Ella Dominici: ‘As formas invisíveis da paz’


às 16:05 PM
não é o silêncio dos bons que cala —
é o medo de fazer da bondade
um gesto subversivo.
a paz não é uma linha reta,
mas um caminho esculpido
na alma dos que ousam amar
mesmo quando o mundo fere.
não há caminho para a paz,
a paz é o caminho,
dizia o tempo nas mãos de Gandhi,
mas King viu que a injustiça
em qualquer lugar
é ameaça à justiça em todo lugar.
Oz sussurrou:
“onde houver conflito,
haja mais histórias,
menos argumentos.”
e o poema escutou.
há quem confunda paz com repouso,
mas paz não dorme —
ela trabalha em silêncio
como quem costura uma ferida
com fios de escuta.
ela não é ausência de tensão,
mas a presença justa
de um afeto corajoso
capaz de se ajoelhar
diante do outro
sem se reduzir.
há paz
quando o verbo se nega à violência,
quando o livro não é arma,
mas travessia,
e o olhar não acusa,
mas compreende.
há paz
quando desistimos da certeza
e passamos a amar o incerto
como se ele também
tivesse nome
e lugar à mesa.
há paz
quando não queremos vencer o outro,
mas caminhar com ele,
mesmo que discordando,
num mundo onde os muros
caem pela raiz da palavra.
se queremos luz,
não basta maldizer a escuridão —
é preciso acender uma pequena lâmpada,
dizia Oz.
o poema, então,
acendeu-se.
e continuou.
Ella Dominici
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Natural de São Paulo (SP), é endodontista por profissão e formada no curso superior de Língua e literatura francesa. Uma profissional que optou por uma ciência da área da saúde, mas que desde a infância se mostrava questionadora e talentosa na Arte da Escrita, suscitando da parte de um mestre visionário a afirmação de ela ser uma escritora nata, que deveria valorizar o dom que recebera. Atendendo ao conselho recebido, na maturidade Ella cumpre o vaticínio e lança o primeiro livro solo de poemas (Mar Germinal), rompendo com a escrita meramente contemplativa, abraçando fragmentos, incertezas e dualidades para escancarar oportunidades a si como ao outro. Dribla o autoritário tempo, flagra mazelas psicológicas em minúsculas e múltiplas impressões exteriores e internas. É membro da AMCL – Academia Mundial de Cultura e Acadêmica Internacional da FEBACLA. Coautora de várias antologias. Publica na Revista Internacional The Bard e se inscreveu no 8º Festival de Poetas de Lisboa, participando da antologia promovida pelo evento
Ella, num só poema você homenageou a paz e o, agora, saudoso, Sebastião Salgado! Ele, certamente, ficaria emocionado pela homenagem.
Verdade, querido Sérgio Diniz, a foto remete ao legado extraordinariamente humanista de Sebastião Salgado.
Sigamos rumo aos sentidos pacifistas!