Sandra Albuquerque: ‘Carta de Natal a Deus’
Ei, Deus, você aí em cima, sou uma criança e, apenas, um sobrevivente, mas mesmo assim resolvi lhe escrever.
Há três anos sem casa, pais, família, amiguinhos…
Crianças também sofrem, e como sofrem, e ninguém as ouve!
Vivo de lixo em lixo, disputando uma sobra de qualquer coisa, pois até um pão adormecido ou sobras de quentinhas viram um banquete.
Perdi meus pais para a violência, minha casa foi queimada e, enfim, perdi tudo e fui obrigada a viver nas ruas da cidade grande, perambulando, onde é um campo sem lei e, com isto, aprendi a me virar sozinha, pintei o rosto de carvão e vesti-me como um menino para me livrar dos abusos sexuais da galera que toma conta do espaço. Até aqui tem o famoso Manda-Chuva.
Ah, este meu bloco, achei no lixo e deve ter sido dos filhos dos poderosos que descartam seus materiais escolares a cada final de ano. Desculpa eu estar escrevendo a lápis, mas foi o que eu encontrei.
Eu só queria que você soubesse que o que eu mais gostaria neste Natal é que surgisse alguém com um gesto solidário e me levasse para a sua casa, me deixasse tomar um banho, porque aqui, banho só quando o chafariz funciona em épocas de festa na cidade ou visita de algum chefe de estado; me desse uma roupa limpa, um tênis, mesmo velho, de um de seus filhos, uma sopa quente e uma caminha pra dormir aquecida decentemente.
Seria o melhor Natal de minha vida. E o maior presente dado pelo Senhor.
Feliz Natal pra você, Deus!
Ainda é cedo e tudo pode acontecer, e, quem sabe, Você me surpreende.
Comendadora Poetisa Sandra Albuquerque
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Natural de Duque de Caxias-RJ. Professora, escritora e poetisa. Acadêmica Benemérita e Efetiva da FEBACLA, da qual recebeu, dentre outras honrarias, Comendadora Guanabara, Dra. h. c. em Literatura, Direitos Sociais e Humanitários e Comunicação, Acadêmica Correspondente e Internacional, Grande Prêmio Internacional de Literatura Machado de Assis, Comenda Príncipe dos Poetas, em homenagem ao escritor Olavo Bilac, Comenda Imperador Dom Pedro ll, Comenda Anita Garibaldi. Pela Real Ordem dos Cavaleiros Sarmatianos, o título Benfeitora das Ciências, Letras e Artes; Título da Real Ordem dos Cavaleiros e Damas do Rei Ramiro Il de Leão; Embaixadora da Paz e Comendadora da Justiça de Paz; pela Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos -OMDDH, Comenda lnternacional Diplomata Rui Barbosa- ‘O Águia de Haia’. Membro da Academia Caxambuense de Letras-ACL e da Academia Internacional de Literatura e Artes Poetas Além do Tempo. Editora Setorial Social e colunista do Jornal Cultural ROL. Coautora em várias Antologias, dentre elas, Florbela ll , Rasgando a Mordaça, Collectânea Sonata Poética da Liberdade, Semeando Versos e Sarau Integração Cultural pela ACL. Participação na V FLAVIR e Destaque Social Personalidade 2020 e 2021.
Pois é.
O abandono de menores, a desestruturação familiar e a fraca proteção à família são fenómenos cujos impactos são brutais sobre as crianças.
Vejo crianças sendo levadas (exploradas) pelos pais, catando em aterros sanitários, pedindo esmolas nas ruas da cidade e atiradas em feiras para o sustento de gente adulta.
Infelizmente, pouco se faz para reduzir o impacto desse caos.
Sandra, a sua carta é um desejo de muitas crianças deste mundo extremamente violento.
Parabéns!