ÉLCIO MÁRIO PINTO – “O MENINO SEM APELIDO“
Será possível que, nesta vida, possa alguém viver sem apelido?
Quando conheci o menino, já com três meses de vida, todos o chamavam de nenê. Não que fosse seu apelido, mas é que todas as crianças recém-nascidas são chamadas assim.
Com o pequeno crescendo, descobri que “nenê” era o jeito carinhoso de dizer do caçula da casa, mas sem substituir seu nome. Só os estranhos chamavam, pelo nome, a criança que ainda não tinha um ano de idade.
Caique cresceu e suas mãozinhas, com aquelas dobrinhas próprias de criança pequena, aos poucos, mudavam. O crescimento na Natureza é assim, porque Nela, tudo muda!
O tio Ronildo, um dos mais brincalhões da família, começou a chamar o pequeno de “Caíco”. Eu mesmo ouvi de uma ou de outra pessoa, com jeito carinhoso de dizer ao menino, chamando-o de “Cajique”. Até “bostinha” eu ouvi, sem bem que nunca a criança era chamada assim publicamente. Esta última tornou-se sinônimo de quem é muito pequeno.
O tempo passou e certo dia contei ao Caique a história do meu irmão, o Donizete, que em casa era chamado de Done ou Donão.
Depois dos remédios da farmácia, sem melhora, Donizete foi levado à benzedeira. Assim que ela o viu, tocando em seu rosto e em seus cabelos, disse para a minha mãe:
– O menino está doente e é por causa do nome.
– Mas, o nome foi dado pela madrinha.
– Não é do nome sagrado do batismo da criança que estou falando. Estou falando do outro nome. Ele não gosta e é por isso que está doente.
A carinha demonstrava um desânimo total. Só sentia sono e nem mais queria brincar.
Na mesma hora, a benzedeira pediu a camiseta do menino e disse que aquilo seria queimado, juntamente com o apelido. E assim, a doença o deixaria para sempre, se não mais fosse chamado assim, especialmente, pelas pessoas da família.
Chegaram em casa e todos foram avisados. Nunca mais Donizete foi chamado pelo apelido que o fez ficar doente. Ele melhorou e sarou.
Caique que me ouvia atentamente, sorriu e me perguntou:
– Você pode me dizer qual era o apelido?
– Só se o Donizete concordar.
Então, combinamos que num outro dia, quando nos encontrarmos, ele mesmo perguntará.
Olhando para o menino, disse que eu tinha pergunta:
– Já que você se interessou pelo assunto, será que alguém poderia chamá-lo de “canjica”?
A resposta de Caique foi rápida:
– Não!
– Por quê?
– Porque eu não gosto.
Naquela tarde de muito sol, Caique entendeu que quando não se quer outro nome, todos devem respeitar o nome que já existe.
Apelido só é bom se for aceito!
ÉLCIO MÁRIO PINTO
03/12/2016
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.