuamos virgens;

todas nós, mulheres do mundo, temos um José ausente, insuficiente;

todas nós, mulheres do mundo, queremos um anjo Gabriel que nos visite ao anoitecer;

todas nós, mulheres do mundo, temos um amante invisível,

que nos acende, nos santifica e nos penetra com sua luz;

todas nós, mulheres do mundo,

somos o nosso próprio milagre, o nosso próprio Deus,  o nosso próprio diabo.

Somos mães, irmãs e filhas de nós mesmas.

Maldade

A maldade dança rua afora

rodopia cada vez mais perversa,

coberta com seu manto rubro,

transbordante de alegria;

escarra à minha porta,

beija a boca da vizinha,

faz-lhe filhos deformados

e rodopia, rodopia invencível,

entre cacos de agonia.

Apenas seus pés choram

o sangue ciclo da menina morta: Esperança.

Morta entre um riso e um grito de bom dia.

Alegorias

A poesia grudou no céu da minha boca, na minha língua solta,

nos meus lábios secos.

Ai de ti!

Não me olhes!

Não me beijes!

Ou te tornarás um verso avesso,

o espelho de minh’alma inversa,

nas estrofes tortas de teu corpo travesso, que se atravessa,

que se arremessa sem pressa,

refletido em mim.

Em mim.

Divino

Não quero ouro, nem incenso, nem mirra;

não quero o menino, nem a mãe do menino.

Basta de milagres!

Basta de falsas puritanas!

Eu quero os três reis magros,

eu quero José com seu cajado sagrado,

eu quero sonhar com a estrela de Davi viva entre minhas pernas.

Sou um anjo em quatro dimensões.

Dê-me um pouco de calor e eu serei tua  salvação.

Condor

A noite se encheu de estrelas mortas,

estrelas de sombra,

filhas, netas, bisnetas de meus antepassados;

esposas de Deus, amantes de Maria,

penetradas e lambidas.

Invejei-as,

clamei pelo sêmen divino.

Desnudei-me, santifiquei-me.

Um minuto de silêncio, um sussurro débil,

e renasci como um poema oculto no ventre de uma casa vazia,

presa à sombra de um verso nu.

Um dia, talvez, Deus haverá de me comer.

Santa Clara

Se eu fosse Eva, eu amaria Deus sobre e sob todas as coisas:

sobre o solo sagrado, sobre as plantas miúdas;

sobre as folhas secas da figueira;

sob o céu ensolarado, enluarado, estrelado;

sob os olhares voluptuosos dos anjos e dos santos guardiões.

Conceberia eu o seu filho unigênito,

filho do prazer, não da submissão.

Que comesse Adão da árvore do conhecimento,

e que fosse a serpente sua fiel procriadora.

Eu permaneceria ignorante e feliz no Jardim do Éden.

Seria eu a eterna sedutora do Grande Criador

e seríamos o princípio, o verbo, o prazer.

Fatal

Eis meus mortos, acoados sob o mármore frio,

ocultos em suas cavernas púrpuras.

Inúteis.

Sem esperanças, sem milagres,

sem lágrimas ou dores.

Fulminados, aniquilados,

vestidos para a eternidade.

Vencidos.

Não mais o sol os aquecerá, não mais a chuva os banhará,

nenhuma honra os envaidecerá, nenhuma glória os ressuscitará.

Suas sentenças foram cumpridas.

O amor não os salvou.

….

Mudez

Desprezo o silêncio,

mesmo o mais diabólico,

a quem dedico o pior de mim.

Desprezo seus nervos, sua respiração,

deixo-o, porém, que deslize por minha língua, que desça por minha garganta,

e adormeça em meu peito,

Deixo-o,

este assombroso asilo de morcegos,

apenas para que eu possa cavalgar

e errar,

e errar,

e errar.

In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti. Amen.

Helio Rubens
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